Comunicação Coordenada

05/11/2024 - 13:30 - 15:00
CC7.3 - Comunicação e Informação: elementos fundamentais para a garantia do direito à saúde

51483 - INTERSEÇÕES ENTRE EXTREMISMO E SAÚDE NO TELEGRAM: A CONVERSAÇÃO SOBRE VACINA E DENGUE NA PLATAFORMA DE TROCA DE MENSAGENS EM 2024
GABRIEL HERKENHOFF - UFES, ALLAN CANCIAN - UFES, FABIO MALINI - UFES, ATHUS ASSUNÇÃO CAVALINI - UFES


Apresentação/Introdução
Durante a pandemia do coronavírus pôde-se acompanhar, em diferentes partes do mundo, a associação entre visões políticas conservadoras e reacionárias e o negacionismo científico, através de um processo de disseminação de desinformação nas plataformas de redes sociais (OPAS, 2020). Nessa conjuntura, os aplicativos de troca de mensagens têm se mostrado um ambiente propício para tal articulação, especialmente o Telegram (Cavalini et al., 2023).

Este trabalho tem como hipótese de investigação a existência de uma convergência mais específica: aquela entre extremismo político e estímulo à recusa vacinal. Para averiguar essa convergência, foram coletadas as mensagens de 2041 canais e grupos do Telegram ligados ao extremismo político entre janeiro e abril de 2024.

A análise realizada nesta investigação aborda tanto os tipos de canais e grupos que encaminharam mensagens sobre o tópico “vacina” quanto os tipos de conteúdo publicados em tais espaços. Além de verificar a presença de desinformação no Telegram, nosso propósito é discutir como o processo de plataformização da informação sobre saúde (Dijk; Poell; Waal, 2018) é atravessado pelas novas estratégias do extremismo político.

Objetivos
O objetivo geral é analisar a visão sobre vacinas nos grupos associados ao conservadorismo e ao reacionarismo político no Telegram de janeiro a abril de 2024.

Os objetivos específicos são:
a) mapear os canais com melhores conexões (medido pelo pagerank) que publicaram conteúdos sobre vacina;
b) observar as alterações e continuidades dos grupos de atores e narrativas durante os quatro primeiros meses de 2024;
d) verificar a presença e o alcance de conteúdo desinformativo sobre os temas analisados.

Metodologia
A metodologia adotada para a realização deste trabalho foi a realização de uma pesquisa descritivo-exploratória, com recurso a uma abordagem que mescla dados quantitativos e análises qualitativas. Dadas as características de nosso objeto e os propósitos da investigação, aplicamos um método cruzado que mescla a Análise de Redes Sociais (Venturini; Munk; Jacomy, 2018) com a Análise do Discurso Digital (Paveau, 2018). Com isso, buscamos apresentar e analisar redes complexas em duas vias: através das interações estabelecidas entre canais ou grupos do Telegram; e por meio da observação das redes semânticas constituídas pelas publicações em tal plataforma.

Para tanto, foram realizados três procedimentos:

1) seleção de canais e grupos para iniciar a expansão da base através do método “snowball”, que implica partir da relação que o grupo de controle estabelece com outros canais e grupos do Telegram;

b) processamento dos dados para delinear as relações (1) entre perfis que encaminharam conteúdos sobre os termos e (2) entre os termos utilizados nas publicações;

c) visualização de redes complexas para auxiliar na análise de atores e na análise da semântica ligada à coleta realizada na plataforma.

Resultados e Discussão
A coleta de mensagens dos grupos e canais no Telegram revelou uma complexa e multifacetada rede de disseminação de desinformação. Tendo como ponto de partida a lista de 53 canais e grupos no Telegram bloqueados pelo STF por associação às manifestações de 8 de janeiro em Brasília, chegamos a um total de 2041 canais e grupos associados ao extremismo político, destes, 1042 são em língua portuguesa.

Para dimensionar a conversação vacinal, coletamos as mensagens em português de todos os 1042 canais, o que nos permitiu notar que as questões relativas a vacina representavam 10,44% das mensagens em janeiro, 16,78% em fevereiro, 22,37% em março e 13,38% em abril. Essa dinâmica de subida e queda do interesse coincide com a intensificação das discussões sobre a imunização contra a dengue no período.

Do ponto de vista do conteúdo das mensagens, foi possível notar que em todos os meses as mensagens sobre vacinas eram predominantemente ligadas à desinformação, associadas a 5 tipos de narrativas: 1) teorias conspiratórias acerca da dominação de uma elite global; 2) alegações de especialistas sobre riscos das vacinas; 3) estudos científicos sobre problemas das novas tecnologias vacinais; 4) o problema da obrigatoriedade da vacinação infantil; 5) descrição de casos de efeitos colaterais das vacinas.

Esses tipos de mensagens foram compartilhadas por diferentes categorias de canais e grupos em língua portuguesa que compõem a base de coleta no Telegram. A partir de uma análise das descrições adotadas por esses atores e das mensagens veiculadas, chegamos à seguinte categorização: 1) conspiracionistas (260); 2) mídia partidarizada (84); 3) especialistas de saúde (34); 4) agitadores antivacina (54); 5) religiosos (71); 6) extremistas políticos (250); 7) deplataformizados (237); 8) outros (53).

Conclusões/Considerações finais
Ao analisarmos os atores e mensagens de grupos extremistas no Telegram, pudemos notar a presença da predominância de mensagens que estimulam a recusa vacinal.

Outro ponto importante é a forte presença de canais internacionais (830) na rede, que compõem cerca de 48% da base geral. No que diz respeito aos canais em português, é muito relevante o fato de que os grupos conspiracionistas e ligados ao extremismo político são quase 50% da rede. Os canais que se identificam especificamente como antivacina são apenas 5,2% e os especialistas de saúde que estimulam a hesitação vacinal e tratamentos alternativos são aproximadamente 3,25%. Embora proporcionalmente menores, não é desprezível o fato de que somados eles formam cerca de 8,5% da rede.

O caráter multifacetado, internacional e ideologizado dessa rede antivacina merece atenção das instituições e gestores que se ocupam das políticas de saúde e mostra as dificuldades colocadas para romper com o ciclo de disseminação de desinformação vacinal.

Referências
CAVALINI, A.; MALINI, F.; GOVEIA, F.; COMARELA, G. Politics and disinformation: Analyzing the use of Telegram's information disorder network in Brazil for political mobilization. First Monday, Chicago, v. 28, n. 5, maio 2023.

GOLDENBERG, M. Vaccine Hesitancy: Public Trust, Expertise and the War on Science. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 2021.

OPAS. Entenda a infodemia e a desinformação na luta contra a COVID-19. Kit de ferramentas de transformação digital. Ferramentas de conhecimento; 9. 2020 Disponível em: https://iris.paho.org/handle/10665.2/52054. Acessado em: 28 maio 2024.

PAVEAU, M. A. L’analyse du discours numérique – dictionnaire des formes et des pratiques. Paris: Hermann, 2017.

VAN DIJCK, J.; POELL, T.; WAAL, M. de. The Platform Society: Public values in a connective world. New York: Oxford University Press, 2018.

Fonte(s) de financiamento: ICEPI/SESA-ES


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