05/11/2024 - 13:30 - 15:00 RC7.5 - Saúde digital e vigilância: aprendizados, desafios e perspectivas |
51507 - CULTURAEDUCA.CC: O USO DAS NOÇÕES DE TERRITORIALIZAÇÃO NO REDESENHO DE UMA PLATAFORMA DE ANÁLISE INTRAURBANA DAS CONDIÇÕES DE VIDA E SAÚDE LEONARDO RAFAEL MUSUMECI - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (FSP-USP), KELLY ROSA BRAGHETTO - INSTITUTO DE MATEMÁTICA E ESTATÍSTICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (IME-USP), LEANDRO LUIZ GIATTI - FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (FSP-USP), TIAGO SILVA DA SILVA - INSTITUTO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO (ICT-UNIFESP)
Apresentação/Introdução Universalidade, equidade e integralidade são princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) cuja materialização guarda estreita dependência com os territórios. Tal compreensão, desde a década de 1990, resultou em propostas de territorialização dos serviços do SUS vinculadas à descentralização dos serviços e municipalização da gestão em saúde.
No processo de institucionalização, a noção se torna polissêmica, enquanto demarcação de limites das áreas de atuação dos serviços; reconhecimento do ambiente, da população e das dinâmicas sociais existentes nessas áreas; e estabelecimento de relações horizontais com outros serviços adjacentes e verticais, como centros de referência. (SANTOS e RIGOTTO, 2010). Entretanto, ainda há lacunas no acesso a dados em escala intraurbana que permitam apreender tais especificidades e adaptar os serviços a elas.
Pensando nisso, foram desenvolvidos projetos de pesquisa para redesenho de uma plataforma de mapeamento colaborativo e apresentação de dados secundários públicos intraurbanos com acesso aberto e abrangência nacional. Este trabalho traz aspectos da etapa de investigação conceitual, e busca mostrar como estas três noções de territorialização ajudaram a subsidiar um desenho afastado do campo capturado por dispositivos regulatórios do neoliberalismo, e da usual comoditização de soluções para problemas sociais e políticos (BRIA e MOROZOV, 2019).
Objetivos O trabalho se propõe a apresentar como a polissemia do conceito de territorialização ajudou a subsidiar o redesenho da interface e das funcionalidades da plataforma CulturaEduca. A plataforma foi criada entre 2013 e 2016, fruto de convênio entre Ministério da Educação e Ministério da Cultura. É hoje um ambiente de mapeamento colaborativo criado para armazenar, analisar e georreferenciar dados e ações em escala intraurbana, com abrangência nacional, usando e criando tecnologias livres.
Metodologia Partir de uma plataforma já existente e de uso consolidado implica a necessidade de considerar suas especificidades e a de seus usuários no processo de desenho da solução. Para tanto, seguindo a metodologia de design de interação (ROGERS ET AL, 2013), dividiu-se o projeto em cinco estágios: investigação, ideação, workshop, redesign e verificação.
Na etapa de investigação, de que faz parte este trabalho, foi realizada uma revisão da literatura acadêmica e cinzenta para aprofundar o estado da técnica e o quadro teórico da pesquisa. Ela contou com (1) revisão de literatura sobre temas como territorialização, intersetorialidade e cidades inteligentes. Além disso, foi feito (2) um mapeamento de plataformas com funcionalidades ou temáticas análogas; (3) uma pesquisa de tecnologias a serem utilizadas no desenvolvimento; e (4) identificação do perfil dos usuários e do uso da plataforma, com análise dos cadastros e aplicação de um questionário online (35 perguntas), divididas em 4 blocos: identificação; atuação; políticas públicas, cidades inteligentes e plataformas de visualização de dados/informações; e uso da plataforma), enviado a cerca de 600 usuários cadastrados na plataforma.
Resultados e Discussão Neste trabalho, busca-se apresentar como a noção de territorialização no Brasil se alterou ao longo do tempo e como a análise histórica desta trajetória colaborou no processo de redesenho da plataforma CulturaEduca.
Em relação ao primeiro eixo, nota-se que, até a década de 1990, o planejamento territorial era secundário, e que, a partir de então, há uma virada e o termo territorialização passa a ser mais largamente utilizado. São dessa década programas como os sistemas locais de saúde (SILOS) e a adoção do modelo de Saúde da Família na organização dos serviços de atenção básica. Já na década de 2000, a territorialização em saúde será tomada como técnica ou tecnologia de planejamento territorial ou como conjunto de metodologias para desencadear o processo de apropriação do território pelos serviços de saúde. Por fim, na passagem à década de 2010, passa a ser uma normativa, e a operar como princípio de organização presente em normativas como a Política Nacional de Atenção Básica.
Em relação ao segundo, nota-se tal contribuição sobretudo na combinação de suas três principais funcionalidades, a saber: (1) a apresentação de dados socioeconômicos (população, renda, escolaridade, etc) de um dado contexto em escala intraurbana extraídos de fontes oficiais; (2) a disposição de informações sobre as unidades de políticas públicas, a respeito do seu funcionamento, público atendido, e entorno; e (3) o cadastramento de agentes que vivenciam o território e que podem mapear ações comunitárias desenvolvidas localmente. Com isso, a plataforma oferece uma possibilidade de aproximação das políticas públicas em relação a seus territórios - considerando a centralidade da compreensão das condições de saúde locais e da participação para uma melhor adequação do serviço ao seu contexto específico.
Conclusões/Considerações finais A plataforma, ao se balizar pelos três sentidos da noção de territorialização (SANTOS e RIGOTTO, 2010), se mostra adequada para o uso por serviços locais ou que lidam diretamente com a população e sua burocracia do nível de rua (LIPSKI, 2019), como a atenção primária em saúde. Por isso, permite também avançar no planejamento espacializado de políticas públicas, e privilegiar a percepção e compreensão das dinâmicas e relações que se dão no local e que demonstram a diversidade existente nele (LOTTA, 2012). Ademais, o fato de se colocar como plataforma colaborativa permite a promoção da aprendizagem e participação social, combinando conhecimento espacial, técnico e social (CARVALHO e GIATTI, 2018). Por fim, as opções de tecnologias utilizadas, em um contexto em que a digitalização aparece como vetor da reprodução capitalista, não descuidam da economia política por trás de seu uso (ZANATTA, 2019).
Referências Bria, F.; Morozov, E. A cidade inteligente: tecnologias urbanas e democracia. São Paulo: Ubu Editora, 2019.
Carvalho, C. & Giatti, L., 2018. Participatory GIS for Urban Sustainability and Resilience: A Perspective of Social Learning and Ecology of Knowledge. Lifelong Learning and Education in Healthy and Sustainable Cities.
Lipsky, M. Burocracia do nível de rua: dilemas do indivíduo nos serviços públicos. Brasília: ENAP, 2019.
Lotta, G., 2012. Saberes locais, mediação e cidadania: o caso dos agentes comunitários de saúde. Saúde e sociedade, 21(1), pp. 210-222.
Rogers, Y. et al. Design de interação. Bookman Editora, 2013.
Santos, A.; Rigotto, R. Território e territorialização: incorporando as relações produção, trabalho, ambiente e saúde na atenção básica à saúde. Trab. educ. saúde, v.8, 2010.
Zanatta, R., 2019. Prefácio. Em: A cidade inteligente: tecnologias urbanas e democracia. São Paulo: Ubu Editora.
Fonte(s) de financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTI)
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