Roda de Conversa

04/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC5.2 - Em cena: os processos participativos

50959 - PROJETO POLÍTICO DO MRSB NA CONJUNTURA 2013-2022: DA “QUESTÃO DEMOCRÁTICA NA ÁREA DA SAÚDE” AO “PLANO DA FRENTE PELA VIDA”
JAMILLI SILVA SANTOS - ESCOLA DE ENFERMAGEM. UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA., CARMEN FONTES TEIXEIRA - INSTITUTO DE SAÚDE COLETIVA, UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA.


Apresentação/Introdução
A emergência e articulação do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira (MRSB), em meados dos anos 70 do século passado contemplou a elaboração do projeto político da RSB e se desdobrou em múltiplas ações no âmbito dos movimentos sociais organizados. Este movimento confluiu para a 8ª Conferência Nacional de Saúde, cujo relatório sistematiza as bases conceituais e políticas do projeto de reforma, ou seja, a concepção ampliada de saúde, a defesa do direito universal à saúde e os princípios e diretrizes do SUS1. As dificuldades e limites do processo de RSB e da consolidação do SUS tem sido objeto de vários estudos que apontam como alguns dos principais problemas o subfinanciamento, a fragilidade da gestão pública, a complexa relação público-privada e a predominância do modelo de atenção hospitalocêntrico2.Ademais, tem se problematizado o papel do movimento sanitário, sobretudo a partir das manifestações de junho de 2013, da articulação dos conservadores e da direita, do impedimento da presidente Dilma, do governo Temer e da eleição de Bolsonaro. Nesse contexto, a questão das relações entre democracia e saúde foi recolocada no centro do debate político, estimulando a realização de uma pesquisa acerca do MRSB3, que analisou como este movimento se posicionou diante da ação/omissão do Estado face aos problemas de saúde e aos desafios postos ao sistema de saúde na conjuntura 2013-2022.

Objetivos
Analisar o projeto sociopolítico do MRSB, tomando como ponto de partida a caracterização do “projeto original” elaborado no período pré-constituinte, de modo a comparar este projeto com a possível “atualização” (agiornamento) produzida nos anos recentes, em função da mudança do cenário sociopolítico, dos avanços no debate teórico e político no campo da Saúde e da rearticulação do MRSB nessa conjuntura.

Metodologia
O estudo parte da noção de projeto sócio-político, como o conjunto de crenças, interesses, concepções de mundo, que orientam a ação política dos diferentes sujeitos4, o que, no caso do MRSB se refere a uma visão de mundo compartilhada pelas lideranças, materializada em propostas que configuram um futuro desejado em termos de melhoria da situação de saúde da população. As fontes de dados foram documentos com posicionamentos, declarações e notas emitidas separadamente ou em conjunto pelas principais entidades e sujeitos que compuseram o MRSB no período 2013 - 2022, publicados nos sites do CEBES e da ABRASCO. Para a caracterização do “projeto original foram analisados os documentos “A questão democrática na área da saúde” e o Relatório da 8ª CNS. Foram também realizadas 15 entrevistas com informantes-chave do MRSB, classificados em três grupos: a) Intelectuais orgânicos; b) Representantes de entidades orgânicas e c) Representantes de entidades vinculadas à FPV. Cumpriram-se os critérios estabelecidos pelas orientações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, sendo o projeto aprovado pelo CEP do Instituto de Saúde Coletiva conforme protocolo nº 50945621.8.0000.503012.

Resultados e Discussão
A análise do projeto sociopolítico do MRSB contemplou, inicialmente, o projeto original, identificando como eixos estruturantes a defesa da democracia e do direito universal à saúde, a proposta de construção de um sistema público de saúde (universal, descentralizado e participativo), e a inserção da política de saúde em um projeto de desenvolvimento econômico e social voltado à redução das desigualdades sociais e melhoria das condições de vida e saúde da população. No período 2013-2022, a conformação do projeto político do MRSB decorreu da confluência e articulação das propostas políticas defendidas por um conjunto de entidades que compuseram o movimento, especialmente as que atuam no espaço setorial da saúde5 (ABRASCO, REDE UNIDA, Associação Brasileira de Economia da Saúde, CEBES, Instituto do Direito Sanitário Aplicado, Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, etc.) mas também outras organizações e movimentos da sociedade civil brasileira que se agregaram ao MRSB, especialmente no período da pandemia de Covid-19, quando foi criada a Frente pela Vida, a exemplo da UNE, da CUT e do MST6. Por fim, o cotejamento entre os projetos original e atual, revelou que o projeto atual está alinhado com o projeto original da RSB, resguardando a “utopia concreta” de um “projeto civilizatório centrado na democratização da saúde”1, porém aprofundou o debate acerca do papel do Estado na condução do projeto de desenvolvimento nacional e incorporou a crítica à financeirização da saúde,7-8 além de incluir um conjunto de propostas que compõem a nova geração de luta por direitos, em função da dinâmica dos movimentos sociais contemporâneos, a exemplo dos movimentos das mulheres, negros, LGBTQIA+ e indígenas, bem como o reconhecimento da problemática ambiental, no campo e nas cidades.

Conclusões/Considerações finais
O projeto da RSB, em sua versão mais atualizada, continua alinhado a uma agenda de transformação que prioriza a justiça social, incompatível, portanto, com o capitalismo, especialmente, em sua expressão contemporânea, designado por alguns autores como uma “desordem mundial”7, que, no Brasil tem contribuído para a reprodução e aprofundamento das desigualdades sociais, ao tempo em que permanecem os traços autoritários e conservadores que atravessam a história do país e confluíram para a crise da democracia e fortalecimento do projeto neoliberal, autoritário e conservador. Na contraposição a esse processo, a atualização do projeto da RSB acompanhou o debate atual no campo progressista sobre a relação entre desenvolvimento, democracia e meio ambiente, tema central diante da atualização do capitalismo, indicando, ainda, a retomada da tradição crítica da Saúde Coletiva e de sua relação com o processo de RSB e construção do SUS.

Referências
1. PAIM, JS. Reforma Sanitária Brasileira: contribuição para a compreensão e crítica. EDUFBA/FIOCRUZ, Salvador, RJ, 2008
2. ABRASCO. 30 anos do SUS: contexto, desempenho e desafios. V. 23, nº esp 6. Rio De Janeiro, Jun 2018
3. Santos, JS. Movimento da Reforma Sanitária Brasileira na conjuntura 2013-2020: resistência e revitalização. Tese (doutorado) – ISC. UFBA. 2023
4.GOHN, MG. Teorias dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. 11 ed. SP: Loyola, 2014
5. TESTA, M. Pensamento estratégico e lógica de programação: o caso da saúde. SP: HUCITEC/- RJ: ABRASCO, 1995
6. SANTOS, JS; TEIXEIRA, CF. Análise política da ação do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira na pandemia da COVID-19: 2020-2021. Ciência & Saúde Coletiva, v 28, n 5, p 1287–1296, maio 2023
7. FIORI, J. L. A síndrome de Babel e a disputa do poder global. Petrópolis, RJ: Vozes. 2020

Fonte(s) de financiamento: Não houve.


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