Comunicação Coordenada

05/11/2024 - 08:30 - 10:00
CC6.2 - Disputas no financiamento do SUS

51552 - AS TRANSFERÊNCIAS FEDERAIS POR EMENDAS PARLAMENTARES AOS MUNICÍPIOS E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O FINANCIAMENTO DO SUS NO PERÍODO DE 2016 A 2021
ANDRÉ SCHIMIDT DA SILVA - ENSP/FIOCRUZ, LUCIANA DIAS DE LIMA - ENSP/FIOCRUZ, TATIANA WARGAS DE FARIA BAPTISTA - IFF/FIOCRUZ, FABIOLA SULPINO VIEIRA - IPEA, CARLA LOURENÇO TAVARES DE ANDRADE - ENSP/FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
No federalismo fiscal brasileiro, caracterizado pela centralização tributária na União e descentralização da provisão de serviços públicos, as transferências de recursos federais se configuram como um relevante instrumento para ampliar as receitas dos entes subnacionais (ORAIR; LIMA; TEIXEIRA, 2013). As transferências federais do SUS se destacam por seu potencial redistributivo e de indução à implantação de políticas, práticas e modelos de atenção, e se tornaram dispositivos essenciais para regulação e coordenação do sistema em âmbito nacional (JACCOUD; VIEIRA, 2018).
Contudo, nos anos 2010, duas alterações no texto constitucional incidiram diretamente no financiamento e nas transferências de recursos no SUS. A Emenda Constitucional (EC) 86/2015, além de alterar a base de cálculo para aplicação mínima em saúde pelo governo federal, tornou obrigatória a execução de emendas parlamentares individuais ao orçamento da União, determinando que metade destes valores fossem destinados ao SUS (VIEIRA, 2022). Em um cenário de ampliação da relevância das emendas, a EC 95/2016 iniciou um congelamento de gastos com políticas sociais, que se previa durar por vinte anos.
Nesse sentido, buscou-se responder à pergunta: como as emendas parlamentares alteram o padrão de alocação de recursos das transferências regulares do Ministério da Saúde e repercutem no financiamento do SUS nos municípios?


Objetivos
Analisar as transferências federais por emendas parlamentares aos municípios para ações e serviços públicos de saúde (ASPS) e discutir suas implicações para o financiamento do SUS no período de 2016 a 2021.

Metodologia
Foi realizada análise exploratória e descritiva de dados de abrangência nacional, envolvendo o conjunto de municípios brasileiros, no período de 2016 a 2021.
Utilizou-se como fontes de informação: 1) o Sistema de Informações sobre Orçamento Público Federal (SIGA Brasil) para as variáveis relacionadas às despesas com emendas parlamentares para ASPS; e o sítio eletrônico do Fundo Nacional de Saúde (FNS), para as variáveis relacionadas ao conjunto de transferências do Ministério da Saúde para os entes subnacionais. A coleta dos dados ocorreu em três períodos: maio e agosto de 2021, e março de 2022.
Trabalhou-se com as despesas liquidadas corrigidas pelo IPCA para valores em reais de 2021.
Foram calculados indicadores relacionados à participação das emendas, valores per capita e coeficientes de variação por modalidade de aplicação, natureza de despesa e áreas de alocação. Os dados foram agregados por região e UF e analisados com o uso do software estatístico SAS (versão 9.4). Foi utilizado o programa TabWin do Datasus (versão 4.1.5) para a elaboração de mapas.


Resultados e Discussão
Os recursos provenientes de emendas (EP) apresentaram aumento, em especial a partir de 2018, indicando a expansão de sua relevância no financiamento do SUS. Em 2019, as EP chegaram a representar 9% das despesas federais com ASPS. Quanto aos recursos transferidos aos municípios, 14,8%, em 2019, e 14,5%, em 2021, foram alocados a partir das EP.
No período de 2016 a 2021, 82,5% dos recursos de EP para ASPS foram destinados às transferências aos municípios, sendo 91,2% de natureza de custeio.
As transferências por EP diferiram dos repasses regulares nos valores per capita, na alocação geográfica, nas áreas de destinação e nas oscilações entre os valores captados pelos mesmos municípios.
Nos valores per capita, o Nordeste apresentou os números mais elevados, enquanto nos repasses regulares é o Centro-Oeste que esteve no patamar mais alto. A região Norte obteve o menor valor per capita nos repasses regulares, mas foi a segunda região com os maiores valores por EP. O coeficiente de variação entre os municípios no âmbito das EP (69,3%) foi superior ao dos repasses regulares (40,6%), indicando maior assimetria entre os montantes captados por EP pelas gestões municipais.
Na alocação geográfica, enquanto a participação da região Sudeste é preponderante nos repasses regulares (39,3%), o Nordeste é a região que capta mais recursos de EP (41,9%).
Nas áreas de destinação, houve predomínio da média e alta complexidade (50,3%) nas transferências regulares, e da APS entre as EP (63,9%).
Nas oscilações entre os valores captados pelo mesmo município, menos de 7% dos municípios apresentaram reduções superiores a 25% nos repasses regulares, enquanto nas EP esse percentual chegou a 68%, com mais de 40% de municípios com suspensão total de recursos em ao menos um ano da série.


Conclusões/Considerações finais
As transferências de recursos federais se consolidaram historicamente como importante mecanismo de coordenação da política de saúde entre diferentes níveis de governo, combinando critérios epidemiológicos, demográficos e de oferta de ações e serviços para a alocação de recursos. Atualmente, as emendas fragilizam esse mecanismo em prol de critérios essencialmente políticos para o direcionamento dos recursos.
Ações e serviços de saúde que deveriam contar com fontes de recursos regulares para sua manutenção, passam a depender de negociações entre representantes dos poderes executivo e legislativo, ampliando o risco de descontinuidade do cuidado à população.
As emendas parlamentares se configuraram, portanto, como uma modalidade diferenciada de alocação de recursos no SUS, que produz novas distorções e assimetrias, com implicações para as relações intergovernamentais e entre os poderes executivo e legislativo.


Referências
JACCOUD, L.; VIEIRA, F. S. TD 2399 - Federalismo, integralidade e autonomia no SUS: desvinculação da aplicação de recursos federais e os desafios da coordenação. Brasília: Ipea; 2018.
ORAIR, R.O.; LIMA, L.S.; TEIXEIRA, T.H. Sistema de transferências para os municípios brasileiros: avaliação dos impactos redistributivos. In: Boueri, R.; COSTA, M.A. (Edit.). Brasil em desenvolvimento 2013: Estado, planejamento e políticas públicas. Brasília: Ipea, 2013. p. 235-257.
VIEIRA, F. S. TD 2732 - Emendas parlamentares ao orçamento federal do SUS: método para estimação dos repasses a cada município favorecido, segundo áreas de alocação dos recursos (2015-2020). Brasília: Ipea; 2022.

Fonte(s) de financiamento: Este estudo foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo n° 309295/2021-1; pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), processo n° SEI E-26/201.123/2021; e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) - Programa de Políticas Públicas, Modelos de Atenção e Gestão do Sistema e Serviços de Saúde (PMA), processo n° 25380.101539/2019- 05.


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