50884 - EXPLORANDO A RELEVÂNCIA CULTURAL EM DOCUMENTOS LEGAIS DE ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO: ANÁLISE DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL BRUNA QUEIROZ ALLEN PALACIO - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ, HELENA ALVES DE CARVALHO SAMPAIO - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ, FABIANA ALMEIDA BRITO - UNIVERSITY OF NEBRASKA MEDICAL CENTER, ANAEL QUEIRÓS SILVA BARROS - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ, FRANCISCO VALDICÉLIO FERREIRA - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ, LUIZA DE CARVALHO ALMEIDA - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
Apresentação/Introdução O Brasil, desde sua colonização em 1500, desenvolveu um multiculturalismo resultante da fusão de culturas nativas, europeias e africanas (Souza et al., 2021). Essa diversidade cultural se manifesta de maneira significativa nos hábitos alimentares, que são profundamente influenciados por preferências culinárias e tradições (Verthein; Amparo-Santos, 2021).
A Educação Alimentar e Nutricional se destaca como uma estratégia fundamental para a promoção de práticas alimentares saudáveis alinhadas às crenças do público-alvo (Verthein; Amparo-Santos, 2021). No entanto, a falta de preparação dos profissionais de saúde para atuarem de maneira culturalmente adequada é uma barreira significativa, com muitos ainda presos a um modelo biomédico que desconsidera o contexto cultural dos pacientes (Manso; Concone, 2021).
Os documentos legais, como portarias e leis, são essenciais na formulação e implementação de políticas públicas de saúde no Brasil (Domingos et al., 2016). Contudo, para que essas políticas sejam verdadeiramente eficazes, é crucial que integrem tanto a participação ativa da comunidade quanto a capacitação dos profissionais de saúde para lidar com as especificidades culturais do público-alvo (André et al., 2021). Ao abordar essas lacunas, pode-se avançar para uma abordagem de saúde pública mais inclusiva e relevante culturalmente.
Objetivos Diante do exposto, o objetivo deste estudo é investigar a presença e a abordagem de elementos de participação social e formação profissional para atuar em culturas distintas nos documentos legais relacionados à alimentação e nutrição no Brasil, visando compreender como esses aspectos são considerados na formulação e implementação de políticas públicas de saúde.
Metodologia Estudo descritivo de análise documental conduzido entre julho e setembro de 2022, com atualização em maio de 2024. A busca inicial dos documentos legais sobre alimentação e nutrição ocorreu em nas bases de dados: Google Acadêmico, PUBMED, SciELO, LILACS - BVS, CAPES e o site do Ministério da Saúde. Foram utilizados termos "Vigilância Alimentar e Nutricional", "Política Nutricional", "Sistema de Informação", “Programas e Políticas de Nutrição e Alimentação”, “Assistência Alimentar”, “Segurança Alimentar” e “Brasil” em português e inglês. Uma busca adicional foi realizada através do método Bola de Neve, a partir dos documentos encontrados na primeira busca.
A análise se concentrou em identificar elementos de participação social (menções sobre envolvimento da comunidade na elaboração, implementação, avaliação e monitoramento das políticas públicas) e formação profissional (menções a capacitação cultural) nos documentos. Utilizando frequência percentual, os documentos foram categorizados com base na presença ou ausência desses elementos, permitindo uma avaliação da sua representatividade.
Resultados e Discussão A análise incluiu 68 dispositivos legais, incluindo 33 decretos, 20 portarias, 14 leis e 1 decreto-lei, relacionados à alimentação e nutrição. Esses documentos cobrem iniciativas de prevenção de doenças, promoção da saúde e segurança alimentar, publicados entre 1940 e 2024.
Nos documentos analisados, foi mencionada a presença de pessoas próximas ao grupo cultural em 52,9% dos dispositivos legais, através do incentivo à participação da comunidade, lideranças comunitárias e organizações da sociedade civil na elaboração e controle das ações de saúde. A participação da população é crucial, pois são protagonistas no processo saúde-doença e possuem conhecimento sobre sua realidade, contribuindo para mudanças eficazes (André et al., 2021).
No entanto, o incentivo à participação social nos dispositivos legais analisados, só começou a ser mencionado após 1990. Isso pode ser justificado pelo fato de o reconhecimento da participação social como um direito ter se dado apenas com a Constituição Federal de 1988, promovendo a cidadania nos serviços de saúde e nas interações entre comunidade, profissionais e gestores do SUS (André et al., 2021).
Em relação aos profissionais de saúde, uma grande dificuldade é a falta de competência cultural. Muitos profissionais não estão preparados para se desvincular do modelo biomédico, que foca na relação causa-efeito e ignora o contexto social e cultural dos pacientes, utilizando como base as referências de sua própria cultura (Manso; Concone, 2021). No entanto, somente duas portarias e uma lei (4,4%) enfatizam a formação de profissionais através da educação permanente, com foco na realidade regional e população alvo.
Conclusões/Considerações finais Os documentos legais analisados ressaltam a importância da participação social como um pilar fundamental no desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a alimentação e nutrição. No entanto, ao examinar mais de perto esses documentos, percebe-se uma lacuna significativa no que diz respeito à formação dos profissionais de saúde para atuarem de forma relevante culturalmente junto ao público-alvo.
Esta ausência destaca a necessidade premente de políticas mais abrangentes, que não só incentivem a participação ativa da comunidade, mas também incorporem programas de capacitação e treinamento para os profissionais de saúde, capacitando-os a compreender e respeitar as diversas nuances culturais das populações atendidas. Ao abordar essa lacuna, podemos promover uma abordagem mais ampla e abrangente para a saúde pública, garantindo que as políticas e práticas adotadas sejam verdadeiramente inclusivas e relevantes culturalmente.
Referências ANDRÉ, A. N. et al. Dificuldades da participação social na Atenção Primária à Saúde: uma revisão sistemática qualitativa. Saúde em Redes, Porto Alegre, v. 7, n. 2, p. 217-237, 2021.
DOMINGOS, C. M. et al. A legislação da atenção básica do Sistema Único de Saúde: uma análise documental. Cadernos de Saúde Pública, v. 32, n. 3, p. 1-13, 2016.
MANSO, M. E. G.; CONCONE, M. H. V. B. Antropologia da saúde: considerações sobre os diversos referenciais teóricos. Revista Conhecimento & Inovação, Campinas, v. 2, n. 1, p. 1-15, 2021.
SOUZA, A. K. S. et al. Multiculturalism and coloniality in Brazilian formation. Brazilian Journal of Animal and Environmental Research, v. 4, n. 4, p. 5249-5262, 2021.
VERTHEIN, U. P.; AMPARO-SANTOS, L. A noção de cultura alimentar em ações de educação alimentar e nutricional em escolas brasileiras: uma análise crítica. Ciência & Saúde Coletiva, v. 26, n. 3, p. 4849-4858, 2021.
Fonte(s) de financiamento: Este trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por meio de bolsa de estudos durante o período de desenvolvimento da pesquisa. Atualmente, a autora principal do estudo recebe suporte financeiro da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP) por meio de bolsa de pesquisa.
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