04/11/2024 - 13:30 - 15:00 RC1.1 - Modelo de desenvolvimento, clima e emergências sanitárias |
48732 - “SANEAMENTO POR QUE E PARA QUEM?” - MUDANÇAS NA POLÍTICA DE SANEAMENTO NO BRASIL LAURA MAGALHÃES ROCHA E SILVA - INSTITUTO RENÉ RACHOU/FIOCRUZ MINAS, PRISCILA NEVES-SILVA - INSTITUTO RENÉ RACHOU/FIOCRUZ MINAS, LEO HELLER - INSTITUTO RENÉ RACHOU/FIOCRUZ MINAS
Apresentação/Introdução A ausência de serviços de saneamento em quantidade e qualidade satisfatórias segue sendo um problema que atinge diversas regiões no Brasil. Os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, essenciais à promoção da saúde, foram reconhecidos pela ONU em 2010 como direitos humanos. Ademais, a ONU reafirmou a responsabilidade dos Estados pela promoção e proteção destes direitos. Os serviços de saneamento no Brasil têm sua história marcada pela relação com os campos políticos e econômicos, promovendo avanços e retrocessos ao longo dos anos. Mudanças globais como o fortalecimento do ideal neoliberal e da corrida privatista também são fatores que influenciam a política do setor. Em 2020, foi sancionada a Lei n. 14.026/2020 (Brasil, 2021), que atualizou o marco do saneamento no país, trazendo significativas mudanças, com destaque para a ampliação da participação privada no setor. A alteração foi palco de diferentes percepções e expectativas de impactos, sobretudo quando se aciona o referencial dos Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário (DHAES). Dada a importância de se ouvirem trabalhadores do setor, objetivou-se compreender a percepção de pessoas diretamente envolvidas com o saneamento básico de três cidades do estado de Minas Gerais, e de especialistas de abrangência nacional vinculados ao setor sobre a atualização na política de saneamento.
Objetivos Compreender a percepção de atores relacionados ao setor de saneamento básico, atuando em cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte ou no Colar Metropolitano (Santa Luzia-MG, Sete Lagoas-MG, Itabirito-MG), e em nível nacional, acerca das mudanças advindas da atualização do marco do saneamento no país.
Metodologia Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas (Minayo e Costa, 2019) e análise de conteúdo (Bardin 1977). Os participantes atuavam na área de saneamento em municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) e Colar Metropolitano. Santa Luzia tem serviços prestados pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA), Sete Lagoas possui SAAE, assim como Itabirito. Além disso, foram entrevistados especialistas de abrangência nacional. Salienta-se que as entrevistas não representam visões institucionais dos SAAEs, companhia estadual ou municípios, tendo como objetivo captar as percepções de pessoas que atuam diretamente no setor. Entende-se que a visão dos especialistas não representa uma visão nacional. Foram entrevistadas 7 pessoas, 3 especialistas e 4 pessoas que atuam diretamente com o saneamento nos municípios. Os especialistas são profissionais com experiência em gestão, lutas sindicais e discussão pública do setor, com atuação em organizações não governamentais de abrangência nacional. Escolheram-se intencionalmente pessoas com posicionamentos públicos de críticas à lei, de forma a se ter uma visão mais abrangente de suas possíveis distorções.
Resultados e Discussão Não houve consenso entre os entrevistados acerca das expectativas de mudanças após aprovação da nova lei. No entanto, foi consenso que a privatização é uma questão que deve ser discutida e contextualizada, inclusive seu impacto no aumento de tarifa. Os entrevistados entendem que os serviços são imprescindíveis para a promoção da saúde, bem-estar, diminuição de gastos públicos com saúde, proteção do meio ambiente e sustentabilidade dos meios urbanos. Também foi relatada a maior ausência dos serviços para as populações mais vulnerabilizadas, destacando a relação do saneamento com outros determinantes da saúde, como renda e moradia. Cinco dos sete entrevistados explicitam os serviços como direito. Nesta perspectiva, esses direitos devem ser garantidos independentemente da classe, endereço de moradia ou capacidade de pagamento, visto a importância dos serviços para a saúde e a dignidade humana. Foi expresso que a prestação ou delegação dos serviços deve ser realizada a partir da lente dos direitos humanos, sendo que, mesmo em uma perspectiva de privatização dos serviços, o que já ocorre no país após aprovação da lei, o direito de cada um deve ser respeitado. Para isso, o conteúdo normativo dos DHAES - acessibilidade econômica, acessibilidade física, disponibilidade, aceitabilidade, qualidade e segurança dos serviços – devem ser garantidos. O Estado tem o dever de promover e proteger todos os direitos humanos, com destaque para o acesso à água e ao esgotamento sanitário (UNGA, 2010). Além disso, devem articular caminhos para o alcance progressivo dos DHAES, incluindo grupos vulnerabilizados (UNHRC, 2010).
Conclusões/Considerações finais Os participantes apresentaram a importância dos serviços para o bem-estar da população e explicitaram a necessidade de ampliar as discussões sobre as implicações da privatização. O saneamento é um dos determinantes da saúde, e possui relação direta com as condições sociais e econômicas. Devido a essa interdisciplinaridade, é necessária uma política integrada que considere os diferentes aspectos que rodeiam o setor. Na busca pela promoção dos DHAES é preciso confrontar as desigualdades socioeconômicas existentes, de modo que as políticas garantam acesso de todos, incluindo pessoas em situação de vulnerabilidade. Para o alcance da universalização, é necessário se discutirem as tarifas e acessibilidade econômica, visto as perspectivas de privatizações e a essencialidade dos serviços para a promoção da saúde, além de considerar a lente dos direitos humanos, em detrimento de uma visão puramente econômica e lucrativa, que, com a busca de acúmulo de capital, pode agravar as desigualdades existentes.
Referências BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Ed. 70. 1977
BRASIL. Lei nº 14.026, de 15 de Julho de 2020. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Lei/L14026.htm.
MINAYO, M.C.S.; COSTA, A. P. Técnicas que fazem uso da Palavra, do Olhar e da Empatia: Pesquisa Qualitativa em Ação. Aveiro: Ludomedia, 2019
SILVA, L. M. R. Privatização, regionalização e incertezas: percepções sobre mudanças da política de saneamento no Brasil. - Belo Horizonte, 2023 XI, 112 f., il.; Dissertação (Mestrado) – Dissertação para Obtenção do Título de Mestre em Saúde Coletiva pelo Programa de Pós - Graduação em Saúde Coletiva do Instituto René Rachou.
United Nations General Assembly (UNGA). Human Right to Water and Sanitation. Geneva: UNGA; 2010. UN Document A/RES/64/292
United Nations Human Rights Council (UNHRC). Resolution on the human right to safe drinking water and sanitation. Resolution A/HRC/RES/15/9. Geneva 2010.
Fonte(s) de financiamento: As/Os autoras/es agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pelo apoio financeiro por meio da Chamada FAPEMIG 13/2023 - Participação coletiva em eventos de caráter técnico-científico no país.
|
|