Roda de Conversa

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC6.3 - Por uma economia da saúde que persiga a redução das iniquidades

48726 - EM BUSCA DE UM MODELO ASSISTENCIAL MENOS DESIGUAL NA SAÚDE SUPLEMENTAR
WILSON MARQUES VIEIRA JUNIOR - ANS


Apresentação/Introdução
O Brasil conta com um sistema de saúde público e universal. Entretanto, o sistema de saúde do país foi estruturado com forte participação de empresas privadas. Os planos de saúde são responsáveis pela cobertura assistencial de cerca de 25% da população.
As operadoras de saúde adotaram mecanismos moderadores da utilização que limitam o acesso aos procedimentos. Assim, a assistência é produzida por atos desconexos, não articulados. As operadoras de planos de saúde atuam, não com o cuidado em saúde, mas com a ideia de “evento versus sinistralidade”(MALTA et al., 2004).
Na assistência de saúde privada a lucratividade é o objetivo a ser alcançado pelas empresas, produzindo um ponto de tensão na relação usuário versus plano de saúde. As reclamações recebidas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) refletem esse tensionamento e a insatisfação dos usuários.
Nesse sentido, o trabalho analisa características estruturais das operadoras com a finalidade de explorar possíveis relações que estejam relacionadas à insatisfação dos usuários.
Quais seriam as principais características de um plano de saúde, relacionadas com o grau de insatisfação de seus beneficiários ? A forma como os planos de saúde se organizam faz com que a maximização dos lucros seja o comportamento esperado. E nessa busca por lucratividade certos grupos podem ser mais afetados que outros.


Objetivos
Quais seriam as principais características de um plano de saúde, relacionadas com o grau de insatisfação de seus beneficiários ?
O trabalho analisa características estruturais das operadoras com a finalidade de explorar possíveis relações que expliquem a maior, ou menor, insatisfação dos respectivos usuários.
O objetivo geral do trabalho é verificar que aspectos dos planos de saúde geram mais insatisfação dos usuários e, consequentemente, mais reclamações registradas na ANS.


Metodologia
O banco de dados foi construído com a extração de informações do Painel do Índice Geral de Reclamações, do Painel de Precificação e da Sala de Situação, todos da ANS.
O Índice Geral de Reclamações, o IGR, estabelece um valor proporcional de acordo com o tamanho do grupo de beneficiários da operadora de saúde. O Painel de Precificação apresenta os valores médios de planos de saúde comercializados. A Sala de Situação é um banco de dados composto por diversas informações do setor de saúde suplementar e de cada operadora de saúde.
Foi estabelecido um recorte entre do período de janeiro de 2022 até outubro de 2023 para a média dos valores de IGR, número de reclamações e de beneficiários do banco de dados.
Optou-se por selecionar para o estudo o grupo de operadoras de médio porte, de 20.000 a 99.999 beneficiários por tratar-se de um grupo circunscrito mais homogêneo.
Do grupo inicial de 225 operadoras, foram excluídas 13, em razão da incompletude dos dados, totalizando um grupo de análise de 212 operadoras de saúde de médio porte.
Para a análise estatística dos dados, foi utilizado o SPSS (Statistical Package for the Social Science).


Resultados e Discussão
Para o teste de qui-quadrado, a variável modalidade de operadora apresentou associação com a variável de valor médio de IGR.
Para as variáveis de Valor Comercial de Médio, percentual de idosos na operadora e percentual de beneficiários em planos coletivos na operadora, os resultados não indicaram correlação com o valor de IGR.
Para a regressão entre a relação da variável IGR com as variáveis de VCM, proporção de idosos, modalidade de operadora e proporção de planos coletivos, ao considerar todas as variáveis, a única correlação que se confirma é aquela entre a modalidade da operadora e o valor médio de IGR.
Os beneficiários das operadoras com fins lucrativos são aqueles que mais reclamam, sobretudo os vinculados às operadoras de medicina de grupo. Tal resultado faz todo sentido quando se conhece as especificidades de gestão de cada modalidade. As operadoras de medicina de grupo são os clássicos planos de saúde com controle da utilização, rede credenciada contratada que tem incentivos financeiros para realizar mais procedimentos, o que provoca a reação de cerceamento das operadoras.
As operadoras de autogestão e de filantropia são consideradas entidades sem fins lucrativos, possivelmente buscando adequar a disponibilização dos serviços de saúde conforme as necessidades do grupo assistido. Além disso, nas autogestões há uma relação direta entre usuário, operadora e gerência de recursos humanos ou de assistência social na respectiva empresa, com maior preocupação com a assistência dos empregados.
Esse achado corrobora a conclusão do estudo de Malta e Jorge (2008) quanto ao modelo assistencial de uma operadora de autogestão, que apresentou objetivos distintos da lógica do mercado, não visando ao lucro nas operações, estabelecendo maior vínculo com o usuário.


Conclusões/Considerações finais
O estudo trouxe achados importantes para o debate sobre a atuação dos planos de saúde na assistência à saúde.
Como exposto por Vieira e Martins (2015), ao contrário do SUS, com seus princípios de igualdade e de equidade, “o modelo vigente de comercialização da assistência à saúde por parte das operadoras caminha em outra direção, na qual o cuidado à saúde é pautado, sobretudo, por aspectos financeiros. Com isso, torna-se difícil compatibilizar direito à saúde e cuidado em saúde como atividade econômica de caráter privado”.
A confirmação de que a estrutura e o modelo de gestão assistencial da operadora estão relacionados com os conflitos na relação com os usuários aponta para a necessidade de aprimoramento da regulação para que a gestão da operadora esteja coordenada de tal forma que a assistência à saúde contratada seja ofertada e disponibilizada aos usuários, nos prazos regulamentados, de acordo com suas necessidades.


Referências
Malta DC, Cecilio LCO, Merhy EE, Franco TB, Jorge AO, Costa MA. Perspectivas da regulação na saúde suplementar diante dos modelos assistenciais. Ciênc. saúde coletiva. 2004; 7(1):61- 66.
Malta DC, Jorge, AO. Modelos assistenciais na saúde suplementar: o caso de uma operadora de autogestão. Ciênc. saúde coletiva. 2008; 13 (5): 1535-1542.
Vieira Junior WM, Martins M. Idosos e planos de saúde no Brasil: análise das reclamações recebidas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Ciênc. Saúde Colet. 2015;20(2):3817-26.

Fonte(s) de financiamento: Nenhuma


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