49486 - CURSO SOBRE SAÚDE E AGROTÓXICOS PARA O FORTALECIMENTO DO SUS NO CAMPO: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA RAQUEL GARCIA AGUILA - UNILAB, SAMUEL ÁTILA NOGUEIRA - RNMP, LEANDRO ARAÚJO DA COSTA - MST, ALAN RAYMISON TAVARES RABELO - FIOCRUZ, ANA PAULA DIAS SÁ - FIOCRUZ, OSEIAS D PAULA DOS REIS - MST, ANANA AZEVEDO CHAVES - RNMP, HELLEN LIMA ALENCAR - RNMP, RAFAELLA BARROS DE SOUSA - RNMP
Contextualização
O uso de agrotóxicos ganha cada vez mais espaço ao passo que alguns países fazem o movimento de controlar e banir há décadas. No Brasil, cerca de 42% das substâncias comumente utilizadas já são proibidas na União Europeia (Castro, 2020). Ainda assim, há iniciativas de setores ligados ao agronegócio no legislativo, como exemplo o Projeto de Lei (PL) 1.459/22 que retira o registro dos órgãos reguladores para facilitar a aprovação de substâncias. Dessa forma, percebe-se o quanto a população brasileira está em risco, agravado principalmente em relação às condições de saúde das populações rurais.
Nesse sentido, alguns movimentos sociais, a exemplo o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), fazem uma frente de resistência debatendo a temática dos agrotóxicos e trazendo soluções que passam de propostas de reforma agrária à agroecologia. Como também a Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares (RNMP), um movimento social que desde sua fundação em 2015 articula-se na defesa do direito universal à saúde e nos interesses do povo brasileiro. Experiências já demonstraram que a educação e vigilância popular em saúde promovida pelos movimentos sociais contribuem com a construção do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo fundamentais para uma frente de resistência aos agrotóxicos (Meneses, 2024).
Descrição da Experiência
O curso “Saúde e Agrotóxicos para o Fortalecimento do SUS no Campo” foi articulado pelo MST, a RNMP, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos para ampliar o debate na temática entre os profissionais de saúde e fazer o enfrentamento contra os agrotóxicos no Brasil.
A experiência fundamentou-se nos princípios de organicidade que vêm das vivências dos movimentos sociais, sendo um impulsionador do processo de tomada de consciência levando os indivíduos a se organizarem ao redor de um objetivo determinado (Makarenko, 2016). O curso contou com a divisão dos participantes em Núcleos de Base (NBs), exercitando o cuidado coletivo com os objetivos propostos e facilitando a participação ativa.
A mística esteve presente durante todo o curso, sendo compreendida como um elemento da cultura presente na luta política capaz de manter viva a esperança e sendo manifestada através de música, artes, bandeiras e até mesmo do entusiasmo, alegria, criatividade e troca de experiência entre as pessoas durante o processo (Santos, 2019).
As duas etapas do curso envolveram análise de conjuntura política sobre os agrotóxicos, módulos de toxicologia, alterações fisiopatológicas, monitoramento das populações afetadas e visitas externas à experiências agroecológicas.
Objetivo e período de Realização
O curso contou com duas etapas, a primeira de 24 a 28 de maio de 2023 e a segunda de 01 a 05 de maio de 2024, no Rio de Janeiro, com objetivo geral de debater a questão dos agrotóxicos no Brasil e suas consequências na saúde da população direta e indiretamente.
Resultados
Uma das grandes relevâncias do curso foi o aprendizado de como estabelecer o nexo causal entre a exposição aos agrotóxicos e o desenvolvimento de doenças, já que esse é um dos grandes entraves quando se fala em subnotificações e denúncias. Ter profissionais no SUS capazes de conseguir relacionar sinais e sintomas de intoxicação com a exposição aos agrotóxicos é fundamental para uma vigilância em saúde capaz de preservar o direito à vida, à cultura, aos territórios e corpos saudáveis.
Os participantes saíram capacitados para reproduzir o curso em seus territórios, adaptando aos diferentes públicos e realidades, dialogando com profissionais de saúde, trabalhadores do campo e da cidade, agrônomos, entre outros. Algumas dessas iniciativas já aconteceram e estão acontecendo, como rodas de conversa, palestras, vivências, organizadas pelos agora multiplicadores.
Formou-se também um Grupo de Trabalho para dar continuidade aos estudos sobre o tema, subsidiando o debate e respaldando cientificamente as posições públicas, além de manter a articulação política com os movimentos sociais e políticos contra os agrotóxicos e o elo construído entre os próprios participantes.
Aprendizado e Análise Crítica
No Brasil, não há orientação técnica necessária para o uso correto de agrotóxicos (Brasil, 2013), aliada a dificuldade do acesso aos serviços de saúde por parte dos trabalhadores afetados e grande subnotificação dos casos de intoxicação, por vários motivos, dentre eles a ausência da percepção da importância de fazê-la pelo profissional (Tosetto, 2016).
Soma-se a essas dificuldades o padrão de intoxicação dos trabalhadores, que em muitas vezes é crônico, coletivo e relacionado ao modo produção e reprodução social, com condições que agravam o contato com os agentes tóxicos e provocam processos mórbidos (Breilh, 2006). Sem quaisquer outras possibilidades de modo de vida e de trabalho, de forma que a maioria das complicações advém assim fundamentalmente da exploração dos trabalhadores rurais e do modo de produção capitalista.
Dessa forma, é fundamental construir iniciativas que promovam o debate sobre o tema com profissionais de saúde para o fortalecimento do SUS e na defesa da agroecologia, essa foi a proposta do curso. Na experiência, os participantes não foram meros ouvintes, mas sim multiplicadores nos seus territórios, tornando-os permanentes articuladores da luta contra o uso dos agrotóxicos, em conjunto com os movimentos sociais e populares.
Referências
Castro, L. B. et al. Agrotóxicos perigosos Bayer e BASF – um negócio global com dois pesos e duas medidas. Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. 2020.
Tosetto, EC. Identificação das causas das subnotificações das intoxicações da população exposta a agrotóxicos: estudo de caso de Laranjeiras do Sul – PR. 2016.
Brasil, Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta. 1 ed. 2013.
Breilh, J. Epidemiologia crítica: ciência emancipadora e interculturalidade. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2006.
Meneses, Michele Neves et al. Vigilância popular em saúde: produção de vida em movimento no assentamento do mst, rio grande do sul. 2023, Recife.
Bretas, SA. Novaes, KG. O conceito de coletividade de Anton Makarenko, em seu Poema pedagógico. Rev. Bras. Estud. Pedagog. 2016
Santos, JS. A poética social de ademar bogo: dialética entre produção literária e militância política. Brasília, 2019.
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