Roda de Conversa

05/11/2024 - 08:30 - 10:00
RC4.13 - Rede de Atenção às pessoas com Condições Crônicas

49439 - SOU UM DIABÉTICO PASSIVO: O VIVER COM DIABETES E OS DESAFIOS COMPARTILHADOS NO CONTEXTO FAMILIAR E SOCIAL
FABIANA DE GUSMÃO CUNTO HEEREN MACEDO - UFRJ, LEONARDO HEEREN MACEDO, NEIDE EMY KUROKAWA E SILVA - UFRJ


Apresentação/Introdução
O diabetes mellitus é uma condição crônica que desafia as pessoas acometidas a mudar radicalmente seu estilo de vida, a fim de controlar a doença. Em geral, o foco do cuidado é voltado para a pessoa com a doença, sobretudo quanto à dieta alimentar e prática de exercícios físicos. Entretanto, o fato de tais hábitos estarem diretamente relacionados à convivência social, acaba dificultando o controle da doença, ou porque a pessoa com diabetes é quem prepara os alimentos para a família ou porque ela tem que consumir alimentos preparados para “não diabéticos”, no âmbito doméstico, em restaurantes ou em ocasiões sociais festivas. Torna-se importante relacionar as possibilidades de controle dessa doença crônica ao estilo de vida cristalizado do seu entorno, considerando-se as consequentes limitações que ele pode representar (CYRINO, 2009; PORTELA, 2022). Dessa forma, a gestão do cuidado do diabetes se torna um desafio, que reverbera nas dinâmicas familiares e sociais. A compreensão desse fenômeno pode fornecer insights valiosos sobre os desafios enfrentados por aqueles que convivem com o diabetes e sobre o cuidado de sua saúde. Ao entender melhor como o diabetes afeta não apenas o paciente, mas também seu entorno, podemos desenvolver estratégias mais eficazes de apoio e intervenção.

Objetivos
Compreender os contextos familiares e de amizade de pessoas que vivem com diabetes e como podem contribuir para o controle da doença e cuidado à saúde.

Metodologia
Trata-se de um recorte de pesquisa qualitativa, desenvolvida em uma Clínica da Família no município do Rio de Janeiro, que buscou investigar as experiências de pessoas que vivem com diabetes, durante a pandemia de Covid-19. A seleção dos participantes foi precedida por uma atividade grupal, para a qual pacientes da Clínica, com diagnóstico de diabetes tipo 2 foram convidados. Para a presente análise, foram destacadas 6, das 16 entrevistas em profundidade realizadas entre fevereiro e abril/2024, posto que apresentaram menção explícita à dimensão familiar na gestão do cuidado do diabetes. As entrevistas foram realizadas por meio de um roteiro com perguntas abertas, que trouxeram, para além dos objetivos já delimitados, outras questões inicialmente não previstas, como o tema em pauta, referente ao controle do diabetes frente aos contextos familiares e de amizade. O estudo teve como referências o conceito de Cuidado (AYRES, 2006) e a teoria narrativa (RICOEUR, 2006). A análise do material guiou-se pela hermenêutica (RICOEUR, 2001).

Resultados e Discussão
No grupo que precedeu as entrevistas individuais participou o marido de uma usuária da unidade de saúde que teve diagnóstico de diabetes há 10 anos, e que fez questão de dar o seu depoimento, na qualidade de “diabético passivo”, como ele próprio se nomeou, inspirando o presente trabalho. Seu argumento para exercer o “direito” de participar da pesquisa é de que, embora não tivesse a doença, seu cotidiano envolvia a mesma rotina da esposa, como a adaptação a novos hábitos alimentares, rotinas de exercícios, além do acompanhamento do monitoramento da glicose. Perscrutando outras narrativas, foi possível identificar outras situações, de apoio da família, que buscava consumir os mesmos alimentos permitidos à pessoa com diabetes, ou que se preocupava em disponibilizar dieta diferenciada a elas. Já no contexto extrafamiliar, foram apontadas maiores dificuldades, seja em restaurantes ou mesmo em eventos sociais festivos, muitas vezes regados a doces e refrigerantes com açúcar, sem outras opções a quem apresenta restrições alimentares. Tal situação não apenas priva as pessoas do eventual prazer de consumir tais alimentos, mas por vezes gera segregação social por parte dos “não diabéticos”, com frases como: “só um pedacinho de bolo não vai fazer mal” ou, em outro extremo, gerada por um patrulhamento e condenação de quem cair na tentação de comer um brigadeiro.

Conclusões/Considerações finais
Abordar a ideia dos "diabéticos passivos", como aqueles que fazem parte da rede familiar de pessoas com essa doença pode ser potente para o cuidado integral à saúde, por meio da construção de estratégias de intervenção direcionadas não apenas ao paciente, mas também aos grupos aos quais pertence, promovendo um ambiente de suporte. Para isso é importante que os serviços de saúde adotem uma compreensão sensível sobre as dinâmicas familiares, a partir da escuta atenta às suas histórias, cenários, personagens e sentimentos. Vale por fim pontuar que, como recurso retórico, a referência ao termo “diabético passivo”, inspirada na ideia do fumante passivo, difere radicalmente deste, posto que exige de quem convive com pessoas que têm diabetes, ao contrário, muita atividade, iniciativa e sensibilidade a ponto de compartilhar do seu cuidado, desde a abdicação, em ambientes comuns, do desfrute de certos alimentos até procedimentos como a medição de glicose ou administração de insulina.

Referências
AYRES, JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saude Soc. 2004; 13(3):16-29.

CYRINO, AP. Entre a ciência e a experiência. Uma cartografia do autocuidado no diabetes. São Paulo: Editora UNESP, 2009

PORTELA, RA et al. Diabetes mellitus type 2: factors related to adherence to self-care. Revista Brasileira de Enfermagem [online]. 2022, v. 75, n. 04.

RICOEUR, P. Del texto a la acción. Ensayos de hermenéutica II. México: Fondo de Cultura Económico, 2001.RICOEUR P. La vida: um relato em busca de narrador. Ágora – Papeles de Filosofia, 2006; 25(2): 9-22.


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