48612 - ALOCAÇÃO DE RECURSOS FEDERAIS POR EMENDAS PARLAMENTARES PARA FINANCIAMENTO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA E ESPECIALIZADA NO SUS FABIOLA SULPINO VIEIRA - INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA
Apresentação/Introdução A alocação de recursos federais por emendas parlamentares (EP) para financiamento das ações e serviços públicos de saúde (ASPS) vem crescendo desde 2014 até 2023. Esse período é caracterizado pela introdução do orçamento impositivo, que tornou obrigatória a execução das EP individuais, inicialmente por força das leis de diretrizes orçamentárias (LDO) de 2014 e 2015, e depois pela Emenda Constitucional (EC) nº 86, de 2015, a partir de 2016. Houve também ampliação dessa obrigatoriedade para as EP de bancada estadual incluídas no anexo das prioridades e metas das LDO de 2016 a 2019 e, a partir de 2020, para todas as EP de bancada por meio da EC 100, de 2019 (Piola e Vieira, 2019; Vieira, 2022). Paralelamente, esteve vigente de 2017 até meados de 2023 a EC 95, que impôs o congelamento, em termos reais, da aplicação mínima federal em ASPS. Nesse contexto, o Ministério da Saúde (MS) passou a autorizar o incremento dos repasses para a atenção primária à saúde (APS) e a atenção especializada à saúde (AES) por meio de EP. Com isso as EP assumiram maior participação no custeio dessas importantes áreas de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS) e surgem duas perguntas: 1) qual foi a participação das EP no financiamento federal da APS e da AES no período de 2014 a 2023?; e 2) quais as possíveis implicações dessa alocação de recursos por EP para o financiamento do SUS nesse período?
Objetivos Investigar a participação das despesas por emendas parlamentares no gasto total do Ministério da Saúde em APS e AES no período de 2014 a 2023.
Metodologia Realizou-se uma análise da execução orçamentária federal em ASPS no período de 2014 a 2023. Os dados foram obtidos do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (SIOP), a partir da consulta livre no Painel do Orçamento Federal. As despesas em ASPS e as despesas por EP foram identificadas conforme métodos propostos por Piola e Vieira (2024). Os gastos em APS e AES foram identificados a partir de subfunções. Para o período 2014-2018, não é possível separar completamente os gastos por EP nessas áreas porque parte das despesas foram registradas na subfunção 122 – administração geral (Vieira, 2022). Por essa razão, considerou-se a soma dessas despesas nesses anos, examinando-se o gasto global com as duas áreas. Em 2020 e 2021, as despesas registradas na subfunção 122 financiaram ações e serviços na AES para enfrentamento da Covid-19 e foram identificadas pelos programas. A participação da despesa por EP no total da despesa em APS e AES foi calculada. A fim de analisar a evolução dos gastos, os valores foram corrigidos para preços médios de 2023, utilizando-se a variação média anual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo.
Resultados e Discussão Os gastos do MS em ASPS passaram de R$ 154,8 bilhões em 2014 para R$ R$ 179,8 bilhões em 2023. No mesmo período, as despesas por EP aumentaram 371%, de R$ 4,9 bilhões para R$ 23,0 bilhões. A participação da soma das despesas em APS e AES por emendas em relação ao gasto total do MS nessas áreas variou de 4% em 2014 para 18% em 2023. A partir de 2019, quando é possível desagregar os gastos nessas áreas, em comparação a 2023, observa-se aumento de 22% da participação das EP nos gastos em APS (de R$ 7,7 bilhões para R$ 9,4 bilhões) e de 68% da participação das EP nos gastos em AES (de R$ 8,0 bilhões para R$ 13,4 bilhões). Somadas, entre 2019 e 2023, as despesas por EP cresceram 46% (de R$ 15,7 bilhões para R$ 22,8 bilhões). Nos anos de 2020 e 2023, os gastos em AES por EP suplantaram as despesas em APS por EP. Em 2020, a pandemia da Covid-19 demandou maior alocação de recursos para a AES e, em 2023, a Portaria MS nº 544, que regulamentou a alocação de recursos de emendas de relator, contribuiu para maior destinação de recursos à AES. A prioridade de aprovação das EP na APS foi dada para investimentos em equipamentos, unidades móveis odontológicas, computadores e reforma de unidades. Também foram priorizados recursos de custeio para financiamento de centros de especialidades odontológicas e de equipes multiprofissionais, de saúde da família e de saúde bucal. Propostas de estruturação, seja da APS ou da AES, demandam dos municípios e estados beneficiados a apresentação de projetos mais estruturados. No caso do financiamento das equipes da APS, as mudanças recentes na sua composição, induzidas pelo Previne Brasil (Mendonça et al, 2023), podem ter dificultado a apresentação de propostas para essa finalidade e direcionado as solicitações para a AES em 2023.
Conclusões/Considerações finais A ampliação da alocação de recursos federais por EP, contabilizados no piso de ASPS, é preocupante, dado que o critério político, ainda que legítimo, acrescenta mais uma camada de complexidade ao financiamento insuficiente do SUS. No rateio dos recursos federais aos entes da Federação para a APS e a AES, critérios estabelecidos em leis, como as necessidades de saúde da população, são fundamentais. Contudo, municípios de menor porte populacional e a área de APS vinham sendo priorizados com grande volume de recursos sem a adoção desses critérios (Baião et al, 2019). Embora a APS desempenhe um importante papel no SUS, um dos maiores gargalos do sistema encontra-se na AES. O rateio dos recursos federais precisa considerar a forma de organização do SUS e corrigir desigualdades de capacidade local de financiamento. Destinações de recursos que não consideram os vazios assistenciais e as necessidades de saúde da população tendem a desorganizar o SUS e a ser menos efetivas e eficientes.
Referências BAIÃO, A. L.; et al. Quem ganha o quê, quando e como? Emendas orçamentárias em Saúde no Brasil. Revista de Sociologia e Política, v. 27, n. 71, p. e004, 2019.
MENDONÇA, F. D. F. et al. As mudanças na política de atenção primária e a (in)sustentabilidade da Estratégia Saúde da Família. Saúde em Debate, v. 47, n. 137, p. 13–30, 2023.
PIOLA, S. F; VIEIRA, F. S. As emendas parlamentares e a alocação de recursos federais no Sistema Único de Saúde. Brasília: Ipea, 2019 (Texto para Discussão, n. 2497).
PIOLA, S. F.; VIEIRA, F. S. Financiamento das ações e serviços públicos de saúde no Brasil: um retrato das desigualdades regionais do período de 2010 a 2022. Brasília: Ipea, 2024. (Texto para Discussão).
VIEIRA, F. S. Emendas parlamentares ao orçamento federal do SUS: método para estimação dos repasses a cada município favorecido, segundo áreas de alocação dos recursos (2015-2020). Brasília: Ipea, 2022. (Texto para Discussão n. 2732).
Fonte(s) de financiamento: Não houve.
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