Roda de Conversa

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC4.16 - Atenção Primária à Saúde (1)

51072 - A QUALIDADE DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: PERSPECTIVA HISTÓRICA, DILEMAS ATUAIS E DESAFIOS FUTUROS
ERIKA MARIA SAMPAIO ROCHA - UFES, PABLO DE ALMEIDA BOITEUX - PABOITEUX@GMAIL.COM, THIAGO DIAS SARTI - TDSARTI@GMAIL.COM, STEPHANIA MENDES DEMARCHI - STEPHANIAMENDES2008@HOTMAIL.COM, MARIA ANGÉLICA CARVALHO ANDRADE - GELIANDRADE@GMAIL.COM


Apresentação/Introdução
A qualidade do cuidado e dos serviços de saúde tem adquirido crescente destaque na agenda política de organizações internacionais para o fortalecimento dos sistemas de saúde e da Atenção Primária à Saúde(APS), para que eles possam responder às necessidades de indivíduos e de populações em um cenário global complexo e em constante mudança. Problemas como o envelhecimento progressivo da populacional mundial, o aumento na proporção de doenças crônicas não-transmissíveis, a persistência de fragilidades nos sistemas de saúde e de iniquidades no acesso aos seus serviços em diversos países, as crises migratórias, dentre outros, demandaram a renovação de compromissos em torno do papel fundamental da APS, na busca por um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas: assegurar vidas saudáveis e promover bem-estar para todos, em todas as idades. Entretanto, é fundamental que nós definamos o que “qualidade” significa neste contexto do cuidado em saúde, face aos projetos políticos, econômicos e sociais atualmente em disputa no campo da saúde global, bem como sobre suas possíveis implicações para o futuro do cuidado em saúde.

Objetivos
Contribuir para o debate sobre qualidade do cuidado e dos serviços de saúde, especificamente na APS, frente aos projetos políticos, econômicos e sociais em disputa no campo da saúde global, refletindo sobre as possíveis implicações para o futuro do cuidado em saúde.

Metodologia
Resgate histórico dos arcabouços teóricos-conceituais sobre o tema, estruturado em dois recortes temporais: anos 1960 a 2000 e dos anos 2000 até os dias atuais. No primeiro momento, o nascimento do movimento pela qualidade do cuidado em saúde e ascensão da APS na Agenda Global, o estudo caracterizou: a ampliação do arcabouço de Avedis Donabedian, desde o modelo de estrutura-processo-desfecho até a proposição dos “sete pilares” da qualidade do cuidado em saúde, a insistência do autor para a definição conceitual e operacional de “qualidade do cuidado” e de critérios mensuráveis e comparáveis de avaliação; as contribuições seminais de Bárbara Starfield, na década de 1990, sistematizando elementos estruturantes da APS em atributos “essenciais” e “derivados”; critérios e dimensões propostos por autores como Vuori, Maxwell, Lee Jones e Gattinara. A Conferência Internacional de Alma-Ata(1978), marcou o período com uma perspectiva de APS abrangente e coordenadora dos sistemas de saúde. No segundo recorte temporal, este arcabouço conceitual foi discutido frente aos principais relatórios e publicações de instituições internacionais.

Resultados e Discussão
Apesar dos avanços e sinergias entre o desenvolvimento teórico-conceitual e a proeminência da APS na agenda internacional, a ascensão de regimes neoliberais, no final do século XX, implicou em programas de ajuste estrutural e restrição de gastos públicos. O ideário do direito universal à saúde com equidade e justiça social foi convertido na disponibilização de pacotes mínimos de serviços de APS, seletivos e focalizados, direcionados a problemas de saúde e a grupos populacionais específicos. O estudo mostra as transformações nas dimensões da qualidade do cuidado e ressignificações da APS presentes em iniciativas e documentos de organizações internacionais. Documentos estruturados pela Organização Pan-Americana da Saúde(OPAS) foram marcados por tentativas de retomar o legado de Alma-Ata a partir da mútua influência dos pensamentos de Donabedian e de Starfield. Em paralelo a estas discussões, o estudo apresenta a estruturação do conceito de Cobertura Universal de Saúde (Universal Health Coverage – UHC), estruturado pela Organização Mundial de Saúde(OMS), juntamente com o Banco Mundial e a Fundação Rockefeller, inicialmente apresentado de forma ambígua mas aprofundado em relatórios subsequentes. As discussões sobre a qualidade do cuidado na APS acabaram preteridas em favor do discurso da UHC, com a proposição de estratégias para ampliação gradativa do financiamento e da disponibilização de pacotes de serviços de saúde essenciais às pessoas e populações, de acordo com as condições e as realidades dos diferentes países. Em relação à agenda para a APS, a OMS e a UNICEF produziram uma série de documentos de conteúdo técnico e político oferecendo subsídios para fortalecimento da APS à luz da UHC e da Agenda 2030.

Conclusões/Considerações finais
O panorama histórico ora analisado, marcado por rupturas, permanências e disputas retóricas entre diferentes atores e projetos sociais, políticos e econômicos, expõe como a busca por sistemas de saúde de alta qualidade, baseados em uma APS forte, coordenadora do cuidado e centrada nas necessidades das pessoas e de suas comunidades, implica em decisões tanto políticas quanto técnicas particularmente desafiadoras, sobretudo nos países de renda média e baixa, que tendem a perpetuar uma concepção de APS como serviços básicos somente para pobres, e não como núcleo central de cuidado para todas as pessoas. E neste contexto, existem questionamentos sobre o real significado da UHC: Seria a APS da UHC esse pacote de serviços essenciais, uma nova roupagem para a velha abordagem seletiva para o alcance de um universalismo mínimo para os países em desenvolvimento? O que é “essencial” em saúde? Acesso, mesmo que sem qualidade? Cobertura ou direito universal à saúde?


Referências
DONABEDIAN, A. The seven pillars of quality. Arch. Pathol. Lab. Med., v. 114, p. 1115-1118, 1990.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS); BANCO MUNDIAL (BM); ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO ECONÔMICA E DESENVOLVIMENTO (OCED). Delivering quality health services: a global imperative for universal health coverage, 2018. Disponível em: . Acesso em: 6 jun. 2020.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS); FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFÂNCIA (UNICEF). Declaration of Alma-Ata International Conference on Primary Health Care, Alma-Ata, USSR, 6-12 September 1978. Disponível em: <>. Acesso em: 10 jun 2020.

STARFIELD, B. Primary care: concept, evaluation, and policy. New York: Oxford University Press, 1992.

Fonte(s) de financiamento: O estudo não contou com fontes de financiamento.


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