Roda de Conversa

04/11/2024 - 17:20 - 18:50
RC9.13 - Análise de Custo, Efetividade e Desempenho na Gestão de Doenças Crônicas e Oncológicas no Brasil

49774 - REGISTROS DE CÂNCER DE LÁBIO PRÉ E TRANS PANDEMIA NO BRASIL
YASMIM SILVA GODOY - UFMG, DÉBORA ROSANA ALVES BRAGA SILVA MONTAGNOLI - UFMG, VITÓRIA FERREIRA LEITE - UFMG, MAURO HENRIQUE NOGUEIRA GUIMARÃES ABREU - UFMG, RENATA CASTRO MARTINS - UFMG


Apresentação/Introdução
O câncer de lábio (CL) representa 25-30% de todas as neoplasias malignas orais, sendo o tipo mais comum quando se considera a região buco-maxilar [1]. A exposição à radiação solar excessiva, o uso do tabaco e o consumo de bebidas alcoólicas são descritos como os principais fatores de risco para carcinoma labial [2]. A apresentação dos CL é evidenciada por úlceras e crostas que não cicatrizam e, geralmente, são precedidas por alterações do aspecto do lábio que denotam anormalidades pré-malignas [1]. No contexto do diagnóstico e tratamento no Brasil, a maioria dos cânceres orais são diagnosticados em estágio avançado, porém o CL requer uma análise distinta, uma vez que estão localizadas em uma área de fácil visualização pelo paciente e por profissionais de saúde, interferindo positivamente na história clínica da doença, uma vez que possibilita o diagnóstico em tempo hábil e, consequentemente, tratamentos menos invasivos [1]. Todavia, na pandemia da COVID-19, a sobrecarga do sistema de saúde, dada a premência de esforços profissionais e de recursos voltados para o cuidado dos novos casos de SARS-CoV-2, pode ter modificado o tempo para o início do tratamento dos tumores labiais nos últimos anos [3].

Objetivos
Analisar os registros de CL de acordo com o estadiamento e tempo para início do tratamento (TT) antes e durante pandemia da COVID-19 (2019, 2020, 2021 e 2022).

Metodologia
Trata-se de um estudo ecológico, longitudinal, descritivo e analítico. O ano 2019 foi considerado o período pré-pandêmico e os anos 2020-2022 como período pandêmico de acordo a declaração da emergência em saúde pública de importância nacional pela COVID-19 no Brasil. Foram utilizados dados secundários do Painel-Oncologia do DATASUS, plataforma de gestão para o monitoramento dos dados de câncer no Brasil. Foram coletados os registros de Neoplasia Maligna do Lábio (C00, segundo CID-10), estadiamento (0, I, II, III, IV e “Não se aplica”) e TT, em dias (>30, 31-60 e >60) . Os dados foram considerados a partir dos estados de residência dos registros. No Painel-Oncologia, os estadiamento são classificados quando os casos são tratamentos por quimioterapia, radioterapia ou ambos. A categoria de estadiamento “não se aplica” se refere aos casos tratados por cirurgia. O TT é designado como o intervalo de tempo calculado entre a data do diagnóstico definitivo e a data do primeiro tratamento. Os dados foram organizados em uma planilha do Microsoft Excel 365 e analisados por meio das frequências absoluta e relativa, e variação percentual entre os anos 2019 e 2022.

Resultados e Discussão
Em 2019, foram registrados 1.531 casos de CL no Brasil. Houve tendência de queda dos registros em 2020 (6,99%) e 2021 (24,02%) e aumento em 2022 (21,16%), ainda não correspondendo ao registrado pré-pandemia (n=1.311). Em 2020, houve aumentos expressivos dos estadiamentos 0 (133%) e I (100%) e redução do “Não se aplica” (12,50%) em relação à 2019. Em 2021, todos os estadiamentos reduziram. Em 2022, todos os estadiamentos aumentaram, principalmente o 0 (150%) e II (55,56%). Em 2020, houve queda do TT<30 dias (11,57%) e aumento do TT 31-60 dias (24,00%). Em 2021, o TT<30 dias continuou mostrando decréscimo (20,36%). Em 2022, houve maior aumento do TT>60 dias (32,26%). As reduções dos registros de CL nos dois primeiros anos da pandemia demonstram os efeitos da crise sanitária no diagnóstico e tratamento de CL no sistema público de saúde. Restrições de acesso aos serviços odontológicos e a indisponibilidade de leitos cirúrgicos impactaram a investigação precoce, bem como os tratamentos oncológicos [4]. O CL é uma lesão pequena e de fácil identificação comparado a outros cânceres orais, por isso, geralmente, é classificado com estadiamento “Não se aplica”, ou seja, o tratamento se dá por meio de cirurgia e ocorre em até 30 dias após o diagnóstico no Brasil [5]. Assim, aumentos dos registros classificados com estadiamento são preocupantes, pois denotam o acúmulo de casos diagnosticados tardiamente no período pandêmico. Estes casos exigem terapias multimodais (quimioterapia e radioterapia), que demandam mais recursos governamentais para a gestão de cuidado e carecem de maior tempo para o início do tratamento, como mostra o aumento de TT 31-60 dias em 2021 e TT>60 dias em 2022. Ademais, geram impactos no prognóstico, qualidade de vida e sobrevida dos pacientes [6].

Conclusões/Considerações finais
Houve diferenças percentuais dos registros de CL, do estadiamento e do TT antes e durante a pandemia de COVID-19 no Brasil. Diante disso, destaca-se a importância da organização da gestão do cuidado ao CL, sobretudo dentro das Redes de Atenção à saúde bucal, para propor medidas com vistas a priorizar a continuidade do cuidado, desde a prevenção, controle de fatores de risco, diagnóstico, tratamento em tempo oportuno, recuperação e reabilitação dos pacientes pós-pandemia. Para tanto, é necessária orientação da população acerca da doença e educação permanente para dentistas da Atenção Primária à Saúde para que estejam aptos à identificação precoce de lesões orais.



Referências
1-Kerawala C. et al. Oral cavity and lip cancer: United Kingdom National Multidisciplinary Guidelines. J Laryngol Otol. 2016;130(2):83-9.
2-Tseng H. et al. Clinicopathological study of lip cancer: a retrospective hospital-based study in Taiwan. APMIS. 2017;125(11):1007-16.
3-Cunha AR. et al. The impact of the COVID-19 pandemic on oral biopsies in the Brazilian National Health System. Oral Dis. 2022; Suppl 1(Suppl 1):925-28.
4- Cunha, AR. et al. Hospitalizations for oral and oropharyngeal cancer in Brazil by the SUS: impacts of the COVID-19 pandemic. Rev Saude Publica. 2023;57(suppl 1):3s.
5- Lazzarotto B. et al. Biopsy of the oral mucosa: Does size matter?.Journal of Stomatology, Oral Maxillofacial Surg. 2022;123(11):385-89.
6-Lauritzen BB. et al. Impact of delay in diagnosis and treatment-initiation on disease stage and survival in oral cavity cancer: a systematic review. Acta Oncol.2021;60(9):1083-90.

Fonte(s) de financiamento: CAPES, PRPQ-UFMG


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