50509 - INTERVENÇÃO EDUCATIVA COM TRABALHADORES DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: EFEITOS NO CUIDADO DE CRIANÇAS MENORES DE DOIS ANOS FRANCENILDE SILVA DE SOUSA - UFMA, ELISA MIRANDA COSTA - UFAL, ISABELLE AGUIAR PRADO - UFMA, ROSÂNGELA FERNANDES LUCENA BATISTA - UFMA, ZENI CARVALHO LAMY - UFMA, PIA RIGGIROZZI - UNIVERSITY OF SOUTHAMPTON, ANDREW AMOS CHANNON - UNIVERSITY OF SOUTHAMPTON
Apresentação/Introdução Embora alguns países já tenham atingido a meta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para a redução da mortalidade infantil, muitos outros, especialmente os de média e baixa renda, permanecem com alta mortalidade infantil (Leal et al., 2018). Evidências apontam que a maioria dos óbitos infantis poderiam ser evitados com sistemas de saúde universais e centrados numa Atenção Primária à Saúde (APS) resolutiva (Melo e Lima, 2018).
Portanto, intervenções educativas que promovam reflexão de trabalhadores sobre suas ações na comunidade têm sido ferramentas efetivas para melhorar o desempenho de indicadores de saúde em ambientes de alta vulnerabilidade socioeconômica. Assim, é possível que intervenções com Agentes Comunitários de Saúde (ACS) possam causar efeitos positivos à saúde das crianças, em especial, quando direcionadas aos primeiros mil dias, da gestação aos dois anos, considerado um período crucial do desenvolvimento (França et al., 2023).
No Brasil, a maioria dos óbitos infantis concentra-se nas áreas mais pobres das regiões Norte e Nordeste (Leal et al., 2018). Todavia, não identificamos evidências, baseadas em ensaios comunitários, sobre os efeitos de intervenções educativas, direcionadas aos ACS, abordando os direitos de mulheres e crianças durante os primeiros mil dias de vida.
Objetivos Analisar se uma intervenção educativa abordando os direitos em saúde nos primeiros mil dias de vida, destinada a trabalhadores da APS, tem efeitos sobre indicadores relativos à atenção à saúde de crianças, por meio de uma Série Temporal Interrompida Controlada (STIC).
Metodologia Este é um ensaio comunitário não randomizado de uma STIC cujas unidades de análise foram dois municípios maranhenses, Alcântara (intervenção) e Guimarães (controle). A população foi composta por 65 ACS em Alcântara e 40 em Guimarães. A intervenção durou oito meses.
O fator de interrupção da série temporal foi o início da intervenção educativa (maio/2022). A variável foi, portanto, dicotomizada em antes (de janeiro/2014 a abril/2022) e após (de maio/2022 a dezembro/2023) o início da intervenção. Os desfechos foram quatro indicadores relativos às crianças: 1. Nº de visitas domiciliares realizadas pelo trabalhador para acompanhamento do recém-nascido; 2. Nº de crianças em aleitamento materno exclusivo (AME) até os seis meses de vida; 3. Nº de crianças em aleitamento materno complementado (AMC) até os dois anos de vida; e 4. Nº de crianças de até dois anos de idade com a vacinação em dia.
Os dados foram coletados do Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SIS-AB). No software R ambientado no RStudio, foram realizadas análises de STIC por meio do Modelo Autorregressivo, Integrado e de Médias Móveis (α = 5%). Todos os aspectos éticos foram respeitados (parecer nº 3.077.846).
Resultados e Discussão Em Alcântara, a intervenção foi associada ao aumento significante no número de crianças de até dois anos de idade em AMC (Xreg=10,6; IC95%: 5,01-16,2; p<0,001) e com vacinação em dia (Xreg=30,3; IC95%: 8,6-52,0, p=0,006), mas não impactou o número de crianças em AME e nem as visitas domiciliares por ACS. Em Guimarães, embora não tenham sido significativos, todos os indicadores estudados apresentaram coeficientes negativos, o que sugere uma redução das ações no período analisado.
Embora a intervenção tenha impactado de modo significativo no aumento do número de crianças em AMC até os dois anos de idade, não afetou o AME nos primeiros seis meses. Isso evidencia a complexidade do processo de determinação social e cultural associada às práticas de nutrição infantil. Orientações acerca do aleitamento materno devem abranger toda a rede de apoio das mulheres. Além disso, aspectos estruturais da sociedade, como as relações de trabalho, devem ser organizados de modo a favorecer a amamentação (Hvatum; Glavin, 2017; Tomori, 2022).
Até os dois anos de idade, as crianças devem ter tomado as vacinas contra a Bacilo Calmette-Guériin (BCG), hepatite B, poliomielite 1, 2 e 3, rotavírus humano, penta, pneumocócica, meningocócica C, influenza, febre amarela, sarampo, caxumba e rubéola. É importante, ainda, que as vacinas sejam tomadas no prazo recomendado, pois, assim, garantem a redução da transmissibilidade de inúmeras doenças, o que impacta no crescimento e desenvolvimento das crianças (Fantinato, 2023). No entanto, as coberturas vacinais, no Brasil, caíram nas últimas décadas, de modo que os ACS, que possuem vínculos nas comunidades, são atores sociais chave no processo de mobilização contra os movimentos antivacina e na superação das barreiras de acesso aos imunobiológicos.
Conclusões/Considerações finais Uma intervenção educativa de baixo custo, utilizando tecnologias leves, direcionada a ACS e realizada em um município com graves problemas socioeconômicos e com violação de direitos fundamentais, como o de saúde, teve impacto positivo em indicadores de atenção à saúde de crianças de até dois anos de vida que viviam em condições desfavoráveis de vida. Isso evidencia que os trabalhadores da APS que atuam nas comunidades são potentes agentes de transformação social, quando comprometidos com a garantia de direitos à saúde.
Referências 1. LEAL, Maria do Carmo, et al. Saúde reprodutiva, materna, neonatal e infantil nos 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Ciência & Saúde Coletiva, v. 23, n. 6, p. 1915-1928. 2018.
2. FRANÇA, Camila de Jesus, et al. Characteristics of the community health agent’s work in the COVID-19 pandemic in municipalities of Northeastern Brazil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 28, n. 5; p. 1399–1412. 2023.
3. FANTINATO, Francieli Fontana Sutile Tardetti, et al. Factors associated with yellow fever vaccine failure: A systematic literature review. Vaccine, vol. 41, no. 13, 2023, pp. 2155-2169.
4. HVATUM, Ingjerd; GLAVIN, Kari. Mothers' experience of not breastfeeding in a breastfeeding culture. Journal of clinical nursing, vol. 26, no. 19-20, 2017, pp. 3144-3155.
5. TOMORI, Cecília. Overcoming barriers to breastfeeding. Best practice & research. Clinical obstetrics & gynaecology, vol. 83, 2022, pp. 60-71.
Fonte(s) de financiamento: Agradecemos o apoio financeiro do Medical Research Council (MRC) [número de concessão MR/R022933/1, Reino Unido], da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento do Maranhão Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) [Chamada FAPEMA nº009 / 2018-COOPI-00710/18, concessão BEPP-01803/21], do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) [processos 306592/2018-5, 314939/2020-2 e 308917/2021-9] e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) [código de financiamento 001].
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