Roda de Conversa

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC6.3 - Por uma economia da saúde que persiga a redução das iniquidades

51987 - RELAÇÕES PÚBLICO-PRIVADAS NA SAÚDE NO ESTADO DEPENDENTE NEOLIBERAL: TENDÊNCIAS E IMPASSES DA PRIVATIZAÇÃO DO SUS.
CLÁUDIA REGINA DE ANDRADE PEREIRA - FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ


Apresentação/Introdução
O presente estudo, de natureza teórica, parte da evidência de que o setor saúde é um importante componente da política social, no que tange à magnitude do que mobiliza de recursos diversos e ao que move de disputa de interesses pelo fundo público em processos de acumulação de capital no setor. Deste modo, analisamos esse processo na perspectiva de uma crítica da economia política, que se traduz em uma economia política da saúde. Ademais, enfatizamos o entendimento de que a análise das relações público-privadas na saúde se insere na análise mais ampla do desenvolvimento capitalista na formação econômico-social brasileira, e das particularidades de um sistema híbrido de saúde em um Estado dependente, onde a categoria Estado possui centralidade explicativa. Para isso, trabalhamos articuladamente com as categorias Estado, dependência, neoliberalismo e relações público-privadas para debate crítico acerca de processos de privatização no interior do Sistema Único de Saúde (SUS), considerados não clássicos, e que envolvem processos de mercantilização da gestão de serviços públicos de saúde. Com isso ressaltamos o entendimento de que é através das ferramentas da economia política da saúde e da análise da “dependência neoliberal” que podemos estruturar a crítica marxista no campo da Saúde Coletiva, bem como a luta pela desprivatização do SUS.

Objetivos
Este estudo teve como objetivos: 1) Analisar a privatização da saúde pública no Brasil em diálogo com o resgate de elementos da Teoria Marxista da Dependência (TMD) e da Economia Política da Saúde (EPS); 2) Debater tendências e impasses de processos não clássicos de privatização do SUS que envolvem a gestão de serviços públicos de saúde.

Metodologia
Para discussão mais aprofundada dos determinantes da dependência e de sua processualidade histórica, nos alinhamos à Teoria Marxista da Dependência (TMD) para o desvelamento das particularidades do Estado brasileiro e de como vem se dando a reprodução ampliada do capital no setor saúde, particularmente na “dependência neoliberal”. Também buscamos minimizar os traços de polissemia da categoria neoliberalismo, com explícita adesão teórica à interpretação marxista acerca desta categoria, no sentido mesmo em que defendemos a hipótese de que o neoliberalismo não representa uma mera reedição do liberalismo clássico, tem poder explicativo para entendimento do modo de existência na contemporaneidade e para análise da refuncionalização do Estado diante desse projeto. Por fim, debatemos processos de privatização do SUS com base em revisão bibliográfica de artigos e teses no âmbito da economia política da saúde que foram resultado de investigações sobre a evidente ampliação de processos de privatização. Para isto, demos foco ao debate sobre a terceirização da gestão de serviços públicos de saúde por nós entendida como uma “privatização não clássica”, no entanto, não menos consequente.

Resultados e Discussão
Quando tratamos de capitalismo dependente em sua vertente neoliberal não nos referimos, de modo algum, a outro modo de produção, dado que este é movido pela lei geral da acumulação capitalista. No entanto, há essencialidades que configuram um desenvolvimento capitalista com determinações específicas nos países periféricos na divisão internacional do trabalho. Nessa perspectiva é que resgatamos elementos da TMD para análise da política social no Brasil, com ênfase na análise de processos de acumulação de capital no setor saúde, no que tange a tendências contemporâneas impostas pelo projeto neoliberal, o qual envolve as dimensões política, econômica, social, ambiental e ética, configurando, portanto, “um modo de existência do capitalismo contemporâneo” (Saad-Filho, 2011). Esse projeto tensiona permanentemente o Estado, buscando refuncionalizá-lo em prol do fortalecimento do setor privado de serviços de saúde por intermédio do desfinanciamento do SUS na provisão de serviços próprios. Aqui se trata de um projeto que transforma a concepção de público-privado e impõe um determinado modo de reprodução social, em um universo de novos processos de individualização, privatização e de completa aversão à redistribuição da riqueza por intermédio de políticas sociais universalizantes, como o SUS, particularmente dos anos 1990 em diante no caso brasileiro. Falamos, portanto, de um projeto hegemônico, em escala mundial, mas que atinge de forma específica os países periféricos. No caso brasileiro, há estudos que evidenciaram a ampliação da privatização da saúde pública, a exemplo de Santos (2018) e Vaccaro & Gomes (2022); que debateram teoricamente, com base empírica, o processo de terceirização da gestão de serviços públicos de saúde.

Conclusões/Considerações finais
O processo de constituição do SUS foi contraditório e buscamos analisá-lo à luz das condicionalidades impostas pela “dependência neoliberal” e de tendências contemporâneas. O Estado, por nós entendido como garantidor da reprodução do capital, fornece as bases para financeirização da política social. A nosso ver, urge que se ampliem estudos no campo da Saúde Coletiva que analisem criticamente a ampliação da mercantilização, privatização e financeirização no trato da questão social, onde se configurou um sistema híbrido e fragmentado na saúde. Há processos de privatização “por dentro”, através da contratação de organizações sociais e fundações para gestão de serviços públicos. Afirmamos, ademais, a tese de que a crise da saúde pública no Brasil se atrela à crise capitalista e o resgate da TMD pode fornecer importantes aportes ao desenvolvimento de políticas antineoliberais, bem como ao debate crítico do CEIS, também composto pelo setor de serviços de saúde.

Referências
BAHIA, L. et al. Financeirização do setor saúde no Brasil: desafios teóricos e metodológicos à investigação de empresas e grupos empresariais. In: Cadernos de Saúde Pública, 2022; 38 Sup 2:e00004420, p.1-13.
MARINI, R. M. Dialética da dependência, 1973. Acessível em: Dialética da Dependência (marxists.org).
SAAD-FILHO, A. Crise no neoliberalismo ou crise do neoliberalismo? In: Crítica e Sociedade: revista de cultura política. V.1, n.3, Ed. Especial - Dossiê: A crise atual do capitalismo, dez, 2011, p.6-19.
SANTOS, J. A. A ampliação do processo de privatização da saúde pública no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2022.
SESTELO, J. A. F. et al. A financeirização das políticas sociais e de saúde no Brasil do século XXI: elementos para uma aproximação conceitual. Campinas: Economia e Sociedade, v. 26, No Esp., p.1097-1126, dez. 2017.

Fonte(s) de financiamento: Fundação Oswaldo Cruz


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