Roda de Conversa

05/11/2024 - 08:30 - 10:00
RC2.7 - Segurança alimentar

51951 - PRODUÇÃO DE CAPITAL E REPRODUÇAO DA FOME: A INSEGURANÇA ALIMENTAR COMO FORMA DE EXCLUSÃO SOCIAL NO BRASIL
THALLIS SOUSA SILVA - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, ANDREIA DE CONTO GARBIN - UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE


Apresentação/Introdução
Em 2014, o Brasil saiu pela primeira vez do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas. No entanto, após o golpe político que resultou no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, aliado ao desmonte das políticas públicas voltadas à segurança alimentar nos primeiros dias do ex governo Bolsonaro (MELITO, 2020), à implementação de um teto de gastos públicos (EC 95/2016) que comprometeu a execução de políticas públicas voltadas às populações em situação de vulnerabilidade, à precarização do trabalho e à negligência na condução da pandemia, teve-se como resultado um cenário em que 33 milhões de pessoas passaram a sobreviver fome e mais de 125 milhões estavam com algum grau de insegurança alimentar (PENSSAN, 2022). A fome, neste contexto, é aqui abordada como uma forma de opressão e exclusão social que impacta diretamente nas condições materiais e psicológicas das populações que vivem em situação de vulnerabilidade social e insegurança alimentar (SAWAIA, 2009).

Objetivos
Explicitar as consequências da lógica capitalista na produção de sofrimentos ético- políticos associados à condição de insegurança alimentar, adotando a fome como fio condutor das discussões e reflexões acerca dos impactos materiais e subjetivos naqueles que a vivenciam, partindo da análise de produções da mídia tradicional acerca da fome, assim como das políticas públicas destinadas à população em situação de vulnerabilidade social.

Metodologia
Pesquisa qualitativa e de caráter exploratório, se constituindo a partir da Saúde Pública e da caracterização de conhecimentos no campo da Psicologia Social, adotando uma perspectiva de interpretação de aspectos subjetivos das relações sociais a partir de um viés sócio-político, compreendendo a economia política da saúde e as políticas públicas no campo da alimentação como determinantes nos processos de subjetivação dos indivíduos e grupos sociais. Foram realizados levantamentos de produções científicas sobre insegurança alimentar e desigualdade social nos campos da Saúde Coletiva, Psicologia Social e Nutrição, com foco nos
sistemas alimentares em suas variadas dimensões. Em seguida, foi realizado um levantamento bibliográfico de notícias, matérias jornalísticas e reportagens dos últimos 5 anos sobre Insegurança Alimentar e Fome no Brasil, sendo selecionados 8 veículos distintos. Por fim, os dados destas produções jornalísticas foram criteriosamente sistematizados e criticamente analisados e discutidos a partir do referencial teórico da Saúde Coletiva e da Psicologia Social.

Resultados e Discussão
As condições estruturais produtoras da fome e as consequências de um modelo de produção capitalista na reprodução de sofrimento foram o foco do presente trabalho.
A partir da análise dos materiais jornalísticos selecionados, publicados entre 2019 e 2023, foram construídas as categorias: fome como pauta econômica, condicionantes sociais da fome, vozes da população em situação de insegurança alimentar e a produção da fome como projeto político.
Identificou-se diferentes terminologias para adotar o fenômeno estudado nos jornais selecionados: ora a partir de perspectivas individualizantes sobre a questão, reduzindo a fome a um problema econômico e ignorando seus condicionantes sociais, ora dando voz à população em situação de vulnerabilidade social e tratando a fome como um problema complexo e com impactos psicossociais diversos.
As estratégias políticas de combate à fome eram comumentemente desvalorizadas nas produções jornalísticas analisadas, com o foco das discussões voltados, unicamente, aos seus impactos. Tais produções apresentavam a questão da insegurança alimentar como parte de um "problema mundial", ligado às dinâmicas geopolíticas de diferentes países e, portanto, naturalmente esperado nos processos de socialização e reprodução econômica.
A saúde pública e a exclusão social só eram abordadas em produções jornalísticas da chamada "mídia contra-hegemônica", aquela que inclui em seu editorial narrativas de "grupos marginalizados da população habitualmente relegados ao silêncio histórico" (COUTINHO, 2008, p.5). Nestas, a fome passa a aparecer como fator de adoecimento físico e mental, que está associada às condições materiais de vida dos usuários do sistema público de saúde e intrinsecamente ligada aos processos políticos do país.

Conclusões/Considerações finais
O debate realizado no presente trabalho se constituiu num esforço de propor reflexões acerca dos impactos da fome nas questões subjetivas que fazem parte da constituição da existência de pessoas em situação de vulnerabilidade social e insegurança alimentar. Buscou-se compreender o cenário político – passado e contemporâneo – que produz a fome e os impactos das políticas públicas (ou ausência destas) na reprodução da desigualdade social.
As relações entre a insegurança alimentar e os sofrimentos ético-políticos abordados foram associados com o sistema de produção capitalista e com os projetos políticos adotados pelos governos durante a história do Brasil, que privilegiam a exploração da população para produção de riqueza em detrimento da emancipação da classe trabalhadora e do bem-estar daqueles que são explorados. Como resultado desse processo, tem-se um sofrimento psicológico ligado à exclusão social e à privação daquilo que é básico para a constituição do indivíduo: a alimentação.

Referências
COUTINHO, Eduardo G. A comunicação do oprimido: malandragem, marginalidade e contra-hegemonia. In: PAIVA, Raquel; SANTOS, Cristiano (Orgs.). Comunidade e contra- hegemonia: rotas de comunicação alternativa. Rio de Janeiro: Mauad, 2008. p. 61-74.

MELITO, Leandro. Arquitetura da destruição das políticas de combate à fome no Brasil. 2020. Disponível em: . Acesso em: 14 nov. 2022.

REDE BRASILEIRA DE PESQUISA EM SOBERANIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (PENSSAN). (São Paulo) (org.). Insegurança Alimentar e Covid-19 no Brasil: II VIGISAN: inquérito nacional sobre insegurança alimentar no contexto da pandemia da covid-19 no Brasil. São Paulo: Rede Penssan, 2022. 110 p. Disponível em: . Acesso em: 02 out. 2022.

SAWAIA, Bader Burihan. Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social. Psicologia & Sociedade, São Paulo, v. 21, n. 3, p. 364-372, dez. 2009.


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