Roda de Conversa

06/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC7.10 -Tecnologias Digitais na Atenção Primária à Saúde: conceitos, informação, comunicação e trabalho

52082 - TELECARDIOLOGIA E EQUIDADE EM SAÚDE: USO DA SAÚDE DIGITAL NA AMPLIAÇÃO DO ACESSO À SAÚDE CARDIOVASCULAR PARA A POPULAÇÃO PRETA
THIAGO GONÇALVES DO NASCIMENTO PIRÔPO - UFPE, FRANCISCO DE SOUSA RAMOS - UFPE


Apresentação/Introdução
As doenças cardiovasculares (DCV) são uma das principais causas de mortalidade global, impactando os gastos com saúde (SIQUEIRA; DE SIQUEIRA-FILHO; LAND, 2017). No Brasil, a situação é agravada pelas desigualdades no acesso a serviços, especialmente para a população preta (IBGE, 2020). A telecardiologia, através do uso de ECG remotos, surge como uma solução para expandir o acesso ao cuidado e melhorar a qualidade de vida da população (JÚNIOR et al., 2015).
O acesso universal à saúde é essencial para a equidade no sistema de saúde. No Brasil, apesar da Constituição de 1988 garantir esse direito, a prática mostra outro cenário, com disparidades raciais e socioeconômicas (IBGE, 2020). A telemedicina, e especificamente a telecardiologia, pode mitigar essas barreiras, oferecendo serviços especializados sem a necessidade de deslocamento físico (RIBEIRO et al., 2010).
A implementação de tecnologias de telemedicina deve ser vista como uma extensão do princípio de universalidade do SUS. No entanto, a efetivação desse princípio enfrenta desafios como infraestrutura tecnológica insuficiente e capacitação inadequada dos profissionais em regiões mais pobres. A telecardiologia oferece promessas substanciais, mas sua implementação eficaz exige políticas públicas, investimento em infraestrutura e programas de formação contínua para profissionais da saúde (PAIM et al., 2011).

Objetivos
Analisar a implementação do telediagnóstico por meio de Eletrocardiogramas (ECG) em internações por doenças cardiovasculares em municípios baianos onde o serviço foi implantado. O intuito é evidenciar a relevância e a eficácia deste serviço na mitigação de iniquidades e na promoção da equidade em saúde. Há um enfoque particular na população que se autodeclara preta ou parda, com considerações especiais relativas ao acesso ao cuidado e ao número de internações por DCV neste grupo populacional.

Metodologia
A pesquisa adotou um delineamento quase-experimental, não randomizado, de natureza descritiva e analítica, com abordagem quantitativa. Utilizou-se dados secundários para a análise pré e pós-intervenção, empregando o método de estimador de Diferenças-em-Diferenças para analisar a implementação da telecardiologia, controlando fatores externos que poderiam influenciar os resultados (BEATTY; SHIMSHACK, 2011).
O método de Diferenças-em-Diferenças, eficaz em estudos de intervenções em saúde pública, permite inferir efeitos causais e avaliar o impacto da telecardiologia nas internações por DCV, ajustando para tendências e variações, pois considera tanto a evolução temporal dos dados quanto as diferenças entre grupos de controle e de intervenção (FOGUEL et al., 2017)
Os dados foram coletados de registros hospitalares dos sistemas de saúde pública. Incluíram-se municípios baianos que implementaram a telecardiologia, comparados a municípios sem a tecnologia. Foram consideradas variáveis como número de internações, tempo e custos de internamento e taxas de mortalidade, permitindo uma visão abrangente do impacto da telecardiologia na qualidade dos serviços de saúde.

Resultados e Discussão
Os resultados mostraram uma redução significativa nas internações por doenças cardiovasculares nos municípios que adotaram o telediagnóstico. Especificamente, houve uma redução de seis internações anuais por DCV (P< 0,004), com quatro dessas reduções ocorrendo entre pessoas autodeclaradas pretas (P< 0,007). Além disso, houve uma redução de 3,26 (P< 0,009) internações entre as pessoas com famílias beneficiadas no Programa Bolsa Família, diminuição média de três dias no tempo de internamento (P< 0,000), uma redução no custo médio por internação (P< 0,007) e uma redução de 9,54% na taxa de mortalidade (P< 0,000).
A análise desses resultados é reforçada pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), que destaca a vulnerabilidade das populações pobres e pretas no acesso a serviços de saúde no Brasil. Segundo a PNS, essas populações enfrentam barreiras significativas no acesso a cuidados preventivos e curativos, o que contribui para piores prognósticos (IBGE, 2020). A telecardiologia pode atuar na mitigação dessas barreiras, oferecendo um meio de diagnóstico e monitoramento contínuo que é acessível mesmo em regiões mais remotas e carentes, promovendo um sentimento de inclusão e segurança, alinhado com os princípios de equidade.
A discussão sugere que a telecardiologia facilita a identificação precoce de sinais de comprometimento clínico, permitindo intervenções tempestivas e, consequentemente, reduzindo o tempo de tratamento e os custos associados. Para a população preta, historicamente mais vulnerável e com menos acesso a cuidados de saúde de qualidade, essas melhorias são particularmente significativas. A tecnologia emergiu como uma ferramenta eficaz na redução das desigualdades de saúde, promovendo um acesso mais equitativo a diagnósticos e tratamentos especializados.

Conclusões/Considerações finais
A implementação da telecardiologia neste estudo demonstrou ser uma estratégia eficaz para reduzir internações, custos e mortalidade por doenças cardiovasculares, beneficiando especialmente a população preta. A telemedicina, ao aumentar o acesso a cuidados especializados, pode atuar como um poderoso instrumento na luta contra as desigualdades em saúde. Portanto, recomenda-se a expansão desta tecnologia em regiões com alta vulnerabilidade social e limitada oferta de serviços de saúde, garantindo assim uma atenção mais equitativa e de qualidade para todos.
Este estudo é crucial para a melhoria da qualidade em saúde e a ampliação do acesso para a população preta e economicamente fragilizada. A demonstração dos benefícios tangíveis da telecardiologia, fornece uma base sólida para a formulação de políticas públicas que visem a inclusão tecnológica no sistema de saúde. Além de salvar vidas, reforça a equidade no atendimento, tornando os serviços de saúde mais acessíveis e eficientes.

Referências
SIQUEIRA, A. DE S. E.; DE SIQUEIRA-FILHO, A. G.; LAND, M. G. P. Análise do impacto econômico das doenças cardiovasculares nos últimos cinco anos no Brasil. Arq. Bras. Cardio. RJ, 2017. JUNIOR, M. T. DE O. et al. Diretriz de telecardiologia no cuidado de pacientes com síndrome coronariana aguda e outras doenças cardíacas. Arq. Bras. Cardiol, RJ, 2015.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2019: percepção do estado de saúde, estilos de vida, doenças crônicas e saúde bucal. 2020.
RIBEIRO, A. L. P. et al. Implantação de um sistema de telecardiologia em Minas Gerais. Arq Bras Cardiol, MG, 2010.
PAIM, J. et al. The Brazilian health system: History, advances, and challenges. The Lancet, 2011.
BEATTY, T. K. M.; SHIMSHACK, J. P. School buses, diesel emissions, and respiratory health. J Econ. Saúde, 2011.
FOGUEL, M. N. Diferenças em Diferenças. Avaliação Econômica de Projetos Sociais. SP, 2012.

Fonte(s) de financiamento: Programa de Pós-Graduação em Gestão e Economia da Saúde (PPGGES) da Universidade Federal de Pernambuco, financiado pelo Departamento de Economia da Saúde, Investimentos e Desenvolvimento (CQIS/DESID) do Ministério da Saúde.


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