Roda de Conversa

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC6.3 - Por uma economia da saúde que persiga a redução das iniquidades

52868 - RICOS X POBRES: ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS GASTOS EM SAÚDE NOS MUNICÍPIOS CEARENSES
KILVIA HELANE CARDOSO MESQUITA - UFC, LUIZ ODORICO MONTEIRO DE ANDRADE - FIOCRUZ CEARÁ


Apresentação/Introdução
A insuficiência de recursos e a irregularidade nos fluxos financeiros sempre estiveram presentes no sistema público de saúde brasileiro, mesmo antes da criação do SUS (SERVO et al., 2011). Vários fatores podem explicar o subfinanciamento na perspectiva do federalismo fiscal: renúncias fiscais de contribuições sociais (VIEIRA, 2016); renúncias à iniciativa privada de planos de saúde (OCKÉ-REIS, 2018); despesas crescentes com juros da dívida (ANFIP, 2014), desvinculação de Receitas da União (EC 87/2015), orçamento impositivo (EC 86/2015), austeridade fiscal da EC 95/2016 (SCHARAMM et al., 2018), judicialização da saúde (VIEIRA (2013); TCU (2017)) entre outros. Assim, os recursos que deveriam ser aplicados em ações e serviços públicos de saúde vão sufocando o orçamento limitado dos gestores municipais para manter a porta de entrada do SUS, que é a atenção básica. Recentes mudanças na legislação sobre o financiamento da saúde reforçam que a gestão eficiente dos recursos na Atenção Primária (APS) passa a ser estratégica para garantir ao acesso da população à saúde. O aprendizado pode vir da experiência recente ao comparar no tempo a performance orçamentária de municípios ricos e populosos com os de maior vulnerabilidade dentro de um mesmo estado antes, durante e após a Covid-19, neste estudo o Ceará.


Objetivos
Geral
• Analisar a evolução do financiamento e dos gastos com saúde nos maiores e menores municípios cearenses frente às políticas de financiamento e equidade na distribuição dos recursos de 2018 a 2022.
Específicos
• Identificar e comparar a composição do financiamento e gasto municipal com saúde na APS nos maiores e menores municípios do Ceará e
• Compreender o impacto econômico da pandemia de Covid-19 nos gastos municipais com saúde.

Metodologia
O estudo caracteriza-se por ser quantitativo, descritivo e ecológico, utilizando dados secundários de domínio público. O banco de dados construído e analisado condensa informações dos cinco maiores e menores municípios do Ceará segundo população estimada e PIB. São dados da execução orçamentária dos municípios de 2018 a 2022. Foram identificados e analisados os gastos empenhados ao final de cada exercício financeiro. Considera-se gastos com saúde todas as despesas que se enquadram na definição do que são ações e serviços públicos de saúde, conforme Lei Complementar 141/2012. Os valores monetários foram atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tendo por ano-base 2020. Fontes de informação sobre financiamento e gastos: Tribunal de Contas do Estado (TCE), Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), Associação dos Municípios e Prefeitos do Estado do Ceará (APRECE), e-Gestor Informação e Gestão da Atenção Básica (e-Gestor), Fundo Nacional de Saúde (FNS) e IBGE. Para tabulação dos dados e análise estatística foram utilizados os softwares Excel 365 e SPSS 20 respectivamente.

Resultados e Discussão
A análise foi realizada por porte municipal. Entre os maiores municípios, no que tange à população e PIB, foram analisados Fortaleza, Caucaia, Juazeiro do Norte, Maracanaú e Sobral. Como na seleção dos menores municípios, a partir de IPECE (2022), não houve convergência entre os menos populosos com menor PIB, a escolha foi pelos municípios de menor PIB, pois menor produção de riqueza pode estar relacionada à vulnerabilidade da população e, consequentemente, maior dependência do SUS. Os selecionados foram Umari, Baixio, Senador Sá, Ererê e Granjeiro. A pandemia de Covid-19 e a implementação do Programa Previne Brasil (PPB) afetaram diretamente a estrutura financeira dos municípios no setor de saúde a partir de 2020. Enquanto a pandemia elevava as despesas por conta da demanda da população, o novo sistema de financiamento poderia reduzir as receitas com saúde. Para tentar equalizar a conta, até outubro de 2020, foram publicadas 11 medidas provisórias com destinação de recursos para o MS totalizando R$ 44,1 bilhões, sendo R$ 38,3 bilhões de recursos novos; desse valor, R$ 22,8 bilhões são financiados por operações de crédito internas. A ação orçamentária 21C0, criada para execução dos recursos para enfrentamento da Covid-19, representou 99,1% do total alocado pelo MS para a pandemia (SERVO et al, 2020). Os municípios cearenses mais pobres não possuíam recursos físicos nem financeiros suficientes para atender sua demanda na saúde e buscavam apoio na rede regional colapsada pela pandemia. Todos os municípios estudados apresentaram desequilíbrio orçamentário no período de análise, o que foi agravado pela Covid-19. Mesmo Sobral conseguindo destaque nos indicadores do PPB em 2021 e 2022 essa não era a realidade dos demais municípios analisados independente do porte.

Conclusões/Considerações finais
Nos últimos anos o Brasil vem apresentando um cenário de ‘des’financiamento da saúde que poderá colocar em xeque seu sistema universal e, especialmente, sua APS. O trabalho hercúleo dos 184 municípios cearenses para equacionar as contas e fornecer acesso à saúde sofreu dois grandes golpes em 2020. Cidades ricas e pobres enfrentaram o mesmo desafio histórico, desequilíbrio orçamentário, agravado pelo desaquecimento econômico e aumento de gastos. A implantação do PPB ocorreu concomitantemente à chegada da Covid-19 no país. Com isso, o pagamento por desempenho proposto, ao não consolidar resultados reais da saúde devido a pandemia, pode ter gerado o atraso no avanço da APS nos municípios. Entender o impacto desses dois vetores simultâneos nos gastos em saúde e sua repercussão social em momento de crise no financiamento é fundamental e contribui para o debate da gestão municipal em saúde. Estudos com foco na desigualdade entre os municípios brasileiros são tidos como oportunos para o SUS.

Referências
IPECE(2022). https://www.ipece.ce.gov.br/painel-de-indicadores-sociais-e-economicos-os-10-maiores-e-os-10-menores-municipios-cearenses/
OCKÉ-REIS, C.O. SUS: o desafio de ser único. Rio de Janeiro, Ed. Fiocruz, 2012.
SCHARAMM, PAES-SOUSA, MENDES. Políticas de Austeridade e seus impactos na saúde. Textos para Debate. 2018.
SERVO, PIOLA, PAIVA, RIBEIRO. Financiamento e Gasto Público de saúde: Histórico e Tendências. Políticas Públicas e financiamento federal do SUS. Orgs: MELAMED, PIOLA. Brasília: Ipea, 2011.
SERVO, SANTOS, VIEIRA, BENEVIDES. Financiamento do SUS e Covid-19: histórico, participações federativas e respostas à pandemia. Saúde Debate. Rio de Janeiro: n.44, Esp 4, 2020.
TCU(2017). https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/aumentam-os-gastos-publicos-com-judicializacao-da-saude.htm
VIEIRA, F.S. Implicações de decisões e discussões recentes para o financiamento do SUS. Saúde e Debate, Rio de Janeiro, v.40. n. 109-199, 2/2016.


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