52836 - VIVÊNCIAS DE PRÁTICAS EDUCATIVAS NO INTERNATO MÉDICO EM ATENÇÃO BÁSICA E A CONSTRUÇÃO DE NOVOS OLHARES PARA O CUIDADO MÉDICO NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE CRISTINA FERNANDES CAMILLIO - UFF, MONIQUE DE OLIVEIRA E SILVA - UFF, ARIANA DE OLIVEIRA TAVARES - UFF, ALUÍSIO GOMES DA SILVA JUNIOR - UFF
Contextualização O Observatório da Integração Ensino-Serviços de Saúde do Estado do Rio de Janeiro (OIESS-RJ) é um projeto de extensão composto por docentes e técnicos-administrativos do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal Fluminense (UFF), graduandos e pós-graduandos de cursos da saúde desta Universidade. Desde janeiro de 2021 tem atuado em territórios da Estratégia de Saúde da Família (ESF) de Niterói vinculados ao Internato Médico Obrigatório em Atenção Básica da UFF (IOAB-UFF). Estruturado em eixos que mobilizam reflexões e análises sobre formação, educação, gestão e trabalho em saúde, o OIESS-RJ busca articulações intersetoriais, multiprofissionais e com sujeitos coletivos e grupos comunitários que permitam o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) em território fluminense e, sobremaneira, a universalização do direito à saúde. Diante disso, esse projeto extensionista promove o desenvolvimento de análise de situação de saúde com os internos de medicina nos territórios da ESF. Essa análise direciona o planejamento e execução de práticas educativas, cuja concepção perpassa os princípios da educação popular e que pretendem ressignificar o encontro do futuro profissional médico com os usuários atendidos na ESF para a construção de projetos terapêuticos que dialoguem com os projetos de vida e de felicidade desses usuários.
Descrição da Experiência Divididos em grupos de 4 a 6 internos por unidade da ESF de Niterói, de outubro a dezembro de 2023, eles acompanharam atividades privativas do médico na unidade e participaram de outras atividades que compõem a atuação médica na Atenção Básica do SUS. O OIESS-RJ contribuiu com a formação dos internos ao promover análise de situação de saúde e reconhecimento de dispositivos e sujeitos coletivos presentes nos territórios da ESF que deveriam orientar a realização de práticas educativas no último mês do internato. Na elaboração das práticas educativas, realizaram-se discussões entre internos, membros do projeto de extensão, profissionais da ESF e parceiros no território, para definição de temas e públicos prioritários, de locais que fossem pontos de encontro, de escuta e de diálogo entre profissionais da ESF e usuários e metodologias orientadas pelos princípios da educação popular. Em dezembro, ocorreram 4 atividades, a saber: saúde ocular de adolescentes, incluindo seus pais e/ou responsáveis, incentivo ao cuidado adequado da Hipertensão (HAS) e Diabetes (DM) com adultos e idosos, saúde do homem com trabalhadores de obras e saúde no “meu bairro” com estudantes da Educação de Jovens e Adultos. Reflexões das vivências dessas práticas e sua relação com a atuação médica na Atenção Básica foram tecidas pelos internos como atividade final do OIESS-RJ.
Objetivo e período de Realização Este relato tem por objetivo apresentar reflexões sobre os olhares produzidos por internos de medicina da UFF sobre a atuação médica na ESF a partir de suas vivências em práticas educativas planejadas e desenvolvidas em territórios da Atenção Básica (AB) do SUS na cidade de Niterói, Rio de Janeiro, no período de outubro a dezembro de 2023.
Resultados Destacaram-se na percepção dos estudantes após a prática educativa, ela como: 1) estratégia para o acesso de primeiro contato na AB. Relatos daqueles que atuaram na Saúde do Homem e Saúde no “meu bairro” revelaram que ao abordar um público não frequente na unidade ou não contemplado por ações educativas, respectivamente, a prática deles foi porta de entrada e acesso ao serviço; 2) espaço de aprendizagem sobre si e com o outro. O reconhecimento, dos grupos de Saúde Ocular e Saúde no “meu bairro”, da potencialidade dos usuários agirem sobre suas condições de saúde/doença e, do grupo sobre HAS e DM, de compreender o trabalho multiprofissional como agente de superação de obstáculos; 3) atividade de outros profissionais ou de ninguém. Um relato estudantil revelou que o OIESS-RJ retirou os internos do consultório e prejudicou sua experiência na AB e outros relatos reconheceram a educação em saúde como alheia à cultura da unidade de saúde e; 4) prática inerente a AB e campo de incertezas. Relatos elencaram que a prática educativa concatena os ensinamentos da atuação médica na AB, mas também revela barreiras que questionam a supremacia da ciência e da medicina para o cuidado em saúde.
Aprendizado e Análise Crítica A educação em saúde, apesar de componente do processo de trabalho na Atenção Básica (1), persiste entre médicos e profissionais de saúde uma visão mecanicista da prática médica, promotora da alienação deste profissional, de distorções do cuidado e de formas autoritárias nas relações de poder entre médicos e usuários (2). A proposição das práticas educativas nesse contexto encontrou resistência dos internos e não superou uma concepção hegemônica de que a "falta de saúde" é um problema solucionável pela transmissão de informações técnico-científicas aos sujeitos, produzindo uma perspetiva informativa e hierárquica (3), contrária aos princípios da educação popular (4). Contudo, percebeu-se um arco de aprendizado durante as atividades, que para a maioria deles conclui com o entendimento da importância desse tipo de prática na AB. A vivência da prática educativa durante o IOAB impeliu os estudantes a deixarem de lado a visão biologicista da medicina e os convidou a olhar para o sujeito sob a ótica da integralidade. Dentro de internatos realizados predominantemente dentro do hospital e em ambulatórios, o OIESS-RJ oportunizou aos estudantes a problematização de sua prática profissional. O encontro com o usuário em seu território, enquanto ser social, pode produzir mudanças na percepção dos estudantes e contagiá-los para um agir médico orientado pelos princípios do SUS.
Referências (1) Fittipaldi ALM, O’Dwyer G, Henriques P. Educação em saúde na atenção primária: as abordagens e estratégias contempladas nas políticas públicas de saúde. Interface (Botucatu). 2021; 25: e200806. Doi: https://doi.org/10.1590/interface.200806
(2) CARDOSO, F. M.; CAMPOS, G. W. DE S. Aprendendo a clínica do sofrimento social: narrativas do internato na Atenção Primária à Saúde. Ciencia & saude coletiva, v. 25, n. 4, p. 1251–1260, 2020.
(3) MEYER, D. E. E. et al. “Você aprende. A gente ensina?”: interrogando relações entre educação e saúde desde a perspectiva da vulnerabilidade. Cadernos de saude publica, v. 22, n. 6, p. 1335–1342, 2006.
(4) Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.761, de 19 de Novembro de 2013. Institui a Política Nacional de Educação Popular em Saúde no âmbito do SUS (PNEPS-SUS). Brasília: Ministério da Saúde; 2013.
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