04/11/2024 - 13:30 - 15:00 RC1.1 - Modelo de desenvolvimento, clima e emergências sanitárias |
53732 - CONSEQUÊNCIAS DO MODELO DE DESENVOLVIMENTO CONTEMPORÂNEO E OS TERRITÓRIOS TRADICIONAIS QUILOMBOLAS: UM RECORTE DE PARAÍBA E PERNAMBUCO RAFAELA DOMINGOS DA CUNHA - INSTITUTO AGGEU MAGALHÃES, RAFAELLA MIRANDA MACHADO - INSTITUTO AGGEU MAGALHÃES, EMERSON LOPES BARBOSA - UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE
Apresentação/Introdução A universalidade da política de saúde é um princípio fundamental que visa garantir que todos os membros da sociedade tenham acesso igualitário a serviços de saúde, sem discriminação ou exclusão. Isso implica não apenas na disponibilidade física, mas também na sua acessibilidade financeira e cultural, levando em consideração as necessidades específicas de diferentes grupos populacionais. O atual modelo de desenvolvimento frequentemente impõe desafios e consequências nos territórios quilombolas. Uma das principais implicações reside na exploração desenfreada de recursos naturais, localizados dentro ou em suas proximidades. A busca por lucro e crescimento econômico pode levar à degradação ambiental, poluição e perda de biodiversidade, afetando o modo de vida e os meios de subsistência dessas comunidades. Além disso, projetos de infraestrutura, como estradas, barragens e projetos de mineração, são implementados sem o consentimento ou consulta prévia das comunidades quilombolas, resultando em deslocamento forçado, fragmentação do território e perda de acesso a recursos naturais. Essas consequências afetam a saúde, exacerbando as desigualdades sociais e econômicas enfrentadas pelos quilombolas, que já lutam contra a marginalização, a falta de acesso a serviços básicos e a discriminação. Este cenário tem contribuído à perpetuação de um ciclo de injustiça e exclusão.
Objetivos Este relato de pesquisa, em territórios quilombolas dos Estados da Paraíba e de Pernambuco, tem como objetivo discutir as similitudes e particularidades das consequências provocadas pelo modelo de desenvolvimento econômico atual sobre a saúde e modos de vida destas populações.
Metodologia Este relato de pesquisa descreve as experiências de coleta de dados primários a partir da sistematização dos diários de campo das pesquisadoras envolvidas. Em Pernambuco, a pesquisa circunscreve um quilombo no município de Ipojuca, território onde se instalou o Complexo Industrial Portuário de Suape (CIPS), na década de 1970. O trabalho de campo compreende atividades como a aplicação de mapeamento participativo, entrevistas e círculos de cultura, entre os anos de 2021 e 2023. No território residem cerca de 277 famílias, com modos de vida relacionados às atividades da pesca artesanal e agricultura familiar. Na Paraíba, os quilombos da faixa litorânea do Estado compreendem cerca de 293 famílias. Os territórios quilombolas da região são envolvidos pelas atividades da construção civil e imobiliárias de luxo. O trabalho de campo compreende atividades que são desenvolvidas desde 2016, como entrevistas e acompanhamento das atividades sociais da comunidade. Os modos de vida desses territórios se fundamentaram, historicamente, pela pesca e agricultura familiar.
Resultados e Discussão O Quilombo Ilha de Mercês, localizado na porção sul do estado de Pernambuco, abriga a nascente do Rio Tatuoca, onde os comunitários realizam suas atividades produtivas e culturais. Desde a década de 1970, o território vem sendo fragmentado pelas atividades industriais e portuárias do CIPS, como vias de acesso ao porto e a Refinaria Abreu e Lima. As conflitualidades na região iniciam-se a partir da modificação do modo de produção capitalista hegemônico, partindo do enfraquecimento da produção de cana-de-açúcar em direção à industrialização e aproximação brusca com as convicções de uma vida urbana.
As diferentes formas de uso e ocupação do território tem representado consequências para a continuidade do modo de vida quilombola. Há restrições de acesso ao território tradicional, inúmeras tentativas de criminalização das lideranças comunitárias, além da constante ameaça da presença de grupos paramilitares. O Quilombo de Paratibe, quilombo urbano localizado na zona sul do Município de João Pessoa/Paraíba, abriga o Rio do Padre, no qual os indivíduos desenvolviam as atividades de pesca e também estava associado às atividades culturais/festivas da comunidade. A urbanização que aconteceu na zona Sul desde a década de 70 promoveu o desenvolvimento do saneamento básico da região, desde então o Rio do Padre passou a receber dejetos do esgoto. O Rio do Padre perdeu ao longo dos últimos 25 anos o seu caráter produtivo para a pesca e tornou-se inapropriado para o banho. Com isso, o Rio perdeu suas formas produtivas de uso, o que representou impacto negativo ao modo de vida da população local, com a perda de uma fonte de subsistência e também alimentar para as famílias, assim como a desconfiguração das atividades tradicionais festivas da comunidade.
Conclusões/Considerações finais A análise destaca a interseção entre o modelo de desenvolvimento, a proteção social e a saúde das comunidades quilombolas na Paraíba e em Pernambuco. Vê-se como as políticas econômicas, muitas vezes, ignoram ou marginalizam essas comunidades, resultando em impactos em seus modos de vida e saúde. A abordagem ressalta a importância do Estado no fornecimento de proteção social e na promoção da saúde, enfatizando a necessidade de políticas públicas sensíveis às especificidades culturais e socioeconômicas. Ainda, destaca as consequências do modelo de desenvolvimento atual, incluindo a degradação ambiental, a perda de acesso a recursos naturais e a fragmentação do território quilombola. As pesquisas destacam a urgência de políticas públicas inclusivas e medidas concretas para proteção dos direitos sociais das comunidades, reconhecendo sua contribuição para a diversidade cultural e ambiental do Brasil, e garantindo sua participação nos processos decisórios que envolvem seus territórios.
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