49998 - EXPANSÃO DA REDE DE SERVIÇOS SUS DE TRATAMENTO DE HIV/AIDS: REGIONALIZAÇÃO OU IMPLEMENTAÇÃO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA ANA MAROSO ALVES - FMUSP, MARIA ALTENFELDER SANTOS - FMUSP, MARIA INES BATTISTELLA NEMES - FMUSP
Apresentação/Introdução O Sistema Único de Saúde (SUS) é responsável pelo acompanhamento clínico-laboratorial da maioria das pessoas em tratamento de HIV/Aids. Na instituição do então Programa Nacional de Aids, em 1986, estruturou-se uma rede de serviços de assistência clínica ambulatorial. Com a disseminação da epidemia no país e a incorporação da terapia antirretroviral, que converteu a doença pelo HIV em condição crônica, ocorreu o progressivo aumento no número de serviços do SUS para PVHA. Entre 2007-10 o nº de serviços aumentou cerca de 10% (de 636 para 712). Entre 2010-16 o aumento foi de 40% (712 para 1185), e entre 2016-2024 aumentou cerca de 21% (1185 para 1504). De competência predominantemente municipal, a expansão resultou em conjunto heterogêneo de tipologias organizacionais. Em 2010, os serviços do tipo Ambulatório eram a (59%) e os serviços de atenção primária (APS) eram 30%. De 2010 a 2016, a expansão ocorreu majoritariamente devido à implantação de tratamento na APS. A tendência parece ter sido influenciada pela difusão de propostas baseadas na necessidade de “descentralização” do tratamento e no potencial de maior integralidade do cuidado na APS. Estas propostas foram, em 2015, sintetizadas em publicações técnicas do Ministério da Saúde e implementadas por alguns gestores municipais. Este trabalho analisa a expansão ocorrida entre 2016 a 2024.
Objetivos Este estudo objetiva analisar a expansão, entre 2016 e 2024, do número de serviços do SUS que realizam o acompanhamento clínico-laboratorial do tratamento do HIV/Aids cadastrados no Ministério da Saúde, segundo tipologia organizacional e número de pessoas acompanhadas.
Metodologia A fonte de dados é o cadastro Qualiaids 2024. Desde 2001, os serviços do SUS que assistem PVHA são convidados a participar do inquérito Qualiaids, uma metodologia validada nacionalmente que avalia a organização desses serviços. Baseia-se na resposta ao Questionário Qualiaids, disponibilizado online e contendo questões de múltipla escolha sobre características do serviço e da organização do processo de trabalho.
Entre outubro de 2023 e abril de 2024, os serviços que assistem PVHA cadastrados pelo MS foram convidados a responder ao Qualiaids. O cadastro é feito a partir dos dados dos inquéritos anteriores, do cadastro mantido pelo MS e dos serviços informados pelos programas estaduais e municipais.
Os serviços foram caracterizados segundo porte: pequeno (até 100 pessoas), médio (de 101 a 500) e grande (mais de 500); e segundo a tipologia: APS, Ambulatório ou Outros; para os serviços que não responderam o questionário, a tipologia foi definida a partir de termos presentes no nome tais como CS, Unidade Básica de Saúde, Ambulatório, Serviço de Atenção Especializada, Unidade Sanitária, etc. Foram considerados novos serviços os que apareceram pela primeira vez no cadastro de 2023.
Resultados e Discussão Em 2023 foram cadastrados um total de 363 novos serviços, totalizando 1.504 serviços ativos. Em relação aos 1185 serviços registrados no cadastro de 2016, 44 serviços não estavam ativos no período do inquérito, e por isso não foram cadastrados. Responderam ao inquérito 1.297 (86%) serviços, e entre os novos serviços a adesão foi de 85% (309) dos serviços.
Dentre os novos serviços, 226 (62%) são do tipo APS e 118 (33%) do tipo ambulatório. Em relação ao porte, entre os novos serviços, os de pequeno porte, que atendem até 100 pessoas representam 54% (196) e são majoritariamente de APS (72%|141). Os serviços de maior porte, que atendem mais de 500 pessoas, representam 3% (11) e são em sua maioria (93%|10) do tipo Ambulatório. Há 76 (21%) novos serviços que atendem até 10 pessoas, sendo que destes, 67 (88%) são tipo APS e 7 (6%) tipo Ambulatório.
A expansão de serviços ocorreu de modo heterogêneo entre estados e municípios do país, sendo que 192 (54%) dos novos serviços estão localizados em 11 capitais. Dos novos serviços implantados em capitais, 180 (91%) são serviços de APS. Dentre os serviços implantados fora de capitais, observa-se a implantação de 167 serviços em 162 municípios onde não havia serviços que assistem PVHA e outros 4 serviços em 3 municípios onde já havia serviços. Nos municípios onde não havia serviços, 105 (63%) são serviços tipo Ambulatório e 45 (27%) tipo APS. Isto sugere que a expansão nestes municípios é resultante de um processo de implantação regionalizada de serviços, em acordo com o planejamento dos níveis locais. Já em algumas capitais, a expansão parece ter sido guiada menos pela descentralização e mais pela convicção de que os serviços de atenção primária devem ser a base do tratamento de HIV/Aids como o são para muitos outros agravos.
Conclusões/Considerações finais As propostas de implementação da assistência em HIV/Aids na APS repercutiram de modo concentrado em algumas capitais, resultando em numerosos serviços com número pequeno de pessoas em tratamento. A literatura internacional aponta que a descentralização da assistência pode aumentar o acesso ao cuidado, particularmente em locais com baixa oferta de médicos e equipes que assistem PVHA. Por outro lado, aponta que o cuidado compartilhado entre serviço especializado e serviço de APS pode levar a melhores desfechos do tratamento. Ressalta ainda a importância de considerar as questões de confidencialidade e estigma. A produção científica brasileira sobre o tema é ainda escassa. São necessários estudos mais robustos com utilização de métodos mistos que possam produzir subsídios racionais para o debate político.
Referências Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Caderno de Boas Práticas em HIV/Aids na Atenção Básica. Brasília – DF, 2014
Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Cinco passos para a implementação do Manejo da Infecção pelo HIV na Atenção Básica: Guia para Gestores. Brasília – DF, 2014
Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. O Manejo da Infecção pelo HIV na Atenção Básica – Manual para profissionais Médicos. Brasília – DF, 2015
Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Cuidado integral às pessoas que vivem com HIV pela Atenção Básica Manual para a equipe multiprofissional. Brasília – DF, 2015
Alves AM, Santos AC dos, Kumow A, Sato APS, Helena ET de S, Nemes MIB. Beyond access to medication: the role of SUS and the characteristics of HIV care in Brazil. Rev Saúde Pública [Internet]. 2023;57:26. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004476
Fonte(s) de financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) - Programa de Pesquisa em Políticas Públicas (PPPP) – Processo 2023/08543-5
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