04/11/2024 - 17:20 - 18:50 RC2.5 - Percursos antimanicomiais para o cuidado em liberdade |
49823 - CUIDADO EM LIBERDADE E POLÍTICA ANTIMANICOMIAL: AVANÇOS NA INTERFACE ENTRE SAÚDE MENTAL E JUSTIÇA A PARTIR DA RESOLUÇÃO CNJ Nº 487/2023. FERNANDA RODRIGUES DA GUIA - MINISTÉRIO DA SAÚDE, ROSEMARY CALAZANS CYPRIANO - SMS SÃO PEDRO DA ALDEIA RJ, RENATA NOGUEIRA ANTUM GOMES - SMS SÃO PEDRO DA ALDEIA RJ
Contextualização A “Política Antimanicomial do Judiciário”, como ficou conhecida a Resolução CNJ Nº 487, de 15 de fevereiro de 2023, atualiza os debates sobre as mudanças dos paradigmas jurídicos e assistenciais em relação às pessoas com sofrimento psíquico ou transtorno mental em conflito com a Lei e/ou privação de liberdade e submetidas ao cumprimento de medidas de segurança. Apresentamos no Seminário Internacional de Saúde Mental do CNJ, com o tema “Possibilidades para a efetivação da Política Antimanicomial na interface com o Poder Judiciário”, realizado em junho de 2023 no Tribunal de Justiça do Paraná um caso que envolve o acompanhamento de um jovem, com foco na organização da rede intersetorial local e na interface saúde e justiça, tendo como premissa que a complexidade de um caso diz muito sobre como o poder público está organizado para garantir Direitos e promover a oferta de políticas públicas. Antônio, munícipe de São Pedro da Aldeia RJ de 22 anos, era atendido na RAPS desde 2019, após uma breve institucionalização por medida socioeducativa. Em 2023 não se mantém de forma regular em seu tratamento e, a partir de uma intercorrência acaba sendo preso. O processo judicial foi resolvido em 80 dias entre fevereiro e maio de 2023, quando Antônio teve o alvará de soltura concedido e a construção de novo PTS foi necessária para estruturar as saídas estratégicas de convivência em liberdade.
Descrição da Experiência O “Encontro Saúde e Justiça da Rede de Atenção Psicossocial da CIR/BL", é uma iniciativa do Grupo Condutor da RAPS da Comissão Intergestores Regional da Baixada Litorânea do RJ, em parceria com o Ministério da Saúde/ Serviço de Articulação Interfederativa e Participativa (SEINP-RJ/SEMS-RJ). As três edições do Encontro foram sediadas no auditório do Ministério Público em Cabo Frio RJ. A organização adotou como premissa que a complexidade de um caso tem relação direta com como a rede pública está organizada para promover respostas. Neste processo, o respeito à trajetória de cada profissional e o lugar que ocupa na rede têm sido fundamentais na metodologia, criando um ambiente favorável ao compartilhamento de soluções práticas pela garantia de Direitos em consonância com a Reforma Psiquiátrica Brasileira.
No primeiro Encontro preponderou o formato expositivo e a apresentação de caso clínico e organização da RAPS da região. A partir do segundo encontro foi incorporado o formato com duas partes: um momento expositivo, seguido de roda de conversa sobre casos clínicos da região e/ou desinstitucionalização dos HCTP. Ao final de cada evento, os presentes definem coletivamente encaminhamentos para os próximos encontros. A metodologia do evento abarca a contribuição de profissionais do campo que não moram no RJ, mas que estão mobilizados nos debates por meio de videoconferência.
Objetivo e período de Realização O Encontro Saúde e Justiça da CIR-BL caracteriza-se como estratégia de articulação de redes e educação permanente e tem como objetivo promover o diálogo regional na interface saúde e justiça, com vistas a construir boas práticas a partir da Resolução CNJ nº 487/2023, bem como promover acesso à saúde por meio do cuidado em liberdade, e diminuir os danos decorrentes do cárcere e da internação em HCTP. Foram realizados 3 encontros desde outubro de 2023. Estão previstos mais 3 encontros em 2024.
Resultados Os encontros têm sido marcados pelas trocas de experiências sobre os impasses para o acompanhamento clínico e jurídico a partir da Res. CNJ no 487/2023, a desinstitucionalização dos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTPs) no RJ, a oferta de cuidado comunitário e territorial ancorado na Lei 10.216, com avanços na Política Antimanicomial. A discussão abarca questões que atravessam as três esferas de gestão nas bases sustentadas pela regionalização do cuidado. Para o poder público, evitar ações que impõem prejuízo aos indivíduos e coletivos, além de importante norte ético, significa reduzir o impacto gerado por novas internações involuntárias no orçamento público para ações de desinstitucionalização. Destacam-se ainda na região de saúde e no estado do Rio de Janeiro: 1) a perspectiva de acompanhar via grupo condutor da RAPS, a ocorrência de nova situação de conflito com a Lei relativas aos casos acompanhados após 1 ano de egressas de HCTP ou da prisão temporária. 2) a implantação de equipes EAP-Desinst estaduais, com coordenação e financiamento estadual e o desenvolvimento de projeto técnico antes mesmo do anúncio de portaria do Ministério da Saúde para sua habilitação.
Aprendizado e Análise Crítica A implicação dos atores sociais na busca por soluções práticas face ao caso apresentado teve como desdobramento a disposição dos envolvidos de colocar-se como aprendiz, considerando diferentes olhares, saberes e responsabilidades. Foi necessário fazer funcionar a “rede quente” instalada no município há algum tempo, por meio de atos que privilegiam o sujeito em sua subjetividade, em contraste com uma “rede fria” composta por ações apenas burocráticas. Uma expressão enunciada por uma das parceiras do Judiciário traz uma boa síntese sobre o sentido de rede quente: "a comarca ficou elétrica" a partir da convocação de uma rede de atores sociais implicados nessa arena pública em favor do cuidado em liberdade.
O avanço da Política Antimanicomial com cuidado em liberdade, ancorada na Lei 10.216 demanda orçamento do Poder Executivo e do Poder Judiciário para ampliar e estruturar a rede intersetorial local e regional. No SUS destaca-se a importância da qualificação de planos de ação da RAPS, incluindo a ampliação de Serviço Residencial Terapêutico (SRT) e Unidades de Acolhimento (UA) e no SUAS a ampliação de Moradia Inclusiva. A Resolução CNJ nº487 de 2023 é uma ferramenta fundamental e justifica ainda a criação do Encontro Saúde e Justiça da Comissão Intergestores Regional da Baixada Litorânea do estado do Rio de Janeiro.
Referências BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução Nº 487 de 15 de fevereiro de 2023. Institui a Política Antimanicomial do Poder Judiciário e estabelece procedimentos e diretrizes para implementar a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei n. 10.216/2001, no âmbito do processo penal e da execução das medidas de segurança. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/files/original2015232023022863fe60db44835.pdf. Acesso em: ago. 2023.
GOMES, Maria P.C et ali. Acesso às multiplicidades do cuidado como enfrentamento das barreiras em saúde mental: Histórias de R. In: GOMES, Maria P.C; MERHY, Émerson E. (org). Pesquisadores IN-MUNDO: um estudo da produção do acesso e barreira em saúde mental/ - Porto Alegre: Rede UNIDA, 2014, p. 59. Disponível em: https://editora.redeunida.org.br/wp-content/uploads/2021/08/Livro-Pesquisadores-IN-MUNDO-Um-estudo-da-producao-do-acesso-e-barreira-em-saude-mental.pdf. Acesso em: 31 ago. 2023.
Fonte(s) de financiamento: Não há.
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