52104 - RELATÓRIOS QUE NÃO RELATAM: QUANDO O AGIR DEMOCRÁTICO SE TRANSFORMA EM FAZER BUROCRÁTICO. ANDERSON CÉZAR TENORIO REGO - MINISTÉRIO DA SAÚDE, JULIANNA FIRMINO LEITE - MINISTÉRIO DA SAÚDE, ELAINY LEITE SOARES GONÇALVES - MINISTÉRIO DA SAÚDE, AGRIPINO CELSO GUERREIRO BARBOSA FILHO - MINISTERIO DA SAUDE
Contextualização A construção do Relatório Anual de Gestão (RAG) é o momento final, com frequência anual, do processo de planejamento no SUS. Esse processo inicia com as deliberações realizadas em Conferência de Saúde, que estabelece Diretrizes para a Gestão do Sistema de Saúde em determinada localidade, com posterior institucionalização em Plano de Saúde.
Em continuidade, são determinadas programações anuais, que anualizam as metas definidas no Plano, com acompanhamento quadrimestral, a partir dos Relatórios Quadrimestrais, e finaliza com a apresentação do RAG, para o Conselho de Saúde. Pode-se considerar que o RAG sintetiza alguns deveres e obrigações constitucionais do gestor, relativos a: Acesso à Informação (inciso XIV, do art. 5º), Prestação de Contas quanto aos bens, valores e dinheiros públicos (parágrafo único, do art. 70) e garantia da Participação da Comunidade (inciso III, do art. 198).
Assim, o RAG não deve ser entendido apenas como um instrumento que apresenta parâmetros de execução de planos produzidos, com delineamento técnico-burocrático. Seu potencial vai além, é o ápice do agir democrático, momento no qual o Controle Social, após sua caminhada para definir diretrizes e institucionalizar estratégias, tem a responsabilidade por garantir que todo o esforço se materializou em ações e serviços de saúde que efetivamente satisfazem as necessidades de saúde da população.
Descrição da Experiência O presente relato de experiência se configura a partir da análise dos resultados constantes em vinte e seis relatórios de auditoria, que tiveram como objeto a avaliação de Relatórios Anuais de Gestão de Secretarias Municipais de Saúde relativos ao exercício de 2021. As auditorias foram realizadas durante o ano de 2022 pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS, do Ministério da Saúde.
Para análise dos resultados, que considerou as características das constatações existentes nos relatórios, foram criadas quatro categorias, sendo elas: Acesso à Informação; Controle Social; Prestação de Contas; e Estruturação.
Acesso à informação se relaciona aos meios existentes para a disponibilização do RAG à sociedade, a possibilidade de acesso às informações complementares e a qualidade dos elementos das informações existentes no próprio documento.
Controle Social diz respeito à participação da comunidade na construção dos instrumentos de planejamento, adoção por parte do gestor das recomendações emitidas pelo Conselho de Saúde para melhoria dos planos e na emissão do Parecer Conclusivo por parte do Conselho.
Prestação de Contas considera a apresentação de informações sobre execução financeira das despesas ordinárias e relativas ao enfrentamento da COVID, realizadas no exercício.
Estruturação evidência se o RAG atende aos critérios estabelecidos pela legislação quanto a sua forma e conteúdo.
Objetivo e período de Realização O objetivo do presente Relato é demonstrar, a partir dos resultados de auditorias realizadas pelo DENASUS, que a elaboração dos RAGs objetiva a satisfação de exigências legais, o que limita a sua capacidade de atender aos deveres constitucionais do Acesso à Informação, da Prestação de Contas e da Participação da Comunidade, e por consequência, diminui o componente democrático que se espera na condução do Sistema Público de Saúde.
A experiência que se relata, ocorreu durante o ano de 2022.
Resultados Com base nas categorizações definidas, chegou-se aos seguintes:
Quanto ao Acesso às Informações, 61,54% das Secretarias avaliadas não disponibilizam o RAG em sites e outros meios de comunicação; 80,77% não disponibilizaram para consulta os dados comprobatórios sobre os resultados dos indicadores de Pactuação Interfederativa; e 80,77% não apresentaram análises e considerações sobre os dados apresentados nas seções constantes do RAG.
Quanto ao Controle Social, 50% das Secretarias avaliadas realizaram audiências ou reuniões para a apreciação dos Planos de Saúde; 77,27% das Secretarias não validaram as recomendações apresentadas pelos Conselhos de Saúde para melhoria dos planos; e 80% dos Conselhos não apresentaram Pareceres Conclusivos sobre os RAGs ou o fizeram de foram incipiente.
Quanto à Prestação de Contas, 76,19% das Secretarias não apresentaram informações completas sobre os recursos ordinários utilizados; e 62,5% não apresentaram informações suficientes sobre a utilização dos recursos recebidos para o enfrentamento da COVID.
Quanto à estruturação, 76,90% dos RAGs analisados apresentaram inconformidades na alimentação de dados obrigatórios.
Aprendizado e Análise Crítica Considerando os dados da seção de Resultados, indica-se que a elaboração dos RAGs ocorre para atender ao que a legislação exige. Quando se observa que 76,90% dos Relatórios analisados possuem problemas com a apresentação de dados obrigatórios ao mesmo tempo que se evidencia em 77,27% dos relatórios a não validação das recomendações apresentadas pelos Conselhos, é possível concluir que não se utilizou o RAG como uma peça de melhoria das políticas e programas de saúde ofertados à população, na perspectiva de se ter um planejamento adequado às necessidades locais, atrelado a um monitoramento efetivo.
Essa perspectiva fragiliza o instrumento de acompanhamento da execução dos planos e estratégias do SUS, pois revela um contexto no qual as informações não estão plenamente acessíveis e organizadas para o seu consumo, aponta para a existência de barreiras para o pleno exercício do controle social e afirma a baixa efetividade quanto aos processos utilizados pelas Secretarias para dar transparência aos gastos realizados com recursos públicos.
Para que os ideais de democracia possam ser plenamente exercidos no SUS, as práticas gerenciais em uso devem incorporar inovações que ampliem os espaços de participação popular, atuem ativamente para o acesso às informações e criem mecanismos de transparência que garantam pleno monitoramento quanto a utilização dos recursos nas finalidades planejadas.
Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2024.
BRASIL. Manual de Planejamento no SUS. 1. Ed, ver. – Brasília: Ministério da Saúde, 2016.
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