Roda de Conversa

06/11/2024 - 08:30 - 10:00
RC2.18 - Abrindo caminho para migrantes, pessoas privadas de liberdade e outros grupos vulnerabilizados

49713 - MICROPOLÍTICA DO ACESSO AO CUIDADO EM SAÚDE BUCAL NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UM ESTUDO QUALITATIVO
NAESSA SANTOS BORGES ZURE - UFU, GLAUBIENY LOURENÇO DOS SANTOS - UFU, JAQUELINE VILELA BULGARELI - UFU, ÁLEX MOREIRA HERVAL - UFU


Apresentação/Introdução
O Brasil possui a terceira maior população carcerária no ranking mundial (estimada em 811.707 pessoas) e que continua a crescer a uma taxa média de 8% ao ano. Contudo, o sistema penitenciário brasileiro não tem sido capaz de acompanhar esse crescimento, devido a desarranjos estruturais e organizacionais (Conselho Nacional de Justiça, 2021). Em decorrência disso, as condições dos espaços prisionais são precárias e as instalações físicas superlotadas, implicando em condições sanitárias insalubres, alimentação inadequada, recursos humanos insuficientes, rotina de trabalho improvisada e insuficiência de assistência jurídica, educacional e de saúde (Siqueira et al., 2019). Nesse contexto, embora o direito à saúde no Brasil seja universal, é perceptível que a população privada de liberdade tem maior dificuldade de acesso aos cuidados em saúde. Assim, mantém-se uma alta incidência de doenças bucais, episódios de dor que, não esporadicamente, tornam-se intercorrências agudas (Lôbo; Portela; Sanchez, 2022).

Objetivos
: Compreender o percurso dos pacientes privados de liberdade até o acesso ao cuidado odontológico

Metodologia
Foi realizado um estudo qualitativo com homens privados de liberdade, que cumpriam pena em regime fechado em uma unidade prisional estadual do interior de Minas Gerais (Brasil). A coleta de dados foi realizada com base em entrevistas semiestruturadas. O recrutamento das pessoas privadas de liberdade foi realizado por meio de convites realizado com o apoio da equipe de saúde prisional e diretamente com os indivíduos com histórico de vivência de cuidado em saúde bucal dentro da unidade prisional. Foram realizadas entrevistas até que ocorreu a saturação teórica. As entrevistas ocorreram no período de junho/2023 até novembro/2023, momento em que ocorreu a saturação teórica. Após as gravações das entrevistas foram transcritas e analisadas por meio da Teoria Fundamentada de Dados. A interpretação dos dados foi realizada com a aproximação das categorias criadas às dimensões do Modelo de Acesso Centrado no Paciente (Levesque; Harris; Russell, 2013).

Resultados e Discussão
Os códigos produzidos na análise foram interpretados a partir do Esquema Conceitual do Acesso Centrado no Paciente. A categoria central apontou os indivíduos privados de liberdade são submetidos em uma micropolítica de acesso ao cuidado em saúde bucal. Esse cenário resulta de múltiplas negligências advindas do Estado, dos policiais penais e dos profissionais de saúde. Na aproximação das categorias ao referencial teórico, foram constituídos os seguintes agrupamentos: Capacidades dos Indivíduos Privados de Liberdade, onde ficaram as categorias capacidade de perceber, capacidade de procurar, capacidade de alcançar, capacidade de pagar e capacidade de envolver; e Barreiras Institucionais do Sistema Prisional, em que ficaram as categorias proximidade, aceitabilidade, capacidade e acomodação, esforço financeiros e adequabilidade. Para uma população que já enfrenta dificuldades adicionais de acesso aos serviços de saúde, a configuração da micropolítica agrava a iniquidade em saúde, vulnerabilizando e dificultando a reinserção social da pessoa privada de liberdade. Em uma visão ampliada, a negligência estatal se inicia antes mesmo do confinamento, uma vez que as pessoas privadas de liberdade têm um perfil sociodemográfico e econômico intimamente relacionado à pobreza, à vulnerabilidade social e à falta de acesso a saúde (Damasceno et al., 2020). A negligência estatal também pode ser identificada na baixa adesão de Estados e municípios às políticas de saúde no ambiente prisional, demonstrando pouco esforço para o cumprimento da legislação na área da saúde (Siqueira et al., 2019; Lôbo; Portela; Sanchez 2022). A baixa adesão à política nacional de saúde no ambiente prisional decorre do fato da adesão não é voluntaria (Lôbo; Portela; Sanchez, 2022).

Conclusões/Considerações finais
Para os homens privados de liberdade, as barreiras de acesso a saúde bucal resultam da negligência do Estado, que promove a superlotação e a falta de profissionais qualificados. Esse cenário cria uma micropolítica de acesso, rompendo a lógica da equidade.

Referências
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. O sistema prisional brasileiro fora da Constituição: 5 anos depois: balanço e projeções a partir do julgamento da ADPF 347. Brasília, DF: 2021.
SIQUEIRA, M. R.; VILAS BOAS, M. C. R.; ABUD, J. I. F.; ARAÚJO, R. J. G.; REIS, A. C. A. Saúde bucal da população carcerária: levantamento epidemiológico. Journal of Research in Dentistry, v. 7, n. 6, p. 91-106, 2019
LÔBO, N. M. N.; PORTELA, M. C.; SANCHEZ, A. A. M. M. R. Análise do cuidado em saúde no sistema prisional do Pará, Brasil. Ciênc. saúde coletiva, v. 27, n. 12, p. 4423, 2022.
LEVESQUE, J. F.; HARRIS, M. F.; RUSSELL, G. Patient-centred access to health care: conceptualising access at the interface of health systems and populations. Int J Equity Health, v. 12, p. 18, 2013.
DAMASCENO, S. G. C.; et al. Sistema penitenciário e saúde: avaliação das condições bucais de detentos da região metropolitana de Salvador, BA. Enciclopédia Biosfera, v. 17, n. 34, p. 470.

Fonte(s) de financiamento: CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Financiamento nº 001). CNPQ - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (INCT Saúde Oral e Odontologia - Financiamento n. 406840/2022-9)


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