Roda de Conversa

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC5.4 - Exercicios Emancipatórios

52952 - COMO ENFRENTAR A CONTRARREFORMA PSIQUIÁTRICA NO CONTEXTO BRASILEIRO? UM OLHAR SOBRE O FÓRUM DE LUTA ANTIMANICOMIAL POTIGUAR
ANA KALLINY DE SOUSA SEVERO - UFRN, ESLIA MARIA NUNES PINHEIRO - UFRN, JOSÉ MATEUS BEZERRA DA GRAÇA - UFRN, HIAGO MAIA DA COSTA - UFRN, MATHEUS RIOS SILVA SANTOS - UFRN, ANA KARENINA DE MELO ARRAES AMORIM - UFRN


Contextualização
A Reforma Psiquiátrica Brasileira (RPB) é um processo complexo que implica na construção do modelo psicossocial envolvendo diferentes dimensões, dentre elas a político-ideológica, a técnica assistencial, cultural, e a teórica. Nesse processo, os coletivos antimanicomiais têm uma importância histórica para mobilizar os enfrentamentos políticos necessários à transformação do modelo asilar. Apesar dos avanços da RPB, o Sistema Único de Saúde (SUS) e diversas Políticas Sociais passaram por um momento de extrema precarização desde o governo Temer (CEBES, 2019), com um desinvestimento nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) em detrimento do investimento em dispositivos manicomiais ocasionando a precarização do trabalho em saúde (Delgado, 2019). Paralelo a esse movimento de contrarreforma psiquiátrica houve um processo de organização de atores da luta antimanicomial constituídos por usuários, familiares e trabalhadores questionando as proposições da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e do Ministério da Saúde (MS) (Chiabotto; Nunes; Aguiar, 2022). Dóbies (2021) mostra a fundamental importância dos movimentos coletivos dos atores para fazer frente aos ataques sofridos pela reforma psiquiátrica, organizados a partir de dispositivos como fóruns de saúde mental.

Descrição da Experiência
O fórum de saúde mental foi formado no ano de 2023 por trabalhadores e trabalhadoras, usuários, docentes, acadêmicos (as), assessoria de mandato do legislativo municipal e outros atores interessados no campo da saúde mental. A escolha desses grupos objetivou implementar estratégias que propiciam uma ampliação das análises e também atuação política no campo da saúde mental. As estratégias utilizadas foram: busca ativa e convite de interessados; construção da grupalidade; continuidade das atuações em pequenos grupos a partir das decisões tomadas no coletivo; participação de assembleias públicas; escrita de documentos e manifestações com vistas a dar visibilidade a luta antimanicomial; acompanhamento e avaliação, com a escrita de atas de cada reunião e avaliação permanente dos encaminhamentos.


Objetivo e período de Realização
O trabalho objetivou analisar as experiências vivenciadas no projeto de extensão “Fórum potiguar de Direitos Humanos e Saúde Mental Antimanicomial”. Os encontros gerais ocorreram entre maio e dezembro de 2023 com frequência mensal, em uma capital do Nordeste brasileiro. Cada encontro tinha duração média de 2,5 horas. Entre os encontros mensais, haviam grupos de trabalhos e um grupo no whats para encaminhar discussões e documentos deliberados nos fóruns.

Resultados
Mapeamos alguns efeitos do processo junto ao coletivo: demandas de violações de direitos dos usuários (as) da RAPS, explicitando dificuldades intensas relacionadas ao transporte público para ir aos serviços e ao atendimento a outras demandas graves de saúde; situações de assédio e de péssimas condições de trabalho vivenciadas por trabalhadores que atuavam principalmente nos Centros de Atenção Psicossocial da cidade, o que dificultava ainda mais o cuidado na perspectiva da Atenção Psicossocial; aumento do diálogo com um mandato popular de um vereador da cidade, aumentando a participação social e a efetividade do controle social por parte de usuários e trabalhadores da RAPS, por meio do acompanhamento mais próximo acerca dos encaminhamentos da política municipal de saúde mental na Câmara Municipal da cidade; acompanhamento da legislação municipal acerca do funcionamento da Política de Saúde Mental local e das proposições Contrarreformistas em curso; construção de manifestações públicas escritas contrárias ao financiamento municipal para um hospital psiquiátrico; aumento da articulação intersetorial para fazer frente a política contra reformista encaminhada pela prefeitura da cidade.

Aprendizado e Análise Crítica
A presença dos efeitos da Contrarreforma Psiquiátrica era notória na capital que sediou essa experiência, a saber: dificuldade de a Atenção Primária em Saúde atender a demanda de saúde mental e a dialógica liberdade/aprisionamento no componente CAPS, dentre outras. Diante disso, a literatura sinalizou o fortalecimento dos fóruns de saúde mental intersetorial como uma ação necessária (Lima, 2018). Apontamos como desafio principal a permanência das trabalhadoras no fórum frente aos impasses vivenciados junto a gestão municipal por medo de perseguição política. Isso, somado ao período de distanciamento social na pandemia, fragilizou as experiências coletivas. A partir dos encontros identificamos o fortalecimento da rede, tal como reconhecido em outros fóruns, onde o planejamento da rede de cuidados se faz de maneira coletiva e participativa por parte dos trabalhadores de saúde mental, permitindo a formação e o empoderamento destes (Dorigan, 2014, p. 70). Identificamos ainda impactos formativos para docentes e discentes, fortalecendo o elo entre a academia e os serviços de saúde mental, possibilitando a formação de pesquisadores e novos trabalhadores da saúde comprometidos ética e politicamente com a atenção psicossocial. Esses movimentos de resistência são essenciais para a continuidade do projeto da Reforma Psiquiátrica e para a sustentabilidade da democracia (Dóbies, 2021).


Referências
CHIABOTTO, C C; NUNES, I S; AGUIAR, K S P. Contrarreforma psiquiátrica e seus reflexos no cuidado ao usuário e à família. EM PAUTA, 2022 - n. 49, v. 20, p. 81 – 94
COSTA, P H A da; FARIA, N C. “E agora, José”? Saúde Mental e Reforma Psiquiátrica brasileiras na encruzilhada. Physis: Revista de Saúde Coletiva [online]. v. 31, n. 04.
DELGADO, P G. Reforma psiquiátrica: estratégias para resistir ao desmonte. Trab. educ. saúde, v. 17, n. 2, 2019.
DÓBIES, D. Práticas profissionais e resistências: movimentos em uma rede de saúde mental. Appris Editora, 2021.
DORIGAN, J H; L’ABBATE, S. Rede mista: espaço transversal à construção do conhecimento e produção de práticas de saúde mental. SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 38, N. 100, P. 69-79, JAN-MAR 2014.
LIMA, D K R R. Entre fios e nós: uma análise da Rede de Atenção Psicossocial de Natal/RN. 2018. 183f. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva), Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2018.


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