51693 - TENDÊNCIAS NA ABORDAGEM DE TEMÁTICAS ÉTNICO-RACIAIS NOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA: ESTUDO SOBRE A PRODUÇÃO DISCENTE LEONARDO SIMÕES FREIRE - UFBA, MARCELO EDUARDO PFEIFFER CASTELLANOS - UFBA
Apresentação/Introdução As universidades públicas brasileiras passam por uma transformação devido à expansão de vagas e às ações afirmativas. A entrada de mais estudantes negros e indígenas é um avanço, produzindo contradições que confrontam a estrutura historicamente elitista das universidades. Apesar da resistência inicial à entrada desses estudantes, com argumentos meritocráticos, pesquisas apontam seu bom desempenho acadêmico. Entretanto há, ainda, uma série de desafios a serem enfrentados para que a universidade possa ser, de fato, inclusiva. A falta de atenção à saúde mental dos estudantes que sofrem com o racismo e a baixa quantidade de professores ou autores não-brancos entre as referências bibliográficas são alguns desses problemas. A produção científica no campo da Saúde Coletiva sobre questões ligadas a raça tem aumentado, mas ainda é baixa, e entendemos que a formação de pesquisadores deve se preocupar com esse tema. Acreditamos que a entrada de estudantes negros e indígenas nos programas de pós-graduação produz mudanças, ampliando a diversidade de temas das pesquisas, podendo fortalecer discussões acerca de questões étnico-raciais. Este estudo está inserido em um projeto mais amplo que busca avaliar os efeitos das ações afirmativas sobre o acesso, a permanência e a conclusão dos estudantes dos cursos de pós-graduação acadêmica em Saúde Coletiva do Brasil.
Objetivos Geral: analisar a tematização de questões étnico-raciais nas dissertações e teses produzidas de 2009 a 2022 em programas acadêmicos de pós-graduação em Saúde Coletiva. Específicos: quantificar os trabalhos relacionados a raça nas universidades selecionadas; identificar, dentre os trabalhos relacionados a raça, os temas que aparecem com maior frequência.
Metodologia Foi realizada uma análise documental. Através da Plataforma Sucupira, foram consultados todos os programas de Mestrado e Doutorado acadêmicos no campo da Saúde Coletiva. Dentre esses programas, selecionou-se um de cada região do país, com o título “Saúde Coletiva”, pelos critérios de relevância, segundo o conceito da CAPES, e antiguidade. Assim, foram selecionados os programas da UERJ, UFAC, UFBA(ISC), UFMT e UFSC. Foram incluídas no estudo todas as dissertações e teses defendidas de 2009 a 2022(UFMT desde 2011 e UFSC desde 2010), disponíveis nos repositórios institucionais das universidades dos PPG selecionados. A escolha do período foi feita a partir da disponibilidade das publicações nos repositórios das universidades. Fizemos uma primeira seleção, a partir de seus títulos, em relação à presença ou ausência de palavras que indicam a temática relacionada a raça (p. ex. negro, indígena, quilombo) ou a desigualdades (p.ex. determinantes sociais, discriminação). Após a primeira seleção, foram lidos os resumos desses trabalhos, selecionando aqueles que faziam menção à raça ou questões relacionadas. Entre os trabalhos selecionados foi feita uma análise categorial dos temas abordados.
Resultados e Discussão Foram incluídos 2.152 trabalhos (UERJ: 753, UFAC: 86, UFBA (ISC): 808, UFSC: 334, UFMT: 171), entre os quais identificou-se 86 trabalhos relacionados à temática racial (UERJ: 17 - 2,3%, UFAC: 3 - 3,5%, UFBA: 35 - 4,3%, UFSC: 18 - 5,4%, UFMT: 13 - 7,6%). Analisando os dados, percebemos que em 2009 e 2010 houve um trabalho abordando a questão racial em cada ano, representando 0,8% do total de trabalhos defendidos. Desde 2019 houve pelo menos 8 trabalhos sobre raça por ano, representando pelo menos 4,5% dos trabalhos, chegando a 13 trabalhos sobre raça em 2022, representando 8,2% dos trabalhos. Entre os programas analisados, há diferenças entre os grupos estudados nos trabalhos: na UFAC e na UFMT há um predomínio de trabalhos que falam de populações indígenas, enquanto na UERJ e na UFBA predominam trabalhos sobre a população negra. Na UFSC há diversos trabalhos que falam sobre desigualdades, adotando a raça como um dos critérios de análise. Em relação aos temas, há alguns que se destacam, como políticas/sistema de saúde, racismo/violência estatal, doenças, práticas de saúde tradicionais, lutas/movimentos sociais e interseccionalidade. Esse levantamento indica um aumento significativo na produção de trabalhos que abordam a temática racial no período analisado. Há, entretanto, que se destacar que a quantidade ainda é baixa, revelando uma das dimensões do racismo na universidade. Uma série de fatores pode contribuir para o aumento da produção relacionada às temáticas étnico-raciais, como a presença de docentes que se disponham a orientar tais pesquisas, a existência de grupos de pesquisa sobre o tema, o financiamento e disponibilidade de bolsas, além da política de ações afirmativas, que aumenta a presença de estudantes negros e indígenas nos programas de pós-graduação.
Conclusões/Considerações finais As iniquidades em saúde produzidas pelo racismo tornam fundamental que o campo da Saúde Coletiva se debruce sobre a questão étnico-racial. As pesquisas na área podem contribuir com o combate ao racismo, embasando a construção de políticas públicas e práticas em saúde equitativas. Podem, ainda, ampliar a inclusão da saúde negra e indígena nos currículos durante a formação dos profissionais de saúde. Assim, devemos pensar sobre como os programas de pós-graduação, formadores de pesquisadores e docentes, contribuem, ou não, com a ampliação desse campo. Esta pesquisa aponta que apesar de ainda ser baixo, o número de pesquisas sobre raça/etnia tem aumentado. Dessa forma, é importante seguir investigando os fatores que podem contribuir com esse aumento, como a ampliação das ações afirmativas, tanto na pós-graduação como nos concursos para docentes, e o financiamento de pesquisas com recorte sobre raça/etnia.
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