Roda de Conversa

05/11/2024 - 08:30 - 10:00
RC4.12 - Rede de Acolhimento e Cuidado

49751 - GESTÃO DO CUIDADO: CÍRCULOS DE CONSTRUÇÃO DE PAZ COM OS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE DE FORTALEZA/CE
MARIA CRISTIANE LOPES DA SILVA - UFC, RENATO ÂNGELO DE ALMEIDA MOREIRA - UECE, ANA PATRÍCIA PEREIRA MORAIS - UECE, GLÓRIA MARIA DOS SANTOS DIÓGENES - UFC, GEOVANE JACÓ DE FREITAS - UECE, LÍLLIAN VIRGÍNIA CARNEIRO GONDIM - UECE, ANYA PIMENTEL GOMES FERNANDES VIEIRA MEYER - FIOCRUZ/CE, TAMARA BRAGA SALES - UECE, YARA MARQUES LIMA - UFC, CARLIANA ISABEL NASCIMENTO PEREIRA - UFC


Apresentação/Introdução
A violência nos territórios de atuação das equipes de Atenção Primária à Saúde (APS) tem-se revelado desafiadora e, além de ser uma percepção empírica e axiomática, evidenciou-se também prejudicial em vários níveis que vão do institucional-laboral ao pessoal da população em geral das áreas afetadas. Porém, não só os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) são afetados pela violência urbana, mas os próprios Agentes de Saúde Comunitários (ACS) implicados física e psicologicamente. O caso dos ACS é paradigmático, uma vez que recentes pesquisas corroboram a vulnerabilidade sofrida por estes profissionais, ainda agravados em contexto de realidade pandêmica, como observado no caso da COVID-19. Notadamente, Vieira-Meyer et al. (2022, p. 14) corroboram a afecção da violência sobre os ACS no estado, assim como seu caráter de vulnerabilidade frente ao problema, quando afirmam que “observou-se maior percentual de risco elevado de sintomas depressivos (SRQ-20 ≥ 7) neste estudo quando comparado aos demais da população de risco”. A partir destas constatações, o Laboratório da Conflitualidade e da Violência-COVIO da UECE, em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz/CE), realizaram o curso “Cuidando dos Conflitos e Prevenção à Violência nos Territórios”, orientado para ACS em condição de trabalho em territórios afetados pela violência.

Objetivos
Geral: Refletir como os ACS percebem os Círculos de Construção de Paz (CCP) na atividade laboral nos territórios afetados pela violência no município de Fortaleza/CE.
Específicos: Analisar os relatos dos ACS na sua prática laboral; entender a percepção sobre conflito, violência e gestão de cuidado no trabalho dos ACS.


Metodologia
A natureza da pesquisa foi qualitativa, com uma abordagem reflexiva-interpretativa (Weber, 1991). Isto envolve não apenas descrever o fenômeno, mas também conseguir construir outros olhares e outros saberes a partir da aproximação do campo, dos interlocutores e dos elementos que os cercam (Demo, 1985).
Priorizamos os seguintes procedimentos: aplicação de formulários (inicial e final); observação participante, que envolveu nossa imersão no campo, permitindo obter insights e minúcias do que não foi possível apreender nos formulários; registro das apreensões captadas em diário de campo para não perder as minúcias do fenômeno.
Os interlocutores foram 20 (vinte) ACS da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Fortaleza-CE, que anteriormente tinham participado do “Projeto de Pesquisa Panorama Violência, Processo de Trabalho dos ACS”. A pesquisa ocorreu com a facilitação dos dois primeiros autores deste relato, com a orientação dos demais coautores na sede da Fiocruz/CE. Analisamos os dados com a abordagem de Bardin (1977) e os CCP como metodologia das conversas.


Resultados e Discussão
Diante do campo pesquisado, optamos por refletir como os Círculos de Construção de Paz contribuíram com a atividade laboral dos/as ACS a partir de suas próprias percepções e expectativas com relação ao curso. No início dos encontros formativos, eles demonstraram um certo receio por não entenderem ao certo como seria a formação: “não sei bem o que estou fazendo aqui, por isso fico meio assustada”; “muito estranho estar sentado em roda de conversa com meus colegas de trabalho, estou ansiosa para saber o que vamos fazer” (ACS, Diário de campo, 28 de abril de 2023).
Observamos que eles percebem a importância da prática dos CCP no dia a dia de trabalho e gestão de cuidado para o bem-estar emocional. Além disso, relataram mudanças de atitudes com relação aos seus comportamentos: “reconheço que eu atropelava a fala do pessoal nas reuniões, agora, com esse ‘bastão da fala’, eu espero chegar a minha vez”; “vi aqui no CCP que as pessoas têm necessidades diferentes, por isso preciso escutá-las”; “esse exercício de esperar minha vez aqui no CCP me fez reconhecer como a escuta é importante para atender os usuários” (ACS, Diário de campo, 12 de maio de 2023).
Refletimos que os CCP são reconhecidos como uma prática que contribuiu com o fazer laboral dos ACS, que de alguma forma eles passaram a agir de outra forma: “metodologia que aproxima as pessoas, fazendo com que possam ouvir mais uns aos outros com empatia e compreensão de que somos individualmente diferentes” (Diagnóstico Final, dia 07 de junho de 2023). Em suma, os ACS percebem que os CCP representam uma metodologia significativa para a mudança de comportamento, com escuta e diálogo transformativo na atuação profissional e cuidado de si e do outro (Freire, 1992; Pranis, 2010; Silva, 2023).


Conclusões/Considerações finais
A pesquisa desenvolvida durante a realização do curso de formação “Cuidando dos Conflitos e prevenção à Violência nos Territórios”, orientado para os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) de Fortaleza/CE, trouxe vários indícios acerca das condições de trabalhos dos ACS, além de dados robustos sobre como o conflito e a violência afetam o trabalho destes. O estudo revelou, ainda, a viabilidade e efetividade das metodologias dialógicas, em geral, e dos CCP, em particular, como alternativa no enfrentamento de condições adversas de trabalho na APS. Tais constatações apontam para a capacidade cognitiva para o “saber lidar” com situações de conflito e violência, uma significativa habilidade com potencial de combate ao estresse e afecções psíquicas e laborais dos ACS em Fortaleza. Além disso, o estudo abre um campo promissor de investigação a ser aprofundado com outras pesquisas de maior fôlego.

Referências
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
DEMO, P. Ciências sociais e qualidade. São Paulo: ALMED, 1985.
FREIRE, P. Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
PRANIS, K. Processos circulares de construção de paz. Tradução: Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2010.
SILVA, M. C. L. da. Círculos de Construção de Paz: experiência e olhares na escola pública. 2. ed. São Paulo: Editora Dialética, 2023.
WEBER, M. Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991.
VIEIRA-MEYER et al. Violence in the neighborhood and mental health of community health workers in a Brazilian metropolis. Cadernos de Saúde Pública, [S. l.], v. 38, n. 12. p. e00022122, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311XEN022122. Acesso em: 23 maio 2024.


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