49084 - SER MÃE NA PRISÃO: A DUPLA PENALIDADE KALLINY MIRELLA GONÇALVES BARBOSA - UEFS, MARCELO TORRES PEIXOTO - UEFS, MARCIO COSTA DE SOUZA - UEFS, MARIANA DE OLIVEIRA ARAÚJO - UEFS, THAYSA MARIA VIEIRA JUSTINO - UNIVASF, CLARA EMANUELLY RODRIGUES DE MENEZES - UNIVASF, ANA ELISA DOS SANTOS GOMES - UEFS, ANA ÁUREA ALÉCIO DE OLIVEIRA RODRIGUES - UEFS, CARLA TAIANA ARAUJO VILA NOVA - UEFS
Apresentação/Introdução A maternagem no ambiente prisional é atravessada por diferentes aspectos que envolvem a mãe em situação de cárcere, a família e os filhos, sejam estes de convivência intra ou extramuros. Isso porque, o significativo aumento do encarceramento feminino permite refletir sobre as marcas que o aprisionamento causa na rede socioafetiva da mulher, tendo em vista que o perfil das mulheres em situação de cárcere é caracterizado por 80% de mães, mulheres em idade fértil e grávidas (Brasil, 2021).
Esta situação deveria condicionar a existência de uma infraestrutura diferenciada, com espaços específicos e saudáveis para a garantia da manutenção dos vínculos familiares e do binômio mãe-filho, além de proporcionar o resgate da autoestima das mulheres. No entanto, o que é observado nas unidades prisionais femininas são fatores que reproduzem a diferença de gênero e os enraizamentos misóginos da sociedade (Siqueira; Andrecioli, 2021).
A relação mãe-filho, nessa circunstância, se distancia da concepção de um vínculo confiável, seguro, sólido e contínuo, passando a ser marcada pela distância e pelo processo de separação ao longo do tempo em que a mãe se encontra no ambiente prisional. O afastamento ainda enfrenta algumas barreiras relacionadas ao contato limitado com as crianças durante as visitas, de modo a reforçar a fragilização do binômio mãe-filho (Fowler et al., 2022).
Objetivos Compreender as percepções e os sentimentos que a mulher em situação de cárcere enfrenta, em relação à separação dos filhos, no cotidiano da Cadeia Pública Feminina de Petrolina-PE.
Metodologia O estudo possui caráter qualitativo exploratório, realizado na Cadeia Pública Feminina de Petrolina (CPFP), a qual possuía, no período da coleta, nos meses de maio e junho de 2023, 34 mulheres em situação de cárcere nos regimes semiaberto e fechado.
Em relação às participantes do estudo, foram realizadas dez entrevistas obedecendo o critério de saturação, pelo qual a coleta foi interrompida a partir da regularidade de apresentação das concepções, explicações e sentidos abordados pelas participantes. Como ferramentas de pesquisa, utilizou-se a entrevista semiestruturada norteada por um instrumento com perguntas disparadoras para evitar possíveis fugas do objeto de estudo.
A análise e interpretação dos dados empíricos são apresentados sob a luz da hermenêutica-dialética. Emergiram três categorias de análise, este resumo aborda a categoria “MARCAS IDENTITÁRIAS DO SER MÃE NA PRISÃO: vivências e sentidos da dupla penalidade”. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano sob CAAE nº 53114221.7.0000.8052.
Resultados e Discussão A compreensão de que a separação imposta pelo encarceramento representa um impeditivo para a continuidade do cuidado e funções maternas, reflete a dupla penalidade do aprisionamento feminino e as implicações advindas do distanciamento e do sofrimento da mulher, dos filhos e da família (Flores et al., 2022). Destaca-se que todas as participantes estavam em regime fechado e apenas quatro residiam em Petrolina-PE, antes do encarceramento.
O enfrentamento da separação se desdobra sobre os sentimentos negativos, atrelados ao fato de a mãe ter que se ausentar para o cumprimento da pena e sobre as preocupações despertadas devido às condições de cuidado a que seus filhos estão expostos (Arruda e Smeha, 2019). As mães entrevistadas relataram sobre os primeiros pensamentos após o contato com a prisão, os sentimentos associados ao afastamento e as estratégias de enfrentamento diante da separação mãe-filho.
Para as entrevistadas o encarceramento repercutiu na fragilização do vínculo mãe-filho, devido à condição de separação e do cárcere, impactando nos primeiros dias de convívio na cadeia e na ressignificação da ausência a partir das visitas virtuais, das lembranças extramuros e do apego à religiosidade. O convívio mãe-filho após o encarceramento foi relatado como uma oportunidade para experienciar os momentos que não puderam ser vivenciados devido a prisão, contudo, apontam o medo do comportamento transgressor dos filhos e o desejo da reconstrução.
Ressalta-se que, duas entrevistadas estavam gestantes e convergiram sobre os entrelaçamentos associados à gestação no cárcere, relatando os sentimentos diante de uma nova gravidez, ao mesmo passo em que refletiram sobre as adversidades enfrentadas para o cuidado e atendimento às necessidades da gestação.
Conclusões/Considerações finais Os resultados da pesquisa corroboram para o entendimento de que os efeitos da institucionalização transcendem a realidade intramuros e que o enfrentamento não é rotulado, devendo-se compreender as nuances envolvidas em cada processo e estimular a continuidade do vínculo mãe-filho. A separação e a fragilização do vínculo mãe-filho são atravessadas pelo desejo de retomar a vida pós-cárcere e o convívio com os filhos, mesmo diante dos impactos do encarceramento para a mulher, os filhos e a família.
Além das mães que lidam com o afastamento dos filhos, é percebido que a descoberta da gravidez no cárcere desperta uma dualidade sentimental, pois a gravidez pode ser compreendida como nova oportunidade para o exercício do cuidado, ou ser vista sob o viés das dificuldades do cárcere para a garantia do bem-estar físico e emocional das gestantes. Essa conjuntura faz emergir múltiplos sentimentos na mãe que vivencia a gestação em um ambiente que não é preparado para estimular o binômio mãe-filho.
Referências ARRUDA, L. F. S.; SMEHA, L. N. Parentalidade (In)Desejada: Avós e Tias que Cuidam dos Filhos(as) de Mulheres Presas. PSI UNISC, v. 3, n. 2, 2019.
BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Levantamento Nacional de Informações Penitenciária. Brasília: Ministério da Justiça, 2021.
FLORES, N. M. P.; ARRUDA, L. F. S.; DANZMANN, P. S.; SMEHA, L. N. Maternidade Entre Grades: A Ruptura da Convivência Entre as Mulheres Presas e Seus Filhos. Pensando Famílias, v. 26, n. 1, 2022.
FOWLER, C.; ROSSITER, C.; POWER, T.; DAWSON, A.; JACKSON, D.; ROCHE, M. A. Maternal incarceration: Impact on parent–child relationships. Journal of Child Health Care, v. 26, n. 1, 2022.
SIQUEIRA, D. P.; ANDRECIOLI, S. M. A vulnerabilidade das mulheres encarceradas e a justiça social: o importante papel da educação na efetividade no processo de ressocialização. Revista direito em debate, n. 51, 2019.
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