49086 - ROTINA, SUSTENTO E AUTOCUIDADO DE MÃES EM SITUAÇÃO DE CÁRCERE KALLINY MIRELLA GONÇALVES BARBOSA - UEFS, MARCELO TORRES PEIXOTO - UEFS, MARCIO COSTA DE SOUZA - UEFS, WANESSA OLIVEIRA ROSÁRIO - UEFS, BRENNA ARAÚJO FÉLIX - UEFS, VITÓRIA KAROLINE GONÇALVES SILVA - UEFS, JOICE OLIVEIRA MACHADO - UEFS, ANA ÁUREA ALÉCIO DE OLIVEIRA RODRIGUES - UEFS
Apresentação/Introdução A situação da mulher encarcerada está imbricada no histórico socialmente construído sobre a posição que a mulher deve ocupar, sendo esta caracterizada pela submissão, inferioridade e invisibilidade. A partir do momento em que a mulher amplia sua participação no espaço social, ganhando representatividade e autonomia, se constitui, direto ou indiretamente, uma das razões para o aumento da criminalidade (Siqueira e Andrecioli, 2019).
O estigma enfrentado pelas mulheres em situação de cárcere é potencializado devido a não aceitação social de sua inserção no mundo do crime, sendo este um espaço, ideologicamente, masculino (Silva; Borba e Baraldi, 2021). Essa realidade legitima e naturaliza as condições impostas pela violência estrutural e institucional das políticas instituídas por um Estado social mínimo que expõe a população carcerária à vulnerabilidade penal, sobretudo, o público feminino (Gershenson et al., 2017).
É nesse contexto de intensas vulnerabilidades que a maior parte das mulheres privadas de liberdade vivenciam a maternagem e lutam pelo reconhecimento como sujeitos de direito no ambiente carcerário. Tal conjuntura aponta para a necessidade de centralizar o gênero de maneira articulada com outros marcadores sociais para que se consiga analisar as nuances enfrentadas pelas mulheres e mães do sistema penitenciário no que concerne à rotina, autocuidado e sustento.
Objetivos Compreender como a rotina no interior da cadeia e suas repercussões podem refletir na maternagem de mulheres em situação de cárcere na Cadeia Pública Feminina de Petrolina-PE.
Metodologia Trata-se de um estudo qualitativo exploratório, realizado na Cadeia Pública Feminina de Petrolina (CPFP) durante os meses de maio e junho de 2023. Nesse período, a CPFP possuía, nos regimes semiaberto e fechado, 34 mulheres.
Realizou-se dez entrevistas semiestruturadas obedecendo o critério de saturação e norteadas por um instrumento com perguntas disparadoras para evitar fugas do objeto de estudo. Tendo em vista que a amostragem aleatória não pode ser realizada devido à limitação do quantitativo de pessoas na CPFP, as participantes foram escolhidas intencionalmente conforme os critérios de inclusão.
A análise e interpretação dos dados da pesquisa são apresentados sob a luz da hermenêutica-dialética, método que fortalece os processos de subjetivação das pessoas e permite a transversalização das convergências, divergências, complementaridades e diferenças identificadas nas falas. Emergiram três categorias de análise, este resumo aborda a categoria “OS DIAS NA CADEIA: rotina, sustento e autocuidado de mães em situação de cárcere”. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano sob CAAE nº 53114221.7.0000.8052.
Resultados e Discussão Os dias na cadeia são atravessados por condições que interferem na percepção das mulheres sobre sua rotina, convívio, sustento e autocuidado no cárcere. Isso porque na prisão a pessoa está sujeita à insalubridade do espaço e à ruptura dos vínculos externos que limitam a experiência nesse ambiente, reverberando no afastamento familiar, adoecimento e dificuldade de enfrentamento às adversidades impostas pelo cárcere (Medeiros et al., 2022).
Nessa perspectiva, as entrevistadas identificaram a rotina prisional como dias permeados por atividades repetitivas e que, no cenário da mulher que é mãe e está neste ambiente, a ausência dos filhos torna a vivência no ambiente prisional transversalizada por preocupações com os filhos que estão distantes do convívio com a mãe.
As entrevistas abordam a participação da família na manutenção das necessidades da mulher que se encontra distante das suas atividades laborais e limitada no que tange ao autossustento. No entanto, as mulheres ainda apontam a responsabilidade com o cuidado dos filhos, acrescentando que o valor recebido pela maioria das mulheres é dividido com a família, sendo a manutenção das necessidades oriundas do confinamento feita com recebidos de doações e com parte da quantia obtida dos auxílios (bolsa família e auxílio alimentação).
Ademais, as falas permitem refletir não somente sobre a rotina intramuros, mas também sobre o autocuidado extramuros das mulheres que estão em situação de cárcere e os atravessamentos presentes no cotidiano dessa pessoa que a impedia de cuidar de si. Assim, apesar das precariedades do sistema penitenciário, é percebido que o ambiente prisional ainda pode se configurar como um facilitador do acesso à serviços e cuidados que a mulher não conseguia alcançar em sua rotina extramuros.
Conclusões/Considerações finais O encarceramento transcende a limitação do direito de ir e vir, afetando, inclusive, o acesso às necessidades básicas de sobrevivência em um espaço dominado pela precariedade e pelo descumprimento das legislações. Percebe-se que a mulher no cárcere sofre não somente pela sua dependência financeira, afetiva e pela rotina monótona, mas também por se encontrar afastada do ambiente familiar e ser necessário transferir as responsabilidades que são condicionadas à figura materna a outrem.
Sobre o autocuidado das mulheres em situação de cárcere, desprende-se que cada dia no ambiente prisional é um desafio, considerando, sobretudo, os sentimentos que impactam, direto ou indiretamente, no comportamento diário das pessoas. É diante desse contexto que se identifica a necessidade da reinvenção para ultrapassar alguns dos desafios impostos pelo ambiente prisional, a partir de práticas e de mecanismos de resiliência como estratégias para adaptação e enfrentamento às condições do cárcere.
Referências MEDEIROS, A. B.; SILVA, G. W. S.; LOPES, T. R. G.; CARVALHO, J. B. L.; CARAVACA-MORERA, J. A.; MIRANDA, F. A. N. Representações sociais da maternidade para mulheres em privação de liberdade no sistema prisional feminino. Ciênc. saúde coletiva, v. 27, n. 12, 2022.
GERSHENSON, B.; FERREIRA, G. G.; ÁVILA, L. F.; JACQUES, C. O. Juventudes encerradas: extermínio e aprisionamento segundo opressões de classe, raça e gênero. Argum., v. 9, n. 1, 2017.
SILVA, J. D.; BORBA, T. C. S. B.; BARALDI, F. G. Mulheres em cárcere: um estudo sobre a situação carcerária feminina no Brasil. Revista Vertentes do Direito, v. 8, n. 2, 2021.
SIQUEIRA, D. P.; ANDRECIOLI, S. M. A vulnerabilidade das mulheres encarceradas e a justiça social: o importante papel da educação na efetividade no processo de ressocialização. Revista direito em debate, n. 51, 2019.
|