53759 - INIQUIDADE NO ACESSO AOS DIREITOS À MORADIA E À ATENÇÃO À SAÚDE: RELATO DE EXPERIÊNCIA DE PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM EM OCUPAÇÃO DO MTST CRISLAINE LOQUETI SANTOS RAINHO PRADO - ESCOLA DE ENFERMAGEM DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (EEUSP), CELIA MARIA SIVALLI CAMPOS - ESCOLA DE ENFERMAGEM DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (EEUSP), MARINA PEDUZZI - ESCOLA DE ENFERMAGEM DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (EEUSP)
Contextualização Trata-se de relato de experiência, no contexto do ensino prático de disciplina de graduação em Enfermagem de uma universidade pública da região sudeste do país, para identificação de necessidades em saúde de famílias residentes em uma ocupação do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). As atividades foram previamente discutidas, articuladas com coordenadores do MTST e realizadas na área da Ocupação, em quatro períodos, por um grupo de 14 estudantes, uma docente e uma doutoranda vinculada ao estágio supervisionado em docência. Esta atividade prática buscou promover a aproximação dos estudantes de graduação às necessidades em saúde de indivíduos e famílias de um determinado grupo social.
Descrição da Experiência No primeiro encontro os membros da coordenação relataram o processo da composição da ocupação, que ocorreu no período da pandemia, e em seguida acompanharam o grupo para reconhecimento do espaço, composto pelas moradias, horta e cozinha solidária. Na sequência, duplas de estudantes entrevistaram representantes de famílias residentes na Ocupação, com o objetivo de identificarem condições de trabalho, vida e saúde dos membros das famílias, bem como acesso às instituições sociais do bairro. As entrevistas foram conduzidas a partir da aplicação de um roteiro com perguntas abertas sobre características da inserção do chefe da família no trabalho e da dimensão do consumo, relacionada às condições de vida. Também buscou-se identificar problemas de saúde de membros das famílias e acesso em serviços do bairro para resolvê-los. A partir desse contato inicial com os entrevistados e avaliação das atividades do primeiro dia com moradores e coordenação da Ocupação, foi proposta no segundo encontro uma roda de conversa ampliada, com a participação de moradores, coordenadores e a enfermeira da equipe de saúde do movimento.
Objetivo e período de Realização Objetivo: Relatar a experiência da supervisão de grupo de estudantes durante o ensino prático em uma ocupação do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), como parte integrante das atividades pedagógicas de uma disciplina obrigatória, oferecida no primeiro semestre da graduação em enfermagem de uma universidade pública. Período de realização: As atividades ocorreram em quatro períodos, em dois dias, no primeiro semestre de 2024.
Resultados Os estudantes realizaram 22 entrevistas com membros das famílias da ocupação. A partir das entrevistas e do diálogo com os moradores em rodas de conversas, os estudantes sinalizaram, dentre outros aspectos, a importância do registro de informações auto referidas dos quesitos raça/cor e gênero. Frente a isso, aponta-se a relevância de garantir a multiplicidade de marcos teóricos durante a formação na graduação, entre eles o da interseccionalidade, como ferramenta analítica na promoção de justiça social e sua contribuição no reconhecimento e enfrentamento das iniquidades presentes nas práticas de atendimento às necessidades de usuários, famílias, grupos sociais e comunidade. Observou-se que os estudantes participaram ativamente nas discussões, buscando compreender o acesso aos serviços de saúde, educação, equipamentos sociais e os desafios para o suporte psicológico em serviços de saúde mental. Os relatos dos moradores evidenciaram entraves ao acesso às unidades de ensino formal e de saúde, como a dificuldade para o cadastro na UBS de referência e para matricular as crianças nas escolas da região, por não terem endereço formal da moradia, todos portam apenas o CEP como comprovante.
Aprendizado e Análise Crítica A experiência relatada contribui na implementação de propostas de mudanças no âmbito da educação e formação dos profissionais de saúde, aqui particularmente da enfermagem, compromissadas com a inclusão, diversidade, equidade, acessibilidade e a justiça social. Isso, à medida que busca promover a construção do conhecimento crítico, pautado nas necessidades de saúde de indivíduos, famílias e grupos sociais e reconhecimento de barreiras ao acesso à direitos constituídos. As famílias entrevistadas compõem um grupo marcado pela invisibilidade tanto pela sociedade civil quanto pelo Estado, a começar por não acessarem direitos básicos para a dignidade humana, direitos que constam na Constituição Federal, como moradia, educação e saúde, mas que não são cumpridos, evidenciando as desigualdades e iniquidades de populações que vivem no município mais rico do país. A experiência de acompanhamento dos estudantes revelou o potencial da abordagem dos marcadores sociais de desigualdades e iniquidades na perspectiva da interseccionalidade, articulados ao referencial teórico da Saúde Coletiva sobre necessidades em saúde, bem como do processo de reprodução social e de determinação social da saúde.
Referências Campos CMS, Soares CB. Necessidades de saúde e o cuidado de enfermagem em saúde coletiva. In: Soares CB, Campos CMS. Fundamentos de saúde coletiva e o cuidado de enfermagem. Barueri: Manole; 2013. p. 265-292.
Collins PH. Bem mais que ideias: a interseccionalidade como teoria social crítica. 1ª ed. São Paulo: Boitempo; 2022. 423p.
Fonte(s) de financiamento: O presente relato de experiência foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES).
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