Roda de Conversa

06/11/2024 - 08:30 - 10:00
RC6.4 - Gestão e Alocação de Recursos no SUS

52075 - JUDICIALIZAÇÃO DO ACESSO DE MEDICAMENTOS: UMA ANÁLISE DO PERFIL DAS DEMANDAS E OS IMPACTOS PARA O SISTEMA DE SAÚDE
LORENA MENEZES DE SOUSA CORDEIRO - UFBA, CAROL THAMIRES SANTOS FIGUEIREDO - FAINOR


Apresentação/Introdução
A judicialização da saúde pode ser compreendida como um fenômeno complexo, em que os usuários recorrem ao Poder Judiciário para a obtenção de medicamentos e outros bens e serviços de saúde. Diversos estudos apontam que a judicialização da saúde no Brasil representa um risco à continuidade das políticas públicas, causando impactos significativos na estruturação, financiamento e organização do sistema de saúde (1, 2).
No Brasil, o acesso aos medicamentos é parte do direito social, garantido por meio da Constituição Federal de 1988, que assegura em seu art. 196 que ‘’a saúde é direito de todos e dever do Estado’’. A garantia do acesso à saúde, embora assegurado constitucionalmente há mais de 30 anos, nem sempre é cumprido, e por isso cada vez mais os cidadãos recorrem ao Poder Judiciário para efetivação desse direito (2). De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça, o número de ações judiciais relacionadas à saúde aumentou 130%, entre 2008 e 2017 (3).
As discussões acerca da judicialização, apesar de estar em pauta há mais de duas décadas, ainda necessita de amadurecimento. Nesse contexto, o presente estudo poderá contribuir na análise do perfil das demandas judiciais em estados e municípios brasileiros, bem como avaliar os impactos da judicialização para o Sistema Único de Saúde.

Objetivos
Analisar o perfil das demandas judiciais em Estados e municípios brasileiros, bem como avaliar os possíveis impactos do uso da via judicial para o Sistema Único de Saúde.
Objetivos Específicos
• Analisar o perfil das demandas em diferentes contextos;
• Avaliar os possíveis impactos do uso da via judicial para o Sistema Único de Saúde (SUS).


Metodologia
Trata-se, portanto, de uma revisão exploratória de caráter bibliográfico e documental e de abordagem quantitativa. Para isso, o estudo foi estruturado nas seguintes etapas: a elaboração do problema, busca na literatura, definição das palavras-chave, estratégias de busca, critérios e inclusão e exclusão dos estudos, avaliação dos estudos, análise e interpretação dos resultados, e por fim as considerações finais acerca do tema abordado.
A busca dos estudos na literatura foi realizada entre os meses de abril a junho de 2021, nas seguintes bases de dados eletrônicos: LILACS, PubMed, SciELO, Biblioteca Virtual em Saúde- BVS, bases de dados da CAPES e Google Acadêmico. Foram definidas as seguintes palavras-chave: judicialização, Assistência Farmacêutica, medicamentos, ações judiciais, judicialization, Pharmaceutical Care, medicines, judicial actions. Os descritores foram combinados entre si, em estratégias de busca nas bases de dados citadas acima. Como critérios de inclusão, foram selecionados os estudos: escritos em português e/ou inglês, publicados entre 2010 e 2021. Por fim, após a análise e leitura do resumo, essa pesquisa foi composta de 42 estudos.

Resultados e Discussão
Dos 42 estudos selecionados, 17 foram excluídos por duplicidade. O universo da pesquisa contou com a análise de 25 estudos. A maioria dos pacientes que entraram com ações judiciais foram atendidos em sistemas privados de saúde e contrataram advogados privados. Isso sugere que os pacientes que recorrem a ações judiciais são socioeconomicamente mais dotados, pois podem arcar com custas judiciais e estão cientes de seus direitos. A judicialização da saúde pode aumentar as desigualdades de saúde dentro de um sistema já caracterizado por desigualdades socioeconômicas.
Dos 25 estudos em questão, seis encontraram um deferimento da liminar favorável ao paciente. Alguns estudos evidenciam uma característica comum nas demandas judiciais, em que os processos são aceitos, em sua grande maioria, por parte do juiz sem muitos questionamentos, respaldado na constituição que garante o direito a saúde (4). As liminares são concedidas na quase totalidade dos casos, sendo que uma parcela considerável das ações poderia ter sido evitada caso fossem observadas as alternativas terapêuticas do SUS.
A estimativa de gastos da Assistência Farmacêutica com a judicialização da saúde foi identificada em nove estudos. A estimativa entre os estudos variou entre R$ R$29.221,90 a R$ 213 milhões em gastos com a judicialização. Ainda que os resultados desses estudos não informem se as demandas judiciais estão comprometendo o orçamento do SUS, demonstram valores altos e mostram que nem sempre o alto custo se destinam a garantir o acesso a medicamentos de segurança e eficácia comprovadas (5).


Conclusões/Considerações finais
Os dados deste estudo permitem avaliar os principais desafios e obstáculos enfrentados pelo Sistema de Saúde na garantia do acesso aos medicamentos. O acesso aos medicamentos pela via judicial é uma forma legítima da garantia dos seus direitos. Entretanto, o que tem se observado é um processo de judicialização excessiva e alocação de recursos. Dessa forma, mesmo que a judicialização aponte possíveis falhas da gestão e do sistema, ela acaba se mostrando como um estímulo ao uso de medicamentos e como uma barreira para a consolidação da Política Nacional de Medicamentos e promoção do uso racional de medicamentos.
É possível afirmar ainda, que a judicialização da saúde tem um perfil desconhecido, o que dificulta o planejamento entre as diversas instâncias. Apesar da sua importância na atualidade, não se tem precisão sobre a real proporção, bem como os custos e possíveis impactos da judicialização para o sistema de saúde.

Referências
1. BARBOSA, PB; ALVES, SCM. The judicialization of medications in the state of Bahia, Brazil: the numbers from 2014 to 2017. Cad. Ibero-amer. Dir. Sanit., Brasília, 8(4): out./dez., 2019.
2. RAMOS, RS. Access the Unified Health System actions and services from the perspective of judicialization. Rev. Latino-Am. Enfermagem 2016; 24:e2797.
3. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, CNJ. Judicialização da Saúde no Brasil: perfil das demandas, causas e propostas de solução. Instituto de Ensino e Pesquisa- INSPER. Brasília, 2019.
4. PEPE, VLE et. al. Characterization of lawsuits for the supply of “essential” medicines in the State of Rio de Janeiro, Brazil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 26(3):461- 471, mar, 2010a.
5. CATANHEIDE, ID. et. al. Características da judicialização do acesso a medicamentos no Brasil: uma revisão sistemática. Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 26 [4]: 1335-1356, 2016.

Fonte(s) de financiamento: Não se aplica.


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