51837 - TRAJETÓRIA, CARACTERÍSTICAS E DESAFIOS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SEGURANÇA ALIMENTAR EM BELO HORIZONTE SOLIMAR CARNAVALLI ROCHA - UFMG, KARYNNA MARIA DA SILVA FERREIRA - UFMG, MAGDALENA HAAKENSTAD - UNIVERSITY OF WASHINGTON, HELEN PINEO - UNIVERSITY OF WASHINGTON, WALESKA TEIXEIRA CAIAFFA - UFMG, ELIS MINA SERAYA BORDE - UFMG
Apresentação/Introdução Com a maioria da população mundial vivendo em cidades, a segurança alimentar adquiriu uma dimensão urbana. Questões como o acesso físico e financeiro aos alimentos, redução de recursos naturais, grilagem de terras, agitação social e mudanças climáticas, trazem preocupações que exigem esforços globais coordenados. Por outro lado, surgem soluções em nível local, com cidades se tornando centrais na reconstrução dos sistemas alimentares (MORAGUES-FAUS & CARROLL, 2018). Nas cidades do Sul Global, a insegurança alimentar é caracterizada pelo acesso econômico limitado a alimentos nutritivos devido à pobreza, à concentração de terras e meios produtivos (SALLES-COSTA et al., 2023), aos altos preços, à infraestrutura inadequada e ao desenvolvimento desigual, exacerbados pela rápida urbanização que sobrecarrega os sistemas alimentares e limita o cultivo em pequena escala. Belo Horizonte é conhecida nacional e internacionalmente por seu pioneirismo e inovação nas políticas públicas de promoção da segurança alimentar. Entretanto, a população belorizontina ainda vivencia má nutrição, com aumento da desnutrição, do excesso de peso (BELO HORIZONTE, 2022) e percentuais de insegurança alimentar semelhantes aos observados em escala nacional (TEIXEIRA et al., 2022). Não menos importante, e relacionado aos anteriores, a população, é marcada por iniquidades de gênero, raça e classe social.
Objetivos Descrever a trajetória e características das políticas públicas de garantia à segurança alimentar e nutricional (SAN) em Belo Horizonte, e identificar seus desafios.
Metodologia Este trabalho apresenta resultados da primeira fase do projeto internacional “Change Stories: Learning from narratives of equitable and sustainable urban transformation”. Realizou-se uma revisão bibliográfica narrativa e foram conduzidas entrevistas, semiestruturadas, com treze (13) informantes-chave (gestores de políticas públicas, lideranças sociais, representantes de organizações da sociedade civil e pesquisadores) envolvidos com o tema da segurança alimentar em Belo Horizonte. Os entrevistados foram selecionados a partir da revisão bibliográfica e por meio da metodologia bola de neve. Do total de entrevistados, onze (11) se identificam com mulher cis e dois (02) como homem cis. A Análise Temática Reflexiva (BRAUN & CLARKE, 2023) foi utilizada nas entrevistas. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, e todos os participantes preencheram o Registro de Consentimento Livre e Esclarecido (RCLE).
Resultados e Discussão Na trajetória das lutas pela garantia da segurança alimentar em Belo Horizonte destaca-se a criação da Secretaria Municipal de Abastecimento (SMAB) em 1993, durante a gestão municipal de Patrus Ananias (PT), posteriormente transformada em Subsecretaria de Segurança Alimentar e Nutricional (SUSAN). Em 2003, foi criado o Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional (COMUSAN-BH), com a institucionalização da participação popular. Atualmente, as políticas se dividem em fornecimento direto de alimentação (restaurantes populares, Programa Municipal de Alimentação Escolar - PMAE e banco de alimentos), regulação de mercado e promoção de feiras para fornecer alimento de baixo custo (mercados municipais, sacolões ABasteCer, feiras de agricultura familiar e agroecologia) e o fortalecimento da agricultura familiar e da agricultura urbana, com base na agroecologia (unidades produtivas institucionais e coletivas comunitárias). Paralelamente são desenvolvidos cursos de formação em agroecologia e gastronomia visando mitigar a insegurança alimentar.
Quanto aos desafios, a segurança alimentar em Belo Horizonte ainda enfrenta relevantes desafios estruturais, principalmente em relação ao acesso às políticas. Além da quantidade de equipamentos se mostrar insuficiente para atender à demanda da população, os equipamentos relacionados à regulação do mercado estão fortemente concentrados em áreas da cidade de menor vulnerabilidade social. Outros desafios identificados estão relacionados à integração intersetorial, baixos níveis de educação nutricional, terceirização parcial de políticas e regulação pública, articulação entre movimentos sociais e processos de formulação de políticas e coordenação e instabilidade nos níveis federal, estadual e municipal.
Conclusões/Considerações finais Desde os anos 90, Belo Horizonte é considerada referência em políticas de SAN. Contrariando a tendência de negligência das questões urbanas nas políticas de SAN, destaca-se por uma governança eficaz e pelo papel precursor de iniciativas federais como o Fome Zero. Apesar da cidade se diferenciar pela formação consciente das políticas públicas que permitiram a superação de abordagens assistencialistas e limitadas como do PMAE, ainda persiste frágil integração intersetorial. E, mais deficitário, as políticas de SAN não eliminaram iniquidades de raça, classe e gênero, sobretudo no reconhecimento da vulnerabilização de mulheres negras faveladas, fruto das estruturas sociais historicamente consolidadas e da ausência de construção interseccional das políticas existentes. Mais recentemente, observa-se uma tendência de terceirização das políticas públicas para arranjos público-privados, o que pode enfraquecer a liderança governamental nas políticas de SAN.
Referências BRAUN V., CLARKE V. Doing reflexive thematic analysis: A reflexive account. In F. Meyer, & K. Meissel (Eds.), Research methods for education and the social disciplines in Aotearoa New Zealand. New Zealand: NZCER Press, 2023.
MORAGUES-FAUS, A., & CARROLL, B. Reshaping urban political ecologies: An analysis of policy trajectories to deliver food security. Food Security, v. 10. n. 6, p. 1337-1351, 2008.
PREFEITURA DE BELO HORIZONTE. Relatório de acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 2022. Coordenação editorial: Rodrigo Nunes Ferreira; Rosane Castro. Belo Horizonte, 338p. 2022.
SALLES-COSTA, R., et al. Sistemas alimentares, fome e insegurança alimentar e nutricional no Brasil. Editora FIOCRUZ, 2022.
TEIXEIRA, M. et al. Retrato da situação de segurança alimentar em Belo Horizonte. Food for Justice Working Paper Series, n. 6. Berlin: Food for Justice: Power, Politics and Food Inequalities in a Bioeconomy, 2022.
Fonte(s) de financiamento: O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001
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