Roda de Conversa

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC9.9 - Implementação e Avaliação das Políticas de Alimentação e Nutrição no SUS

51345 - OS MARCADORES DE CONSUMO ALIMENTAR ESTÃO ASSOCIADOS AO CADASTRO NA ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA? CONTRIBUIÇÕES DA PESQUISA NACIONAL DE SAÚDE
CAROLINE DE OLIVEIRA GALLO - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA - USP, MÁRCIO V. DE G. AFFONSO - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA - USP, RAQUEL BERGARIA DE OLIVEIRA - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA - USP, AYLENE BOUSQUAT - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA - USP, PATRÍCIA CONTANTE JAIME - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA - USP


Apresentação/Introdução
A Lei nº 8.080/1990 define o Sistema Único de Saúde (SUS) como parte do sistema de proteção social brasileiro e assume o conceito amplo de saúde, determinado pela organização social e econômica do país, sendo expresso pelas condições de vida de sua população, tais como alimentação e nutrição. A Atenção Primária à Saúde (APS) exerce papel fundamental como primeiro nível de atenção à saúde no SUS, pressupondo uma rede integrada de serviços. Sua principal forma de atuação tem sido a Estratégia de Saúde da Família (ESF), cujo processo de trabalho é baseado na ação comunitária e multiprofissional. A ESF tem como objetivo ampliar a resolutividade e impacto na situação de saúde das famílias por meio de ações de promoção e prevenção à saúde. Nesse sentido, a APS desempenha um papel importante na Promoção da Alimentação Adequada e Saudável (PAAS), uma vez que a alimentação inadequada tem um impacto significativo na carga de doenças. A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), um inquérito de base domiciliar e abrangência nacional, coleta informações sobre temas relacionados à saúde da população, dentre os quais o acesso e utilização de serviços, e estilos de vida, abarcando aspectos sobre a alimentação. Essa última foi investigada, na PNS de 2019, em consonância com o atual Guia Alimentar para a População Brasileira (GAPB), importante instrumento de PAAS e promoção da saúde.

Objetivos
Este trabalho, de caráter descritivo, objetivou identificar diferenças na distribuição dos marcadores de alimentação saudável e não saudável, definidos pelo GAPB, segundo o cadastro do domicílio na ESF, tendo por base os dados disponibilizados pela PNS de 2019.

Metodologia
A PNS tem como base amostragem probabilística e entrevista apenas um morador por domicílio particular sorteado. Para este trabalho, foram selecionados indivíduos com 18 anos ou mais de idade, que responderam ao questionário e que souberam informar se seu domicílio estava ou não cadastrado à ESF. No módulo “estilo de vida” pergunta-se sobre a frequência regular de consumo de certos alimentos. Tais respostas foram agrupadas e categorizadas em marcadores de alimentação saudáveis (consumo de feijão, frutas e vegetais ao menos cinco dias na semana; consumo de peixe ao menos um dia na semana; consumo de carne vermelha no máximo três dias na semana; e nunca substituir refeições por lanches) e não saudáveis (ingestão regular, mínimo cinco dias na semana, de bebidas açucaradas; de doces; e a autopercepção da ingestão de sal como excessiva, “alta” ou “muito alta”). Foram calculadas as proporções de consumo de cada marcador alimentar, considerando o formato survey, entre os grupos de cadastramento na ESF e comparadas com o teste de qui-quadrado de Pearson, com correção de Rao-Scott, adotando valor de significância de 5%. As análises foram desenvolvidas no software Stata versão 16.0.

Resultados e Discussão
Dos 77.977 indivíduos avaliados, 68,8% tinham domicílios cadastrados na ESF. O percentual de consumo de frutas e vegetais entre os cadastrados foi de 43,5% (IC95% 42,7-44,3) e 53,5% (IC95% 52,7-54,3), respectivamente. Nos não cadastrados o consumo foi maior: 48% (IC95% 46,7-49,2) e 58,4% (IC95% 57,2-59,7) (p<0,001). O consumo regular de peixes também foi maior entre o grupo dos não cadastrados em relação aos cadastrados: 49,7% (IC95% 48,4-50,9) versus 45% (IC95% 44,2-45,8) (p<0,001). Para o consumo de feijão, os indivíduos com domicílios cadastrados apresentaram maior percentual: 72,2% (IC95% 71,6-72,9) versus 61,5% (IC95% 60,3-62,8). Em relação à nunca trocar refeições por lanches, maior percentual também foi observado entre os cadastrados: 77,2% (IC95% 76,5-77,9) versus 71,2% (IC95% 70-72,4) (p<0,001). Não houve diferença significativa para o consumo de carne vermelha entre os grupos (p=0,2160). Quanto aos marcadores não saudáveis, os cadastrados na ESF tiveram menor percentual de consumo de doces: 14,3% (IC95% 13,8-14,9) versus 16,1% (IC95% 15-17,1) (p<0,05). O mesmo ocorreu para a autopercepção do consumo de sal como excessivo: 12,3% (IC95% 11,8-12,9) versus 13,5% (IC95% 12,6-14,5) (p<0,05). Não houve diferença significativa entre os grupos para o consumo de bebidas açucaradas (p=0,172). Esses achados sugerem que há um fator de interação entre o cadastramento na ESF e o acesso à alimentação saudável. Nesse sentido, especula-se que a maior renda domiciliar per capita influencia o maior consumo de frutas, vegetais e peixes pelos indivíduos não cadastrados. Enquanto o maior consumo de feijão e a não substituição de refeições é mais frequente nos indivíduos cadastrados (possivelmente com menor rendimento), o que se repete também nos marcadores não saudáveis.

Conclusões/Considerações finais
Este estudo buscou compreender possíveis associações entre a ESF e características do estilo de vida, mais especificamente a alimentação. Os resultados sugerem que o cadastramento junto a uma ESF pode influenciar positivamente no padrão de consumo alimentar, contudo, compreendendo as limitações deste estudo, de caráter descritivo, e sabendo que tanto o cadastramento na ESF quanto o padrão alimentar são influenciados por outros fatores não trabalhados neste estudo, como renda, escolaridade, raça/cor e tipo de situação censitária, vê-se a necessidade de explorar os achados aqui apresentados, por meio da condução de uma análise multivariada, como continuidade a este trabalho, objetivando investigar os possíveis motivos do padrão alimentar encontrado, em comparação com a literatura já produzida sobre o assunto, o que será alvo de trabalhos futuros do grupo.

Referências
Giovanella L, Bousquat A, Schenkman S, Almeida PF, Sardinha LMV, Vieira MLFP. The Family Health Strategy coverage in Brazil: what reveal the 2013 and 2019 National Health Surveys. Cien Saude Colet. 2021 Jun 14;26(suppl 1):2543-2556. Doi: 10.1590/1413-81232021266.1.43952020. PMID: 34133633.
Pesquisa nacional de saúde : 2019 : percepção do estado de saúde, estilos de vida, doenças crônicas e saúde bucal : Brasil e grandes regiões / IBGE, Coordenação de Trabalho e Rendimento. - Rio de Janeiro : IBGE, 2020. Doi.org/10.1590/1413-81232014192.14072012. Disponível em: [https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101764.pdf.].
Santin F, Gabe KT, Levy RB, Jaime PC. Food consumption markers and associated factors in Brazil: distribution and evolution, Brazilian National Health Survey, 2013 and 2019. Cad. Saúde Pública 2022; 38 Sup 1:e00118821https://doi.org/10.1590/0102-311X00118821.

Fonte(s) de financiamento: Caroline de Oliveira Gallo - Bolsista FAPESP


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