Roda de Conversa

04/11/2024 - 17:20 - 18:50
RC2.4 - Acesso à saúde das pessoas idosas

49121 - AS VULNERABILIDADES DO IDOSO EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE: IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS DE SAÚDE QUE INTEGREM RAÇA, GÊNERO E IDADE PARA ALÉM DAS GRADES
IRENE CARDOSO SOUSA - FIOCRUZ-IAM, RAFAEL DA SILVEIRA MOREIRA - FIOCRUZ-IAM


Apresentação/Introdução
Houve um enorme crescimento da população encarcerada no Brasil nas últimas décadas, com um aumento de 707% desde 1990, quando havia menos de 90 mil pessoas em privação de liberdade (PPLs). Com 852.010 pessoas em 2023, o Brasil tem a terceira maior população prisional do mundo ​(SISDEPEN, 2024)​. Portanto, é um país que encarcera em massa, com a maioria dos presos sendo jovens ​(BORGES, 2019)​.
O Brasil possui 32 milhões de pessoas idosas, o que corresponde a 15,6% da sua população. Essa realidade provoca preocupações devido ao grande impacto nas políticas públicas e, principalmente, no papel do cuidado da família ​(TEIXEIRA, 2020)​. Quando um país passa por um acelerado processo de envelhecimento e ganho de longevidade, essa radical transição epidemiológica etária repercute em todos os segmentos, inclusive no ambiente prisional ​(MINAYO; CONSTANTINO, 2023)​.
Existem vários tipos de envelhecimentos, como fenômeno biopsicossocial, não é natural ou igual ficar velho em uma sociedade de classes. ​(BEAUVOIR, 2018) Os​ idosos negros, que correspondem a 76% da população idosa masculina do estado de Pernambuco, são marcados por desigualdades sociais e ausência de acesso à saúde ao longo de sua vida ​(SOARES; ARAÚJO, 2019)​. É necessário políticas de cuidados em saúde em articulação com a rede de saúde e de assistência social do território, principalmente para evitar a reincidência.

Objetivos
Identificar as vulnerabilidades da população idosa masculina em privação de liberdade, que demandam a implementação de políticas de saúde que integrem raça, gênero e idade, através da comunicação entre as Equipe de Atenção Básica Prisional e a rede de saúde do território, para continuidade do acesso aos serviços de saúde fora das prisões

Metodologia
Trata-se de um estudo transversal em que foram coletadas variáveis provenientes de fontes documentais secundárias. A pesquisa de campo compreendeu o período de maio a julho de 2023, após aprovação no Comitê de Ética da FIOCRUZ/IAM. A população do estudo abrangeu indivíduos na faixa etária de igual e mais de 60 anos, que estavam em privação de liberdade em Pernambuco (no nordeste do Brasil), durante o período de maio a julho de 2023. No total, foram 529 participantes, em 19 unidades prisionais (UP). Também foram incluídos como participantes de pesquisa os idosos em prisão domiciliar. Foram excluídos os idosos em cadeias, manicômios judiciários e presídios exclusivos para militares. Inicialmente, foram descritas as variáveis dos presídios, com o propósito de identificar as características contextuais nas quais os idosos em privação de liberdade se inseriam. Na sequência, foram descritas as frequências absolutas e relativas da variável dependente, segundo as variáveis epidemiológicas independentes. Essa descrição foi realizada juntamente com a análise de associação por meio do Teste do Qui-Quadrado de Pearson, considerando o nível de significância de 5%.

Resultados e Discussão
Em Pernambuco, o sistema prisional apresentou a razão de duas pessoas encarceradas para uma vaga. Esse estado inconstitucional de coisas dificulta o trabalho de reinserção do setor psicossocial e prejudica as condições para fornecer serviços de saúde a toda a população carcerária, pois não há possibilidade de adentrar em todos os espaços da prisão com dignidade.
O estudo apontou que 76,1% dos idosos em situação de prisão no estado de Pernambuco eram pessoas negras. 77,5% dos idosos não terminaram o ensino fundamental, incluindo aqueles que têm o ensino fundamental incompleto (50,7%) e aqueles que não são alfabetizados (26,8%).
No perfil epidemiológico resultou que 99,3% de toda população idosa masculina do sistema prisional de Pernambuco possuía Cartão SUS em 2023. 11,7% dos idosos apresentavam algum tipo de deficiência, sendo: 4,2% auditiva; 4,2% física; 2,0% visual e 1,2% intelectual. Além disso, os idosos com hipertensão representaram 61,0% e aqueles com diabetes 16,0%.
Os estudos de masculinidades negra foram os que mais se aproximaram da reflexão sobre as discriminações e opressões que atravessam o homem negro, bem como suas redes de cuidados. A seletividade que deu cor ao cárcere e permitiu visualizar um idoso negro com escolaridade baixa nas prisões ocorreu em momento anterior ao cometimento do crime.
As Equipes de Atenção Básica Prisional (EABP) precisam estar preparadas para oferecer saúde integral para construir a saída dos idosos – o seu retorno para a vida social –, que, apesar da desesperança, é o desejo de quem está em privação de liberdade. E essas expectativas não diferem para a pessoa idosa que demanda políticas públicas para acolher integralmente suas várias vulnerabilidades que se hiperbolizam no ambiente prisional e no seu retorno para a sociedade.

Conclusões/Considerações finais
A EABP forneceu dados de saúde para criar um perfil epidemiológico dos idosos em prisão em Pernambuco. A principal limitação foi o campo de residência não estar preenchido, o que demonstra que não há preocupação com o tratamento no território. O cuidado como responsabilidade do Estado demanda a interseccionalidade. É imprescindível a construção de políticas públicas que integrem a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas Privadas de Liberdade e a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, que deverão dialogar com a Política Nacional de Saúde do Homem e a Política Nacional de Atenção Integral da População Negra. Há necessidade de espaços exclusivos que preparem os idosos para o retorno à sociedade. Deve-se garantir que a pena seja cumprida em locais próximos de seus familiares e laços comunitários, a fim de permitir que esses vínculos continuem no retorno para casa. As equipes de saúde prisionais necessitam dialogar com a rede de saúde do local de moradia do idoso.

Referências
​​BEAUVOIR, S. DE. A velhice. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2018.
​BORGES, J. Encarceramento em massa. Feminismos Plurais ed. São Paulo: Pólen, 2019.
​MINAYO, M. C. DE S.; CONSTANTINO, P. Idosos privados de liberdade: “a dor deles dói mais”. Ciência & Saúde Coletiva, v. 28, n. 11, p. 3205–3214, 10 nov. 2023.
​SISDEPEN. Dados estatísticos do sistema penitenciário - julho a dezembro de 2023. Disponível em: . Acesso em: 21 abr. 2024.
​SOARES, T. A. S.; ARAÚJO, D. J. G. Homem negro, corporeidades e saúde: perspectivas históricas e sociológicas. Em: Diálogos contemporâneos sobre homens negros e masculinidades. São Paulo: Ciclo Contínuo Editorial, 2019. p. 163–196.
​TEIXEIRA, S. M. Trabalho social com família: a hegemonia da “Gestão do Risco Social”. Em: Família, Cuidado e Políticas Sociais. Editora Papel Social, 2020. v. 1p. 319–335.


Realização:



Patrocínio:



Apoio: