48682 - PRÁTICAS PEDAGÓGICAS GRUPAIS NA SAÚDE: FOMENTANDO CIDADANIA NEIDE EMY KUROKAWA E SILVA - UFRJ, RAPHAEL CURIONI RAIA - UNIFASE
Apresentação/Introdução O movimento de reconstrução de bases democráticas para a sociedade brasileira tem enfrentado sérias ameaças e, no âmbito da saúde, contribuem para acirrar a crise no setor. Defende-se que o resgate do espírito da critica e da mobilização coletiva, marcantes na conformação da Saúde Coletiva, pode ser um dos caminhos para tal reconstrução, tomando-se como foco as práticas grupais. A conformação dos grupos pode ser espontânea ou natural, como ocorre nas interações cotidianas ou pode considerar grupos organizados, com finalidades específicas, como associações ligadas à luta por direitos de pessoas que vivem com alguma doença. Tais finalidades podem situar-se em um gradiente entre a reprodução e as que pretendem transformações das condições sociais. Tem-se como pressuposto que grande parte das práticas grupais na saúde ocorrem em contextos educativos, com finalidades restritas à transmissão de conteúdos e prescrição de boas práticas; têm pouca ou nenhuma margem para discussão de aspectos para além das expectativas técnicas envolvidas, de controle ou de tratamento de uma doença. Considerando o ideário democrático e participativo do Sistema Único de Saúde (SUS), defende-se que o trabalho em pequenos grupos nos espaços da saúde pode ser rico instrumento para o exercício de participação social e de cidadania.
Objetivos Explorar as potencialidades dos pequenos grupos em práticas pedagógicas desenvolvidas no campo da saúde, como espaços para o exercício da participação e da cidadania.
Metodologia Trata-se de esboço de ensaio que visa resgatar referências sobre grupo consonantes com princípios e diretrizes do SUS e de políticas nacionais com propostas educativas no campo da saúde, como as da Educação Popular, da Promoção da Saúde e da Educação Permanente. Tendo como norte a pedagogia crítica e problematizadora (FREIRE, 2018), elegeu-se duas autoras cujas produções sobre grupos se aproximam de tal proposta pedagógica. Embora seus trabalhos partam de distintas matrizes teóricas, materialismo dialético e psicanálise, ambas ressaltam o caráter ético e político que os grupos podem assumir. A partir do exame de suas principais obras (LANE, 1989; FERNANDEZ, 2006) e dos comentários que tecem sobre outros autores, destacaram-se aspectos que podem orientar práticas educativas grupais na saúde. Dialoga-se com questões abordadas pelas autoras a partir da crítica a algumas iniciativas grupais na saúde.
Resultados e Discussão O ponto de partida que justifica a prática grupal é o fato de que qualquer transformação social só ocorre quando os indivíduos se agrupam. Ela pode referir-se a mudanças estruturais, mas também a iniciativas locais, no cotidiano de serviços de saúde, tendo o grupo como importante mediador entre indivíduo e sociedade. Visando problematizar as práticas educativas grupais na saúde, seguem alguns tópicos: 1) Agrupamentos e processos grupais. Juntar pessoas para apresentação de algum tema é diferente de compor um grupo para discuti-lo, o que exigiria investir no processo grupal em si, ensejando possibilidades de interação produtiva no grupo, em relação ao objeto da atividade ou ao fortalecimento do próprio grupo. Na interação produtiva o grupo atua como grupo-sujeito, em contraposição ao grupo-objeto (LOUREAU, 1989). 2) Coerência entre proposta grupal e perspectivas pedagógicas. O termo “roda de conversa” por vezes é desvirtuado da proposta original freiriana, tornando-se apenas um modo de organizar as pessoas em um espaço, sem se garantir a horizontalidade das discussões, o reconhecimento de diferentes saberes e a construção compartilhada de conhecimento. 3) “Ninguém se conscientiza separadamente dos demais” (FIORI, 1987, p. 8). A conscientização tomada como parte de um processo que envolve um despertar crítico acerca dos contextos que vulnerabilizam a saúde do grupo enquanto tal e não com a pretensão de inculcar prescrições sobre o melhor modo de cuidar da saúde. 4) Compromisso com a transformação das condições sociais. Fomentar o “inédito viável”. Sob diferentes gradientes, qualquer processo que mire conscientização acerca de situações que limitam o bem viver pode aspirar o novo, que rompa com a situação presente, atentando-se para esse movimento que caracteriza o grupo.
Conclusões/Considerações finais Sob a lógica da biomedicina e da produtividade, as práticas educativas seguem secundarizadas e calcadas em propostas pedagógicas tradicionais, utilizando-se de grupos como mera forma de otimizar o tempo, “transferindo-se conhecimentos” a um número maior de pessoas. Defende-se que o investimento em processos pedagógicos grupais, que valorizem o próprio processo grupal e que sejam comprometidos com o pensamento crítico e com inéditos viáveis, pode servir de laboratório para a participação cidadã nas questões de saúde que visem transformações sociais. Os grupos não são naturalmente prontos para o exercício democrático da cidadania, posto que tal perfil é plasmado a partir de práticas cotidianas envolvendo olhares e juízos críticos, argumentativamente sustentados e regidos por princípios éticos que respeitem a diversidade em todos os aspectos, inclusive de opiniões. Mesmo considerando os desafios, as práticas pedagógicas grupais teriam muito a contribuir para esse exercício de democracia.
Referências FERNANDEZ, A.M. O campo grupal. Notas para uma genealogia. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
FIORI, E. M. Prefácio. In: FREIRE. P. Pedagogia do Oprimido. 38. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1987.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 38 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
LANE, T.M.S. O processo grupal. In: LANE, T.M.S; CODO, W (orgs). Psicologia Social. O Homem em Movimento. 8 ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1989.
LOUREAU, R. A Análise Institucional. Petrópolis. Vozes, 1975.
Fonte(s) de financiamento: Nenhuma
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