04/11/2024 - 13:30 - 15:00 RC10.1 - Reflexões, deslocamentos e novos diálogos em política, planejamento e gestão em saúde |
52212 - NARRATIVAS SOBRE O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA DE MORADORES DE UMA FAVELA DE BELO HORIZONTE: INSUMOS P/ REPENSAR AVALIAÇÕES DE INTERVENÇÕES E POLÍTICAS DE TRANSFORMAÇÃO URBANA LÍVIA CUSTÓDIO PUNTEL CAMPOS - UFMG, ELIS MINA SERAYA BORDE - UFMG, AMÉLIA AUGUSTA DE LIMA FRICHE - UFMG, WALESKA TEIXEIRA CAIAFFA - UFMG
Apresentação/Introdução Evidências científicas apontam que intervenções estruturais no ambiente físico urbano, incluindo intervenções de habitação, transporte e na requalificação de espaços públicos podem promover benefícios na saúde e bem estar dos moradores, embora, devido à natureza multicomponente e heterogênea das intervenções e dos estudos, haja limitações na qualidade das evidências (TURLEY et al., 2013; HENSON et al., 2020).
A maioria das avaliações dessas intervenções, no entanto, não abordam suas consequências não intencionais e possivelmente deletérias para a saúde, incluindo efeitos de remoções e transformações nas formas de vida. A compreensão dos efeitos das intervenções também está mediada pela compreensão da saúde e da doença de forma geral. Informações qualitativas, como a aproximação dos sentidos atribuídos ao processo saúde-doença e suas representações, são importantes para melhor compreensão dos impactos das intervenções e das experiências individuais e coletivas implicadas nas intervenções. Os moradores podem reconhecer dimensões de saúde e bem-estar diferentes daquelas que geralmente são abordadas nos estudos de avaliação das intervenções no campo da saúde urbana (CORBURN; SVERDLIK, 2017; COSTA; GUALDA, 2010; TURLEY et al., 2013).
Objetivos Compreender as percepções sobre o processo saúde-doença e bem-estar nas narrativas dos moradores de uma favela participante das intervenções de transformação urbana no marco do Programa PAC Vila Viva em Belo Horizonte.
Metodologia Trata-se de um estudo qualitativo, que realizou a análise de 37 entrevistas semiestruturadas com moradores do Aglomerado Morro das Pedras, em Belo Horizonte, entre os anos de 2017 e 2018. A análise foi realizada por meio da metodologia da Análise Temática Reflexiva (BRAUN; CLARKE, 2019) composta pelas seguintes etapas: Familiarização com os dados; Produção de códigos iniciais; Construção de temas; Revisão de temas iniciais; Definição e nomeação dos temas; Produção de relatório de resultados (BRAUN; CLARKE, 2019).
A pesquisa se vincula ao projeto “BH-Viva: A Saúde dos moradores em Zonas e Áreas Especiais De Interesse Social (ZEIS)”, um estudo multimétodo com componentes de delineamento quantitativos e qualitativos, executado pelo Observatório de Saúde Urbana de Belo Horizonte (OSUBH/UFMG), cujo objetivo é produzir evidências acerca dos impactos das intervenções de transformação urbana sobre a saúde e o bem-estar de moradores de ZEIS, no âmbito do Projeto Vila Viva, executado pela prefeitura de Belo Horizonte como parte do Plano de Aceleração do Crescimento do Governo Federal (FRICHE et al., 2015).
Resultados e Discussão As percepções sobre o processo saúde-doença e bem-estar, variaram entre os moradores entrevistados.
As narrativas sobre autopercepção de saúde foram marcadas por referências biomédicas na maior parte das entrevistas, predominando a concepção negativa de saúde, como ausência de doença. Em uma frequência menor, os entrevistados consideraram concepções mais amplas abarcando fatores psicossociais e estruturais.
Sobre os processos determinantes de saúde-doença e bem-estar, destacaram-se fatores relacionados à vizinhança como a relação entre vizinhos como protetora (vínculos afetivos, ausência de barulho ou conflitos) ou prejudicial (barulho excessivo, falta de limpeza do ambiente comum) à saúde e ao bem-estar. Outro tema foi o espaço da moradia, especialmente entre os moradores removidos para prédios com apartamentos, que reconheceram a remoção como um fator desencadeador de mal-estar e adoecimento, especialmente em função da perda de espaço e porque tiveram suas dinâmicas prejudicadas (criação de animais, plantas e lazer). Para aqueles provenientes de espaços menores ou muito precários, a sensação de segurança destacou-se como um fator de bem-estar. O lixo foi um tema de preocupação devido à percepção de potencial gerador de doenças. A indisponibilidade de espaços e atividades para crianças e jovens é percebida com preocupação entre os diversos moradores, denotando uma dimensão geradora de mal-estar. O tema da violência aparece como um fator de medo e mal-estar, embora seja referido como melhor que “antigamente”.
Conclusões/Considerações finais A percepção de saúde-doença e bem-estar é marcada por narrativas que incluem, mas não se restringem, à concepção biomédica da saúde e da doença, que marca as pesquisas sobre intervenções de transformação urbana.
A identificação dos sentidos sociais atribuídos, os processos não diretamente vinculados e as vivências individuais e coletivas implicadas no planejamento, na implementação e, às vezes também na falta de implementação de intervenções de transformação urbana, poderão contribuir para intervenções mais contextualizadas e sensíveis às necessidades das pessoas envolvidas. Essa abordagem poderá contribuir para intervenções não somente mais efetivas na produção de saúde e bem-estar, como menos prejudiciais.
Referências BRAUN, V.; CLARKE, V. Reflecting on reflexive thematic analysis. Qualitative Research in Sport, Exercise and Health, v. 11, n. 4, p. 589–597, 8 ago. 2019.
CORBURN, J.; SVERDLIK, A. Slum Upgrading and Health Equity. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 14, n. 4, p. 342, 24 mar. 2017.
COSTA, G. M. C.; GUALDA, D. M. R. Antropologia, etnografia e narrativa: caminhos que se cruzam na compreensão do processo saúde-doença. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 17, n. 4, p. 925–937, dez. 2010.
FRICHE, A. A. D. L. et al. Urban upgrading and its impact on health: a “quasi-experimental” mixed-methods study protocol for the BH-Viva Project. Cadernos de Saúde Pública, v. 31, n. suppl 1, p. 51–64, nov. 2015.
HENSON, R. M. et al. Evaluating the health effects of place-based slum upgrading physical environment interventions: A systematic review (2012–2018). Social Science & Medicine, v. 261, p. 113102, set. 2020.
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