Roda de Conversa

04/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC9.11 - Planejamento, avaliação e estratégias de ampliação do acesso a vacinas e medicamentos

51875 - DESAFIOS MULTIDIMENSIONAIS NO PROCESSO DE INCORPORAÇÃO DE VACINAS NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
PATRÍCIA COELHO DE SOÁREZ - USP, ANA MARLI CHRISTOVAM SARTORI - USP, HILLEGONDA MARIA DUTILH NOVAES - USP, THAYSSA VEIGA DA FONSECA VICTER - PNI, ANA CATARINA DE MELO ARAUJO - PNI, GREICE MADELEINE IKEDA DO CARMO - PNI, MARCELO YOSHITO WADA - PNI, EDER GATTI FERNANDES - PNI


Apresentação/Introdução
A implementação de uma vacina num programa de saúde pública requer uma tomada de decisão estratégica e um compromisso firme e a longo prazo. As recomendações de vacinas têm normalmente origem a nível nacional, nas agências de avaliação de tecnologias em saúde (ATS) e/ou nos grupos consultivos técnicos nacionais de imunização (NITAGs), quando solicitadas por stakeholders externos, normalmente a indústria, ou internas, instâncias do sistema de saúde. Espera-se que as agências de ATS efetuem avaliações rigorosas como parte do processo de incorporação nos sistemas de saúde, e que os NITAGs, ofereçam recomendações imparciais e baseadas em evidências sobre as vacinas para informar a tomada de decisões pelos stakeholders nacionais (1).
As recomendações baseadas em evidências, transparentes e oportunas apresentadas pelos NITAGs têm desempenhado um papel crucial na promoção de iniciativas de imunização atuais e futuras (2).
A experiência com as vacinas da COVID-19 demonstrou que é necessário integrar dimensões adicionais nas análises, tais como a disponibilidade da oferta, o apoio político, a sustentabilidade, a procura de vacinas e os custos de oportunidade. Além disso, os Programas Nacionais de Imunização enfrentaram recentemente desafios importantes, principalmente o declínio das taxas de cobertura vacinal, exacerbado pela pandemia de COVID-19 (3), e o aumento da hesitação vacinal.


Objetivos
Este estudo teve como objetivo examinar o processo de incorporação de novas vacinas no período pós pandêmico no Brasil. Tendo como pano de fundo as políticas científicas e tecnológicas nacionais de desenvolvimento e produção de vacinas, apresentamos um estudo de caso focado nos recentes processos de tomada de decisão sobre a Vacina Pneumocócica Conjugada (VPC) no Brasil.

Metodologia
Estudo de caso explicativo intrínseco. Desenvolvemos uma compreensão aprofundada do caso, reunindo evidências científicas a partir de uma revisão rápida da literatura, incluindo o desenvolvimento histórico do Programa Nacional de Imunizações (PNI), o panorama do mercado global de vacinas, o impacto das VPCs na doença pneumocócica (DP) e as políticas científicas e tecnológicas nacionais no desenvolvimento e produção de vacinas. Coletamos evidência empírica de documentos oficiais da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde), incluindo relatórios de recomendação, atas de reuniões e sessões gravadas acessíveis no website da Conitec.
Analisamos e interpretamos os dados com a abordagem do Framework (familiarização; identificação de um quadro temático; indexação; mapeamento e interpretação). Nossa análise se baseou na evolução das discussões entre os atores-chave nos processos deliberativos da Conitec, as decisões tomadas e as controvérsias entre as narrativas dos atores e a literatura científica disponível. Focamos particularmente nas dimensões priorizadas no processo decisório da incorporação da VPC infantil no Brasil, em 2022 e 2023.


Resultados e Discussão
As vacinas VPC10 e VPC13 tiveram um impacto substancial na saúde pública, reduzindo globalmente a DPI e a pneumonia em crianças com menos de 5 anos de idade, com proteção indireta de crianças e adultos não vacinados, sem evidência clara da superioridade de uma vacina sobre a outra. Os dados do Sistema de Informação em Saúde do Brasil mostraram uma redução da meningite pneumocócica (MP) em crianças menores de 5 anos logo após a introdução da VPC10, seguida de estabilização (2016-2019), uma nova queda acentuada durante os anos de pandemia de Covid (2020-2021) e um aumento em 2022, ligeiramente acima do observado em 2019. A interpretação destes dados diferiu de acordo com os stakeholders. O diretor do PNI salientou que a avaliação económica centrada apenas nos três sorotipos adicionais não era adequada. Não há dados de base populacional sobre a doença causada pelos três sorotipos no Brasil e também não havia dados sobre a eficácia da vacina apenas para os três sorotipos. Ele também questionou as medidas de eficácia da VPC13 incluídas no modelo econômico (84%), que superestimaram o efeito da VPC13, e enfatizou as incertezas relacionadas aos benefícios da substituição e aos resultados de custo-efetividade.
Em 2023, o novo governo priorizou o fortalecimento do Complexo Industrial da Saúde, com metas de médio e longo prazo de autossuficiência na produção de imunobiológicos, com grandes investimentos em laboratórios públicos, visando à produção dos principais insumos estratégicos. A decisão de dar continuidade ao acordo com a GSK, participando do desenvolvimento de uma nova VPC, AFX3772MAPS, em estudo clínico de fase 3, vai nessa direção (4).


Conclusões/Considerações finais
O processo de tomada de decisão para a incorporação de novas vacinas num país de renda média deve ser organizado em torno da avaliação de tecnologias em saúde, do processo deliberativo de tomada de decisões, do alinhamento entre stakeholders e da comunicação. O caso do processo de decisão da substituição da VPC10 pela VPC13 demonstrou que esses processos são específicos de cada país e envolvem muitos níveis de priorização política e aspectos técnicos complexos, além de dependerem da presença de instituições de saúde pública fortes.

Referências
1. Noharet-Koenig R, Lasota K, Faivre P, Langevin E. Evolution of Pneumococcal Vaccine Recommendations and Criteria for Decision Making in 5 Western European Countries and the United States. MDM Policy Pract. 2023;8(1):23814683231174432.
2. Henaff L, Zavadska D, Melgar M, Fihman J, Steffen C, Hombach J. The role of NITAGs in government decisions on vaccine use: insights from the Fifth Global NITAG Network meeting. Lancet Infect Dis. 2024.
3.Weissmann L, Richtmann R. Brazil needs to be vaccinated. Braz J Infect Dis. 2023;27(4):102787.
4. Duke JA, Avci FY. Emerging vaccine strategies against the incessant pneumococcal disease. NPJ Vaccines. 2023;8(1):122.

Fonte(s) de financiamento: Programa Nacional de Imunizações.


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