Comunicação Coordenada

06/11/2024 - 08:30 - 10:00
CC4.8 - Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)

48559 - GRUPOS REFLEXIVOS E SAÚDE MENTAL DE HOMENS AUTORES DE VIOLÊNCIA: DESAFIOS PARA A GESTÃO DO CUIDADO
ITAMAR DE ALMEIDA CARNEIRO - UFRB/IRR-FIOCRUZ, DENISE NACIF PIMENTA - IRR-FIOCRUZ, GUSTAVO CORREA MATTA - IGM-FIOCRUZ


Apresentação/Introdução
Os Grupos Reflexivos de Homens Autores de Violência (HAV) são tecnologias sociais leves e recentes em nossa sociedade, mais especificamente no Brasil. Nos últimos anos, essa modalidade de trabalho tem ganhado destaque desde o advento da Lei Maria da Penha que institui o homem como parte do enfrentamento à violência contra a mulher e o comparecimento obrigatório a centros de educação e de reabilitação e a ter o devido acompanhamento psicossocial. Apesar da obrigatoriedade, as dimensões sistêmicas e organizativas do SUS não ofertam estratégias para a gestão de cuidados de homens autores de violência, o que revela uma carência na integralidade do cuidado e necessidade de avanços e de práticas dentro das redes de atenção a saúde. A violência contra a mulher é um grave problema de saúde em nossa sociedade, contudo, esse problema ainda tem sido visto de forma isolada, não sendo realizados trabalhos que incluam os homens no enfrentamento da violência. O Brasil conta com uma política de saúde específica denominada Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), nesse sentido, essa politica deve ser fortalecida com o objetivo de trabalhar a saúde mental do homem como estratégia de enfrentamento a violência contra a mulher através da autorresponsabilização, cuidado articulado, inovação e integração de política pública de saúde e sistema de justiça.

Objetivos
Analisar representações sociais de homens autores de violência doméstica que frequentam grupos reflexivos como estratégia de acompanhamento psicossocial e refletir criticamente sobre os desafios na gestão do cuidado e práticas dentro das redes de atenção à saúde.

Metodologia
Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa de caráter descritivo-exploratória, a partir de observação participante e de condução de grupo focal com homens que frequentam o grupo reflexivo ofertado no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde de Alagoinhas (SESAU) em cooperação com a 2ª Vara Criminal e de Violência Doméstica. Os participantes do estudo são homens maiores de 18 anos que foram autores de violência contra a mulher e que frequentam grupos como estratégia de acompanhamento psicossocial. A pesquisa considerou as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos, descritas na Resolução Nº 466/2012-CNS. A coleta de dados se deu através da estratégia de produção de narrativa em grupo focal com o objetivo de reunir informações detalhadas acerca da participação dos homens nos grupos reflexivos e da violência de gênero. As observações foram realizadas de forma assistemática, ou seja, não estruturada, registrando os fatos sem meios técnicos ou temas direcionados, produzindo um corpus de análise. A análise dos dados obedeceu aos critérios estabelecidos por (BARDIN, 2011), mediante pré-análise, exploração do material e o tratamento dos resultados.

Resultados e Discussão
Os resultados dos encontros, a partir das narrativas em saúde coletiva se entrelaçam com a compreensão do cotidiano e a transformação da realidade. Dessa forma, elenco o conteúdo das falas em quatro categorias analíticas: a) Grupo Reflexivo como forma de punição; b) Grupo como suporte para auto-cuidado em saúde mental; c) Grupo como transformação para relações sociais, trabalho e família; c) Grupo como oportunidade para desconstrução de padrões de gênero. Na primeira categoria foi possível observar relatos que revelam a participação no grupo como uma medida imposta e punitiva, de estranhamento e vergonha em estarem participando do grupo e relatam momentos de tensão e ansiedade, até mesmo choro ao adentrarem a sala. Após acolhimento e processo de inserção, os homens revelaram um sentimento de auto-cuidado em saúde mental, mencionando dormir melhor, gerência das emoções, redução da frequência de eventos ansiosos, importância de expor as suas emoções e menos impulsividade nas decisões e atitudes cotidianas utilizando técnicas de mindfulness. Na terceira categoria verificou-se que o grupo funciona como uma tecnologia social capaz de transformar o cotidiano das relações sociais, quando os participantes revelaram ter melhorado suas relações com colegas de trabalho, melhor aproximação com filhos e reflexões de padrão transgeracional de violência, além de relatarem aprendizagem de técnicas de comunicação não violenta. Por fim, os participantes revelaram aprendizagem sobre estereótipos de gênero e como essa construção social provoca adoecimento psíquico a partir do silenciamento das suas próprias emoções. Revelam ter sido vítimas de violência doméstica ou presenciado nas relações intrafamiliares e normalizaram a agressão como característica do sexo masculino.

Conclusões/Considerações finais
As narrativas produzidas a partir dos grupos reflexivos demonstram a importância dessa estratégia para novas produções de sentido e mudanças de repertórios comportamentais violentos e relações de gênero. O grupo ratifica o que está previsto na Convenção de Belém do Pará onde os Estados devem adotar todas as medidas que estejam ao seu alcance para modificar os padrões sociais no enfrentamento da violência. Além disso, foi possível verificar que as discussões atingiram todos os níveis educacionais e refletiu sobre preconceitos, estereótipos e discriminação. Os encontros possibilitam responsabilizar os homens como parte do problema da violência e promovem reflexões sobre novas masculinidades e alternativas não violetas para resolução de conflitos, entretanto, faz-se necessário que esse dispositivo de torne política pública de saúde incorporada no SUS como parte dos desafios encontrados na gestão do cuidado dentro das redes de atenção à saúde para fortalecer outras iniciativas no Brasil.

Referências
BEIRAS, Adriano Metodologia de grupos reflexivos de gênero / Adriano Beiras, Alan Bronz. – Rio de Janeiro: Instituto Noos, 2016.

TRAD, L. A. B.. Grupos focais: conceitos, procedimentos e reflexões baseadas em experiências com o uso da técnica em pesquisas de saúde. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 19, n. 3, p. 777–796, 2009.

SOUZA, E. R. DE .. Masculinidade e violência no Brasil: contribuições para a reflexão no campo da saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v. 10, n. 1, p. 59–70, jan. 2005.

MINAYO, Maria Cecilia de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2014. 407

MOSCOVICI. Representações Sociais: investigações em Psicologia Social. 9 ed. Petrópolis, RJ, Vozes, 2012.


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