Roda de Conversa

05/11/2024 - 08:30 - 10:00
RC2.10 - Cidadãos invisiveis: a saúde na rua

51059 - POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA: UM ESTUDO NO MUNICÍPIO DE NITERÓI - RJ
MÔNICA DE CASTRO MAIA SENNA - UFF, LENAURA DE VASCONCELOS COSTA LOBATO - UFF, GIOVANNA BUENO CINACCHI - CEBES


Apresentação/Introdução
A população em situação de rua apresenta um conjunto múltiplo de vulnerabilidades sociais, cujo enfrentamento requer o esforço articulado de diferentes políticas públicas. Em 2009, o governo federal brasileiro lançou a inédita Política Nacional para a população em situação de rua (PNPSR), demarcando um novo olhar para a questão, em contraposição ao histórico predomínio de ações pontuais de âmbito caritativo, combinadas ou não a medidas higienistas e repressivas. Dentre as inovações trazidas pela PNPSR estão o reconhecimento da população em situação de rua como sujeitos de direitos, a compreensão da situação de rua como um processo multidimensional e multifacetado e o desenho da política com base nas diretrizes da intersetorialidade, articulação intergovernamental e participação social. Além disso, instituiu o Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da política (CIAMP-Rua), com composição paritária entre governo e sociedade civil. Passada mais de uma década de sua criação, pouco se avançou na implementação da PNPSR, apesar de avanços verificados nas políticas de saúde e de assistência social, onde a criação de serviços específicos como Consultório na Rua (CnaR) e CentroPOP, respectivamente, se pauta na perspectiva de proteção integral a esse segmento, de forma articulada à Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) e ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

Objetivos
O presente trabalho é parte de um projeto mais amplo que buscou apresentar subsídios para a construção de uma política municipal para a população em situação de rua (PSR) de Niterói. O objetivo desse trabalho é examinar a oferta de ações públicas dirigidas a esse segmento no município e como as pessoas em situação de rua avaliam as políticas que usam e com as quais convivem em seu cotidiano.

Metodologia
Procedeu-se a pesquisa de campo inédita com amostra de 157 pessoas adultas em situação de rua, 28 instituições públicas e 10 grupos sociais que desenvolvem algum tipo de ação voltada para esse segmento no município de Niterói. O trabalho de campo foi realizado entre os meses de agosto/2021 a julho/2022, após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Foram realizados levantamento documental e entrevistas pautadas em dois roteiros distintos: um para as instituições e outro para a PSR. O trabalho de campo foi precedido de preparo da equipe de pesquisadores, contando com oficinas de alinhamento metodológico com especialistas na temática, profissionais atuantes e representantes da própria PSR. As informações coletadas foram transcritas para a plataforma Surveymonkey e após conferência, crítica e sistematização, foram extraídas frequências e feitos cruzamentos. A análise considerou eixos distintos em relação às instituições e grupos sociais e outro referente à População em Situação de Rua.

Resultados e Discussão
As intervenções do poder público para a PSR no município são conduzidas quase que exclusivamente pelas políticas de assistência social e saúde. Há também serviços vinculados à área de Direitos Humanos. Não foram localizadas ações de outras políticas públicas, tais como emprego e renda e habitação, áreas reconhecidas por quase todas as pessoas em situação de rua entrevistadas como meios que proporcionariam sua saída das ruas. Essa ausência compromete o alcance das iniciativas que vêm sendo desenvolvidas. A maior parte da PSR reconhece e frequenta o único CnaR existente no município, mas são os CAPS os serviços de saúde mais referenciado, sobretudo na modalidade CAPS-AD. As unidades de saúde dizem não ter restrição de acesso à PSR e a maioria das pessoas em situação de rua afirma não ter enfrentado dificuldades de acesso aos serviços. No SUAS, o serviço mais acessado é o CentroPOP, seja para acompanhamento pela equipe técnica, seja com a finalidade de tomar banho e fazer refeições. O município conta também com Serviço de Abordagem Social, instituições de acolhimento e hotel emergencial para a população adulta. A maior parte desses serviços possui restrições de acesso, interditando pessoas em surto; sob efeito de álcool, outras drogas; e com animais de estimação ou grande quantidade de pertences. Apesar disso, a maioria das pessoas de rua entrevistadas informou não ter dificuldades de acessar os serviços. Entre as dificuldades mencionadas tanto na saúde quanto na assistência social, aparecem o tempo de espera, a falta de profissionais e preconceitos por parte tanto de outros usuários como de profissionais. Os grupos sociais são, em sua maioria, de orientação religiosa e possuem forte penetração junto à PSR, desenvolvendo ações de distribuição de alimentos e agasalhos.

Conclusões/Considerações finais
Apesar dos avanços nas políticas de assistência social e saúde, elas são insuficientes para enfrentar a complexidade da rualização, sobretudo em cenário de crise econômica, austeridade fiscal e agravamento das condições sociais. Inexistem ou são muito frágeis as ações intersetoriais de proteção a essa população, assim como são poucos e incipientes os grupos sociais que atuam na defesa dos direitos desse segmento no município. A diversidade que reveste o fenômeno de rualização e a profunda imbricação a múltiplos determinantes colocam a necessidade de políticas abrangentes, que alcancem outras políticas e promovam a integração entre elas. O momento atual parece propício à retomada das diretrizes da PNPSR, mas contrasta com o avanço de concepções higienistas e discriminatórias. As políticas precisam também ouvir a PSR, suas histórias e acolher suas necessidades sociais, reconhecendo sua condição de sujeitos e contribuindo para o fortalecimento de sua mobilização e luta por direitos.

Referências
BARBOSA, JCG. Implementação das políticas públicas voltadas para a população em situação de rua: desafios e aprendizados. Dissertação (Mestrado em Políticas Públicas e Desenvolvimento). Brasília: IPEA, 2018. 120f.

BRASIL. MDH. Plano de Ação e Monitoramento para Efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua. Plano Nacional Ruas Visíveis.Brasília: MDHC, 2023.

BRASIL. Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências.

BRONZO, C. Intersetorialidade, Autonomia e Território em programas municipais de enfrentamento a pobreza: Experiências de Belo Horizonte e São Paulo. Planejamento e Políticas Públicas, n.35, jul./dez. de 2010.

FERRO, MCT. Política Nacional para a População em Situação de Rua: oprotagonismo dos invisibilizados. Revista Direitos Humanos nº 08, 2012.

Fonte(s) de financiamento: Programa de Desenvolvimento de Projetos Aplicados (PDPA)


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