Roda de Conversa

04/11/2024 - 13:30 - 15:00
RC2.2 - Povos Indígenas, Quilombolas e Comunidades Tradicionais

50833 - POSSIBILIDADES E DESAFIOS DO USO TÓPICO DO FLUORETO PARA PREVENÇÃO DA CÁRIE DENTÁRIA EM POPULAÇÕES TRADICIONAIS E INDÍGENAS: UMA REVISÃO DA LITERATURA
HELENE SOARES MOURA - FSP - USP, EMILY SOUZA SILVA ALMEIDA - FSP - USP, RAMON GOMES ALVES - FSP - USP, PAULO FRAZÃO - FSP - USP


Apresentação/Introdução
Carie dentária não tratada é a condição crônica mais prevalente no mundo (1) e um importante marcador de vulnerabilidade social porque afeta desproporcionalmente populações tradicionais, indígenas, afro-descendentes (2), pessoas com deficiência, de baixa renda ou que vivem em áreas periféricas, remotas, em situação de rua, de exclusão e discriminação (3). Em geral, esses grupos populacionais estão submetidos a formas de opressão e dominação, de natureza étnica, cultural, política e econômica, que geram enormes dificuldades para o acesso aos meios de prevenção e tratamento da cárie dentária (4), entre os quais o uso de veículos de baixa concentração de fluoretos. Muitas populações que passaram a ter um baixo nível de cárie aos 12 anos de idade vivem em países que mantêm um uso sistêmico (água ou sal fluoretado) combinado com um uso tópico de uso de fluoreto (usualmente dentifrício ou enxaguatório) (5). Como essa associação de métodos de baixa concentração de fluoreto dificilmente alcança todos os territórios e populações de um país, uma opção é considerar a implementação de ações complementares que incluam o uso tópico de géis, espumas e vernizes fluoretados, a fim de assegurar a proteção da dentição dos segmentos sociais vulnerabilizados.

Objetivos
Produzir um balanço crítico da literatura científica sobre o uso tópico de géis, espumas e vernizes fluoretados (VF) em programas destinados à prevenção da cárie dentária em populações tradicionais e indígenas.

Metodologia
Foi realizada uma revisão narrativa de literatura com busca sistemática de artigos científicos nas bases de dados Biblioteca Virtual em Saúde, Embase (Excerpta Medica Database), PubMed e Web of Science. A pergunta norteadora tinha por foco os principais alcances e limitações relacionados ao uso desses veículos nesses grupos populacionais. Foram utilizadas chaves de busca compostas por descritores e outros termos livres relacionados às populações, como por exemplo “Population Groups”, “Minority Groups”, “Indigenous Peoples” e “Quilombola Communities”, e veículos fluoretados, como “Acidulated Phosphate Fluoride” e “Fluoride Varnish”. No total, foram encontrados 224 artigos relacionados a géis e/ou espumas F e 596 artigos para VF. Os dados das buscas foram exportados para o programa Rayyan, onde foram eliminados os artigos duplicados e realizada a etapa de rastreamento, com leitura dos títulos e resumos por dois avaliadores independentes, para identificação dos estudos que abordavam o uso dos veículos com populações nativas, tradicionais ou indígenas.

Resultados e Discussão
Do total, apenas 23 (2,8%) títulos abordando o uso do VF junto a populações indígenas estavam nos registros. Ressalta-se a ausência de estudos com populações tradicionais e estudos investigando os efeitos do gel/espuma F. Dos títulos, um não foi encontrado na íntegra. Os demais datavam de 2008 a 2023. 12 eram estudos experimentais, 5 revisões da literatura, 2 diretrizes de organizações profissionais, 2 estudos observacionais e 1 avaliação de programa. Para esta revisão qualitativa foram selecionados 8 estudos experimentais e 2 observacionais, todos com foco nos efeitos decorrentes do uso de VF sobre a cárie dentária. Os estudos incluídos centraram-se em intervenções com crianças e/ou adolescentes, de 6 meses (6-8) a 17 anos de idade (9,10). O VF se mostrou efetivo para prevenção/controle da cárie precoce na infância (CPI) quando utilizado em consultas de puericultura (11), quando parte de programas envolvendo mães e crianças desde a gestação (6-8), também compondo programas mais amplos com participação de pais, comunidade e formação de profissionais locais (12,13). Quanto mais precoce seu uso, melhor parece ser seu efeito preventivo, tanto em relação à idade (6-8) quanto à higidez das superfícies dentárias, em relação ao tecido com algum grau de desmineralização (13). A combinação do VF com outros produtos também demonstrou ser efetivo para prevenção/controle das lesões cariosas em dentes decíduos e permanentes (9,10,14). A escola foi reconhecida como um ambiente potencial para alcançar um grande número de crianças em idade escolar (15), mas destaca-se nos estudos a importância do envolvimento da comunidade local, como fundamental para adaptar os programas às necessidades específicas das crianças e até aumentar a adesão de participação (15).

Conclusões/Considerações finais
O VF se mostrou efetivo para prevenção, controle da progressão e até reversão de lesões cariosas, mas é importante ressaltar a pequena quantidade de estudos avaliando o uso deste veículo nas populações vulnerabilizadas aqui investigadas, e ausência de relatos utilizando gel ou espuma fluoretados. Diante dos estudos incluídos, parecem ter mais chance de êxito intervenções planejadas e lideradas em conjunto com a comunidade, que reconheçam a importância dos conhecimentos tradicionais de saúde praticados pelas famílias, também com treinamento de agentes locais. No entanto, destacaram-se desafios na implementação das estratégias como o afastamento geográfico de algumas comunidades, custos logísticos, aceitação/participação da comunidade nas intervenções, baixa frequência escolar em decorrência de razões familiares/sociais, até mesmo legislações locais que podem impedir a aplicação do veículo fluoretado por outras pessoas que não dentistas ou médicos.

Referências
1. PERES, MA et al., 2019. doi: 10.1016/S0140-6736(19)31146-8
2. JAMIESON, LM., 2021. doi: 10.1922/CDH_IADRJamiesonIntro01
3. MELO, KMM et al., 2020. doi.org/10.4322/2526-8910.ctoARF1877
4. FLEMING, E. et al., 2023. doi: 10.1111/cdoe.12822
5. O’MULLANE, DM. et al., 2016. doi: 10.1922/CDH_3707O’Mullane31
6. JAMIESON, LM et al., 2019. doi: 10.1001/jamanetworkopen.2019.0648
7. JAMIESON, LM et al., 2019. doi: 10.1001/jamanetworkopen.2019.15611
8. JU, X. et al., 2023. doi: 10.1177/23800844231191714
9. TADAKAMADLA, SK. et al., 2020. doi: 10.3390/ijerph17062114
10. LALLOO, R. et al., 2021. doi: 10.1371/journal.pone.0244927
11. HOLVE, S. 2008. doi: 10.1007/s10995-007-0294-0
12. SLADE, GD., et al., 2011. doi: 10.1111/j.1600-0528.2010.00561.x
13. DIVARIS, K. et al., 2013. doi: 10.1159/000344015
14. KROON, J. et al., 2019. doi: 10.1111/cdoe.12486
15. DIMITROPOULOS, Y. et al., 2020. doi: 10.1922/CDH_00005Dimitropoulos06

Fonte(s) de financiamento: Não houve financiamento


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