53044 - "O QUE VOCÊS PODEM FAZER POR NÓS?" — EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA DE EDUCAÇÃO POPULAR EM SAÚDE EM UMA OCUPAÇÃO URBANA DE BELO HORIZONTE LEONARDO FERNANDES RUIZ DIAZ - UFMG, GABRIEL LUCAS BAESSA DIAS - UFMG, ÍCARO PEIXOTO ARAÚJO - UFMG, LÍVIA DE FREITAS MOURA - UFMG, ELIS MINA SERAYA BORDE - UFMG
Contextualização A Pedreira Prado Lopes (PPL), considerada a favela mais antiga de Belo Horizonte, representou, no contexto do planejamento urbanístico da cidade, uma região habitada por trabalhadores vindos do interior do estado em busca de melhores condições de vida. Durante a construção da capital, a marginalização dos grupos economicamente desfavorecidos já era evidente: a pedreira de onde se retiravam as pedras para construir a cidade tornou-se moradia para pessoas que não teriam pleno acesso a ela. Em sua obra, Milton Santos (SANTOS, 1987) destaca que, com o avanço das políticas neoliberais, as cidades passam a ser um limitante para vários indivíduos, uma vez que o cidadão passa a ser visto como um consumidor. Nesse contexto, as ocupações urbanas emergem como movimentos políticos que reivindicam não somente o direito à moradia garantido constitucionalmente, mas o direito à cidade. O programa da Liga de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Minas Gerais (LiASC-UFMG), de natureza multiprofissional, inclui o projeto de extensão anexo “Educação Popular em Saúde nas Ocupações Urbanas da Região Metropolitana de Belo Horizonte”. Por meio da extensão, a liga subverte o modelo biomédico de saúde ao fomentar uma perspectiva ampliada sobre a determinação social dos processos saúde-doença. Em 2023, as ações extensionistas se desenvolveram na Ocupação Pátria Livre, localizada na PPL.
Descrição da Experiência Os encontros realizados envolveram reuniões internas de planejamento, participação nas atividades da agenda da Ocupação Pátria Livre e a realização de dinâmicas de educação popular em saúde. Com apoio das lideranças locais, os extensionistas realizaram visitas à ocupação e, a partir de um material elaborado previamente, geraram reflexões coletivas sobre os processos protetores e processos destrutivos da saúde no cotidiano dos moradores da ocupação. Nesse contexto, os integrantes estruturaram diários de campo que fundamentaram as atividades subsequentes. Alinhadas à perspectiva freiriana, as ações extensionistas assumiram uma posição dialógica com os moradores da ocupação, que apresentaram diversas necessidades em saúde, incluindo a necessidade de uma articulação maior com os centros de saúde da região e o desenvolvimento de ações para públicos específicos dos moradores. Neste contexto, se viu a possibilidade de integração em um evento direcionado ao público feminino que já acontece mensalmente no galpão anexo da ocupação. A proposta foi aceita pelas organizadoras do evento e, assim, foram realizados dois encontros: o primeiro tratou a respeito da qualidade de vida e o segundo abordou a prevenção do câncer de mama. As ações incluíram rodas de conversa, com a utilização de recursos pedagógicos, e práticas coletivas de exercícios físicos.
Objetivo e período de Realização O projeto visa acompanhar moradores de ocupações urbanas, identificando as necessidades em saúde destes, bem como desenvolver atividades de educação popular em saúde. Entre o mês de agosto e dezembro de 2023, foram realizados dez encontros entre a LiASC e a Ocupação Pátria Livre. Os encontros se distribuíram entre atividades propostas por movimentos vinculados à ocupação, ações voltadas à saúde da mulher e à prática de atividades físicas e gravações para um documentário.
Resultados Durante as primeiras visitas à ocupação, os extensionistas foram confrontados com demandas recorrentes: “vocês podem nos atender?”; “o que vocês podem fazer por nós?”. Essas indagações serviram como convite para que fosse delineado com os interlocutores quais eram os propósitos da extensão, expondo também os limites do que poderia ser feito. Junto disso, foi instaurada uma inquietação ética a respeito das possibilidades do reconhecimento do sofrimento de pessoas em vulnerabilidade social e quais recursos estariam disponíveis para fortalecer espaços que os potencializam como sujeitos ativos e autônomos. Após reuniões com o movimento social atuante na ocupação e visitas realizadas, identificaram-se como questões mais recorrentes a saúde da mulher e a saúde mental. Esse cenário levou o projeto a articular-se com o grupo de Encontro das Mulheres, conduzindo dinâmicas participativas de educação popular em saúde, bem recebidas pelo grupo. Destaca-se também a criação de um documentário sobre a Ocupação Pátria Livre, colocando em evidência sua história e suas lutas. O roteiro e gravação do documentário aconteceu com a participação ativa dos moradores e seu lançamento aconteceu em 2024.
Aprendizado e Análise Crítica Diante da pluralidade de vozes e interesses, optou-se por uma escuta mais sensível aos temas que se repetiam como empecilhos no processo de produção de saúde: a estigmatização dos moradores diante à vizinhança e aos serviços de saúde, o sonho da casa própria, o medo do despejo, as tensões entre os moradores da ocupação e as questões relativas à falta de condições de trabalho e moradia dignas e com garantia de direitos. Nas aproximações, foi percebido que essas queixas —- que indicam o não usufruto de cidadania e formas de iniquidades em saúde —- se faziam presentes diluídas na vida ordinária das pessoas, na relação que elas mantêm com o território circundante, se explicitando nas conversas corriqueiras entre cada família, nas formas de sofrimento que se apresentavam, na agenda política da ocupação e nos planos pessoais que cada um alimentava para o futuro. Para além da compreensão dos processos saúde-doença como fenômenos atravessados pelos processos de determinação social, os discentes atuantes no projeto de extensão foram estimulados, por meio da aproximação com a Ocupação Pátria Livre, a desenvolver um olhar crítico a respeito das disparidades encontradas na saúde pública do território em que habitam. Por meio da educação popular em saúde, base estruturante do projeto, foi fomentada uma prática baseada não no repasse de conhecimento, mas na construção horizontalizada deste.
Referências SANTOS, Milton. O Espaço do Cidadão. São Paulo; Nobel, 1987. Sociedade e Estado, [S. l.], v. 4, n. 01, p. 161–166, 2022. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/sociedade/article/view/41856. Acesso em: 10 jun. 2024.
Fonte(s) de financiamento: Edital 05/2023 de produtos extensionistas da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal de Minas Gerais (PROEX-UFMG).
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