53944 - O NEOLIBERALISMO E A NORMALIZAÇÃO DO SOFRIMENTO BIOPSICOSSOCIAL AMANDA CORSANI DIAS DE OLIVEIRA - UFSC, WALTER FERREIRA DE OLIVEIRA - UFSC, FERNANDA DENISE SATLER - UFSC
Apresentação/Introdução Testemunhamos, nas últimas décadas, o avanço do modelo neoliberal de existir, atingindo enormemente os contextos político, social e econômico. O modelo exacerba concentrações de renda e desigualdades sociais, influencia as dimensões biopsicossociais, a vida cotidiana de pessoas, grupos e instituições e tornou-se hegemônico no mundo ocidental. Sua adoção é particularmente nefasta para grupos vulnerabilizados e sistemas públicos de saúde e suporte social. No Brasil o modelo tem se impulsionado pela ascensão de grupos políticos de extrema direita e suas estratégias de desinformação, mitificação e polarização que fomentam ambientes dominados por falsas narrativas apoiadas em discursos pessoais e institucionais transmitidos em massa por redes sociais. Visam, assim, dominar o mundo social e institucional, a vida das pessoas e o exercício da cidadania. As instituições ligadas à saúde coletiva e particularmente à saúde mental são especialmente atingidas e apresentam especial complexidade por sua natureza eminentemente intersetorial. O sofrimento psíquico tornou-se tema de interesse geral, com profundas repercussões sociais, econômicas e na vida de indivíduos, famílias e comunidades, particularmente após a pandemia de covid-19. Neste trabalho pretendemos discutir como o neoliberalismo afeta a vida contemporânea no que tange às condições que propiciam sofrimentos psíquicos.
Objetivos Compreender repercussões psicossociais do neoliberalismo; Discutir efeitos do neoliberalismo sobre as dimensões biopsicossociais e na vida cotidiana de pessoas, grupos e instituições; Revisar a literatura acadêmica sobre estes efeitos; Refletir sobre desafios e estratégias para o enfrentamento ao modelo neoliberal nos âmbitos pessoal, grupal e institucional. Identificar marcos contributivos à radicalização política na história recente. Todos estes objetivos com foco no Brasil.
Metodologia Revisão de literatura a qual, segundo Rodgers e Knafkla (2000), não se compromete às limitações de busca das revisões sistemáticas e integrativas. O descritor "neoliberalismo" foi utilizado como principal, combinado com os descritores “saúde mental”, “saúde mental coletiva”, “radicalização política” e “atenção psicossocial” separadamente nos portais da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e do catálogo de teses e dissertações da CAPES publicados nos últimos 10 anos, ou seja, a partir de 2014. Na BVS obtivemos 23 artigos, já excluindo aqueles que estavam repetidos. Após leitura dos resumos nesta base de dados, restaram 09 artigos que sustentaram a análise. Já no catálogo da CAPES encontramos 22 trabalhos, sendo 04 teses de doutorado e 18 dissertações de mestrado. Após a leitura dos resumos, selecionamos 1 tese e 5 dissertações para análise. Outros referenciais teóricos que versavam sobre o tema também foram consultados. Após a leitura procedemos a análise de conteúdo proposta por Lawrence Bardin e atualizada por Duarte e Barros (2010), mesclando com a análise dialética conforme as orientações de Minayo (2001).
Resultados e Discussão O neoliberalismo atravessa a vida, a saúde e as relações de pessoas, grupos e instituições com pautas de extinção de regulação do Estado, liberação de fluxos de capitais e precarização do trabalho. Exploração, assédio moral, conflitos e medo de retaliação foram intensificadas com a pandemia da Covid, desmonte de políticas públicas, violação de direitos e negacionismo.
Divergências políticas, inclusive quanto à defesa do SUS, criam tensão e violência e abalam um equilíbrio já frágil. Rompimento de contratualidades, manifesto como desrespeito, desentendimento e injúria deterioram relações, espaços laborais e comunitários e prejudicam o manejo de conflitos por vias democráticas. Discursos nas mídias infundem medo de confisco de bens e de perda de valores morais, familiares e das liberdades religiosa e de expressão. Manipulam-se afetos, gerando sofrimentos psíquicos e demandas na clínica geral e psicossocial.
Especialmente danosa é a pressão por “sucesso”, representado por monetização e consumo, e para uma glória que não pode ser totalmente alcançada, pois o princípio do acúmulo de capital não permite sensação de saciedade. Nos mais vulnerabilizados exacerba-se a angústia já presente pela dificuldade de suprir necessidades mínimas aumentando sofrimento e os diagnósticos de transtornos vários validados pelo complexo médico-industrial. Ampliam-se os manuais de doenças, patologizando a vida e transformando massas em consumidores de medicações e de internações médicas e psiquiátricas.
Conclusões/Considerações finais O neoliberalismo se instala não apenas como um sistema de produção de bens e serviços, mas como produtor de subjetividades. O esforço neo liberal de maximizar as potencialidades econômicas dos sujeitos, implica em sofrimento psíquico, à medida que o fracasso às contingências dos fatos sociais dispostos no contexto neoliberal, são de responsabilidade exclusiva do sujeito.
Neste cenário, o saber da psiquiatria hegemônica reforça a lógica de abstração dos contextos sociais e coletivos que provocam o sofrimento psíquico, colocando este como uma questão exclusivamente individual.
Frente ao cenário de psiquiatrização do sofrimento, a escuta pode ser uma via para que consciências libertárias possam ser construídas. Através do diálogo entre diferentes agentes sociais é possível pensar em soluções para a resistência às propostas existenciais nefastas do neoliberalismo e na elaboração das formas de vida coletivas que fujam à exacerbação do individualismo, do consumismo e da competitividade.
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