54444 - GESTÃO TRIPARTITE DO SUS FRAGILIZADA? REFLEXÕES A PARTIR DA ANÁLISE DE UM PROJETO PROADI-SUS NICANOR RODRIGUES DA SILVA PINTO - UNIFESP, SANDRA MARIA SPEDO - UNIFESP, MARILIA CRISTINA PRADO LOUVISON - FSP-USP, ANA LIGIA PASSOS MEIRA - FSP-USP, AYLENE BOUSQUAT - FSP-USP, ANA PAULA CHANCHARULO E MORAIS PEREIRA - UNEB, PAULO HENRIQUE DOS SANTOS MOTA - FSP-USP, OSWALDO YOSHIMI TANAKA - FSP-USP, MARCO AKERMAN - FSP-USP
Apresentação/Introdução O SUS foi instituído considerando a participação, em caráter complementar e/ou suplementar, do setor privado da saúde. As instituições filantrópicas são identificadas como estratégicas na complementaridade da assistência à saúde. No processo de regulamentação desse setor, em 2009, foi criado o Proadi-SUS beneficiando seis “hospitais de excelência” (HE), que seriam responsáveis pela implementação de projetos. Desde então, esse Programa tem sido cada vez mais utilizado como estratégia e opção dos gestores do SUS, das três esferas de governo, para viabilizar suas propostas de intervenção. Inicialmente, cabia à Secretaria Executiva do MS a responsabilidade pelo monitoramento, acompanhamento e avaliação dos projetos. Em 2011, foi instituído um Comitê Gestor do Proadi-SUS composto por representação de sete Secretarias do MS, ANVISA, ANS, CONASS e CONASEMS e coordenado pela Secretaria Executiva. Esse Comitê tinha entre suas atribuições a definição de temas e objetivos prioritários e a aprovação da carta consulta dos projetos apresentados. Em 2017, essa composição foi modificada, ficando restrita ao Ministério da Saúde, presidente do CONASS e presidente do CONASEMS, concorrendo de certa forma com a Comissão Intergestores Tripartite (CIT). A partir desse mesmo ano, além do MS, o Conass e o Conasems passaram a demandar e pactuar projetos desse Programa junto aos HE.
Objetivos Analisar a participação de atores político-institucionais da gestão tripartite do SUS e limites no processo de implementação e na sustentabilidade de um projeto Proadi-SUS
Metodologia Trata-se de um recorte analítico de uma pesquisa desenvolvida por meio da estratégia de estudo de caso, em sua variante de estudo de casos múltiplos. Essa pesquisa tinha o objetivo de identificar e avaliar influências do processo de intervenção do projeto PlanificaSUS na articulação entre a APS e a Atenção Ambulatorial Especializada. Os dados utilizados neste recorte foram entrevistas não estruturadas realizadas com atores estratégicos. Considerando que o projeto tinha abrangência nacional e, ainda, o objetivo de reorganizar a APS e a AAE, os atores político-institucionais escolhidos foram as três instituições que compõem a gestão tripartite do SUS e o HE que coordenava e executava o projeto. Também foram entrevistaram representantes dos COSEMS dos quatro estados que participaram do estudo. Contudo, apenas um deles abordou o tema em questão. A análise do material foi realizada tendo como referência a técnica da análise temática de conteúdo. O material transcrito foi analisado e agrupado em duas categorias analíticas: 1. Contexto e participação de atores institucionais no processo de implementação do projeto Proadi-SUS; e 2. Desafios na/da implementação de um projeto Proadi-SUS.
Resultados e Discussão Evidenciou-se diferenças significativas na participação dos atores político-institucionais da gestão tripartite do SUS nesse projeto. O CONASS identificou o Proadi-SUS como “uma janela de oportunidade” para ampliar a capilaridade de um projeto que já vinha desenvolvendo. Assim, assumiu papel central na construção, negociação e acompanhamento da implementação. Por sua vez, o CONASEMS, que apresentou algumas divergências em relação ao projeto, ficou praticamente ausente do processo. E a gestão do MS daquele período teve uma atuação pontual e/ou protocolar. Destacou-se a fragilidade da participação da gestão municipal do SUS, apesar de se tratar de um projeto que incidia diretamente na (re)organização da APS. Os principais desafios identificados na/da implementação do projeto foram: 1) o fato de se tratar de um projeto com prazos estabelecidos para início e término, sem qualquer garantia de sua continuidade; 2) a sustentação de eventuais mudanças promovidas pelo projeto tanto na organização dos serviços, quanto nos processos de trabalho, fica comprometida em decorrência de sua não institucionalização; 3) o fato do projeto ser coordenado e implementado por um parceiro privado agravaria a instabilidade na manutenção das ações implementadas, na medida em que essas instituições não têm atribuições legais na gestão do SUS, em qualquer das três esferas de governo; 4) a adoção do modelo “top-down” na implementação do projeto, caracterizado pela baixa participação de atores locais em sua elaboração e, ainda, desconsiderando histórias pregressas e contextos locorregionais, pode ter implicado em resistências, bem como comprometido sua sustentabilidade.
Conclusões/Considerações finais No projeto analisado, revelou-se um desequilíbrio entre a participação dos gestores que compõem a gestão tripartite do SUS. O protagonismo maior do demandante em relação aos demais entes federados podem fragilizar a gestão colegiada do SUS e, ainda, aumentar a fragmentação do sistema e a competição interfederativa. Acresça-se a isso, a entrada em cena de um novo ator do setor privado (mercado) que traria uma “bem-vinda” maior agilidade operacional. Com a execução do projeto privatizada para um HE, cujo interlocutor preferencial é o ente demandante, o espaço colegiado da gestão tripartite do SUS vai se fragilizando. Processos de mercantilização e empresariamento do SUS trazem lógicas gerenciais que nem sempre se coadunam com suas premissas. A opção do MS em utilizar o Proadi-SUS como uma importante estratégia para implementar programas e políticas prioritárias do SUS pode produzir repercussões ainda pouco vislumbradas e/ou debatidas.
Referências Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 936, de 27 de abril de 2011. Dispõe sobre as regras e critérios para apresentação, monitoramento, acompanhamento e avaliação de projetos do PROADI-SUS.
Tanaka OY, Akerman M, Louvison MCP, Bousquat A, Pinto NRS, Meira ALP, et al. Desafios para a implementação de processos de planificação em regiões de saúde. Rev Saude Publica. 2023; 57: Suppl 3:1s.
Santos JA. Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi-SUS): reconfiguração das relações público-privada e avanço da filantropia mercantil no setor da saúde. Tese doutorado. São Paulo: FSP-USP, 2021.
Morais IA, Rosa WVS, Aragão ES. Caracterização dos projetos do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde nos triênios de 2009-2011 e 2012-2014. Investigação Qualitativa em Saúde/Investigación Cualitativa en Salud, Lisboa, Portugal, v.2. Actas CIAQ, 2019.
|