52500 - CANCELAMENTO UNILATERAL DE PLANOS DE SAÚDE: PRÁTICAS ABUSIVAS E OMISSÃO REGULATÓRIA NO PERÍODO RECENTE (2013-2023) LUCAS SALVADOR ANDRIETTA - IDEC, WYLLIAM ALVES - IDEC, MARINA PAULLELLI - IDEC, MARINA DE ALMEIDA MAGALHÃES - IDEC
Apresentação/Introdução O mercado de planos e seguros de saúde privados no Brasil é constituído por uma grande e heterogênea variedade de contratos, modalidades, diferenciais de cobertura e qualidade da rede credenciada, entre outras características. Uma das clivagens mais importantes diz respeito ao duplo padrão regulatório que se estabelece entre planos individuais e planos coletivos. Lacunas regulatórias não foram equacionadas pela Lei 9.656/1998, suas alterações, nem endereçadas por normativas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Esta situação abre brechas que estimulam práticas sistemáticas e abusivas por parte de empresas de planos de saúde, especialmente a aplicação de reajustes excessivos e a rescisão unilateral de contratos, de forma injustificada e sem transparência. A soma de práticas abusivas das empresas e da omissão do poder público tem afetado dezenas de milhares de pessoas, provocando sofrimento e agravando dramas pessoais, incluindo pacientes em tratamento, pessoas idosas, crianças atípicas, entre outras situações que têm ganhado grande repercussão midiática.
Os efeitos do cancelamento unilateral de contratos são difíceis de mensurar, mas a sua gravidade pode ser aferida pela grande quantidade de reclamações e denúncias registradas pela própria ANS e por órgãos de proteção ao consumidor. Além disso, as práticas das empresas dão causa a grande volume de ações judiciais.
Objetivos Descrever e mensurar a prática da rescisão unilateral imotivada de contratos de planos de saúde no Brasil entre 2013 e 2023, de maneira qualificada, considerando sua magnitude, alcance e efeitos, levando em conta aspectos relativos às empresas, modalidades de contratação e características de consumidores.
Metodologia O trabalho adota metodologia descritiva mista, mobilizando a análise documental e jurídica para a definição das rescisões enquanto prática abusiva e combinando múltiplas fontes de dados para mensuração do fenômeno. Notadamente, o trabalho explora os bancos de dados públicas da ANS sobre beneficiários Ativos e Inativos, para análise da dinâmica e rotatividade de contratos, incluindo diferentes motivos de cancelamento e outras variáveis. Posteriormente, o trabalho agrega e sintetiza dados sobre reclamações e decisões judiciais envolvendo o tema, com o objetivo de aferir o grau de subnotificação da problemática abordada.
Resultados e Discussão Os resultados apontam que o marco regulatório atual já permite a qualificação dos cancelamentos unilaterais de contrato como prática abusiva, sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor (CDC), mas que a existência de graves lacunas regulatórias mantém as pessoas contratantes sob alto grau de insegurança jurídica, na medida em que estimula as empresas a manterem sistematicamente o encerramento de contratos considerados indesejáveis segundo critérios de sinistralidade não transparentes. A mensuração do fenômeno é prejudicada por inconsistências e dificuldades de tratamento dos dados divulgados pela ANS.
A análise de múltiplas fontes permite concluir que o mercado de planos de saúde tem observado alta rotatividade, embora pouca variação no número total de beneficiários.
Dados secundários de reclamações e judicialização apontam para a relevância do fenômeno e uma tendência a decisões judiciais favoráveis ao consumidor.
Conclusões/Considerações finais Os resultados indicam que o cancelamento de contratos é uma prática sistemática, não ocasional, o que torna ainda mais graves os relatos e registros de falta de notificação prévia, falta de transparência sobre critérios e justificativas e, por vezes, desconhecimento de cláusulas contratuais pelo consumidor. Declarações recentes das empresas confirmam que a prática está associada a critérios ligados à sinistralidade, evidenciando que contratos que geram maiores despesas assistenciais são objeto preferencial de cancelamento, portanto afetando desigualmente as pessoas que necessitam de assistência médica em maior quantidade ou intensidade. A situação confirma a hipótese de que o cancelamento unilateral é uma prática consolidada e que se vê justificada por lacunas regulatórias graves que poderiam, mas repetidamente não são, solucionadas nem pela agência reguladora nem pelo Poder Legislativo.
Referências BAHIA, L. et al. Das empresas médicas às seguradoras internacionais: mudanças no regime de acumulação e repercussões sobre o sistema de saúde no Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 32, supl. 2, p. 1-13, 2016.
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ROBBA, R. Judicialização dos planos e seguros de saúde coletivos no Tribunal de Justiça de São Paulo. 2017. Dissertação (Mestrado) – FMUSP, São Paulo, 2017.
SCHEFFER, M. et al. Planos de saúde “falsos coletivos”: crescimento do mercado e reajuste de preços (2014-2019). USP – Grupo de estudos sobre planos de saúde, São Paulo, p. 1-13, ago. 2019.
TRETTEL, D; et al. Judicialização em planos de saúde coletivos: os efeitos da opção regulatória da ANS nos conflitos entre consumidores e operadoras. Revista de Direito Sanitário, São Paulo, v. 19, n. 1, p. 166-187, mar./jun. 2018.
Fonte(s) de financiamento: Instituto de Defesa de Consumidores (Idec)
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