Roda de Conversa

04/11/2024 - 17:20 - 18:50
RC9.7 - Auditoria e Gestão no SUS: Fortalecimento de Políticas Públicas, Governança e Qualidade dos Serviços de Saúde

51564 - AS EMENDAS PARLAMENTARES E OS DESAFIOS PARA A GESTÃO MUNICIPAL DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: ESTUDO DE CASO NA REGIÃO DE SAÚDE METROPOLITANA I/RJ
ANDRÉ SCHIMIDT DA SILVA - ENSP/FIOCRUZ, LUCIANA DIAS DE LIMA - ENSP/FIOCRUZ, TATIANA WARGAS DE FARIA BAPTISTA - IFF/FIOCRUZ, HENRIQUE SANT`ANNA DIAS - ENSP/FIOCRUZ, CARLA LOURENÇO TAVARES DE ANDRADE - ENSP/FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
Mudanças nas regras do orçamento da União introduzidas a partir da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2014 impulsionaram a ampliação de recursos de emendas parlamentares nas despesas do Ministério da Saúde, refletindo de forma importante nas transferências aos municípios.
Em 2016, as emendas com recursos de custeio passaram a ser predominantes e a abranger a quase totalidade dos municípios. Em alguns casos, as emendas chegaram a competir com as transferências regulares como principal fonte de recursos federais nos orçamentos municipais para o SUS (PIOLA; VIEIRA, 2019).
Em âmbito municipal, as emendas parlamentares ao orçamento federal impõem desafios adicionais para a gestão, quando são requeridas outras estratégias para captação, planejamento e utilização desses recursos. Isso porque o acesso aos repasses por emendas depende da articulação com o poder legislativo (BAPTISTA et al, 2012).
Tendo em vista que na APS as transferências regulares aos municípios fomentaram a adoção de parâmetros nacionais de políticas prioritárias e a reorientação do modelo de atenção por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF) (CASTRO, MACHADO, LIMA, 2018), este trabalho foi motivado pela seguinte questão de pesquisa: quais os desafios gerenciais são impostos ao nível local pela crescente participação das emendas nas transferências da União?


Objetivos
Analisar os desafios impostos pelas emendas parlamentares para a gestão da Atenção Primária à Saúde nos municípios da região de saúde Metropolitana I do estado do Rio de Janeiro no período de 2016 a 2022.

Metodologia
Foi realizado estudo de caso a partir da combinação de abordagens quantitativas e qualitativas, com a análise das informações organizadas em quatro dimensões: repasses federais, estratégias de captação, planejamento e execução, e posicionamento dos atores. A região Metropolitana I/RJ (Metro I) foi selecionada por representar uma área fortemente urbanizada, com grande densidade populacional e desigualdades socioeconômicas e de saúde (REIS et al, 2023), sendo composta por doze municípios, podendo ser subdividida entre a capital e os demais onze municípios que fazem parte da Baixada Fluminense, totalizando 9.705.577 de habitantes.
A abordagem quantitativa foi baseada na análise exploratória e descritiva de dados secundários acerca das áreas de destinação e perfil de participação e distribuição das transferências federais totais, regulares e por emendas parlamentares. Os dados foram obtidos pelo SIGA Brasil e Fundo Nacional de Saúde.
A abordagem qualitativa foi ancorada em entrevistas com diferentes perfis de gestores, envolvendo cinco municípios (perfil 1) e representantes da SES, do COSEMS e do consórcio de saúde regional (perfil 2), realizadas no segundo semestre de 2022.


Resultados e Discussão
No período de 2016 a 2022, observou-se o contraste entre a taxa de crescimento dos recursos de emendas parlamentares (EP) para a APS (328,2%) e a retração nos repasses regulares (-15,6%) nos municípios da Baixada Fluminense (BF).
Na Metro I, destacou-se a baixa participação das EP em relação ao total de repasses federais para APS na capital (2,5%) e uma proporção elevada na BF (27,9%), chegando a 44% em um de seus municípios.
Os valores per capita das EP para APS variaram expressivamente entre os municípios (R$ 54,23 e R$ 1,96). As oscilações nas transferências para os mesmos municípios na série histórica também foram marcantes, com coeficientes de variação superiores a 100% em diversos municípios.
Na análise da série histórica, foram identificados três padrões de participação das EP para APS: 1) baixa participação (apenas na capital); 2) alta e sustentada; e 3) oscilações importantes. Enquanto no segundo padrão, sugere-se dependência dos recursos de EP, o terceiro evidencia os riscos de descontinuidade de ações e serviços de saúde.
As EP levaram os gestores municipais a diversificarem suas estratégias de captação de recursos no SUS, mobilizando atores diversos, com protagonismo dos prefeitos.
Foram relatados desafios para execução dos recursos, sobretudo quando destinados a investimentos e desvinculados das necessidades em saúde dos municípios. Quanto ao planejamento, observou-se o esforço dos gestores para inclusão dos repasses em ações já previstas nas programações anuais.
O posicionamento dos atores apresentou diferenças marcantes. Enquanto o perfil 1 considerou, majoritariamente, as EP como algo positivo, pois permitem a execução de projetos com recursos vistos como adicionais, o perfil 2 foi extremamente crítico quanto a uma divisão de recursos iníqua no SUS.


Conclusões/Considerações finais
As EP impulsionaram mudanças organizacionais nas secretarias municipais de saúde e elevaram preocupações acerca dos riscos de descontinuidade do cuidado na APS.
A captação de recursos por EP mobilizou a participação de diversas etapas e atores, com visões divergentes, até a entrega do serviço ou ação de saúde à população. Além da reconfiguração das relações entre os poderes executivo e legislativo, as EP aumentaram a complexidade das relações intergovernamentais no SUS, com fluxos para tramitação e avaliação técnica considerados confusos.
Nesse cenário de múltiplas interações, observou-se a crescente relevância dos recursos de EP e mudanças nas relações intergovernamentais e entre os poderes executivo e legislativo, que moldam, hoje, o financiamento da política de saúde. Às gestões municipais, cabe o esforço de diversificar suas estratégias para ampliar receitas para o SUS e readequar seus processos organizacionais, sobretudo no que se refere ao planejamento e à execução de recursos.


Referências
BAPTISTA, T. W. F. et al. As emendas parlamentares no orçamento federal da saúde. Cadernos de Saúde Pública, v. 28, n. 12, p. 2267–2279, dez. 2012.

CASTRO, A. L. B.; MACHADO, C. V.; LIMA, L. D. Financiamento da Atenção Primária à Saúde no Brasil. In: Mendonça, MHM; Matta, GCM; Gondin, R; Giovanella, L (orgs.). Atenção Primária à Saúde no Brasil: conceitos, práticas e pesquisa. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2018. (p. 73-93).

PIOLA, SF; VIEIRA, F. As emendas parlamentares e a alocação de recursos federais no Sistema Único de Saúde. Brasília, Rio de Janeiro: IPEA, 2019. [Texto para discussão; n.2497].

REIS, G. J.; ALBUQUERQUE, M. V.; LIMA, L.D. de. Distribuição espacial de unidades de saúde e condições de vida urbana na região metropolitana do Rio de Janeiro. Hygeia - Revista Brasileira de Geografia Médica e da Saúde, Uberlândia, v. 19, p. e1936, 2023.

Fonte(s) de financiamento: A pesquisa foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo n° 309295/2021-1; pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), processo n° SEI E-26/201.123/2021; e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) - Programa de Políticas Públicas, Modelos de Atenção e Gestão do Sistema e Serviços de Saúde (PMA), processo n° 25380.101539/2019- 05.


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