Comunicação Coordenada

05/11/2024 - 08:30 - 10:00
CC4.5 - Rede de Atenção às pessoas com deficiência (1)

53784 - EQUIPE DE CONSULTÓRIO NA RUA: A PRODUÇÃO DE CUIDADO INTEGRAL NA ATENÇÃO À POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA NO RIO DE JANEIRO
ALDA LACERDA - EPSJV/FIOCRUZ, PENHA FARIA DA CUNHA - UFF


Apresentação/Introdução
O crescimento da população em situação de rua (PSR) no país reflete o desemprego, a fome e as iniquidades sociais. A estimativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) é de 281.472 pessoas em situação de rua em 2022, um aumento de 38% quando comparado ao ano de 2019, com maior concentração em municípios como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro (Natalino, 2022). Para garantir o acesso da PSR aos serviços públicos de saúde foram criadas equipes de Consultório na Rua (Brasil, 2011), que podem ser compostas por médico, enfermeiro, técnico de enfermagem, agente social, psicólogo e assistente social, e definido o seu funcionamento (Brasil, 2012).
O Brasil saiu de 142 equipes de Consultório na Rua (CnaR) em 2015 para 281 equipes em 2023, um aumento de 98% (Brasil, 2023). O Rio de Janeiro, cenário do presente estudo, passou de 7 equipes em 2021 para 13 equipes em 2023. O quantitativo ainda é insuficiente para atender o número crescente da PSR, porém existe o compromisso do governo de ampliar o número de equipes em todo o país.
Embora o CnaR seja um dispositivo da atenção primária, o nosso pressuposto é que o processo de trabalho das equipes precisa construir arranjos de cuidado que atendam as especificidades da PSR. É uma população que tem pressa e urgência, pois a noção do tempo é o aqui e agora, já que o futuro é completamente incerto


Objetivos
Identificar a produção do cuidado integral da equipe de Consultório na Rua, a partir da narrativa dos trabalhadores que atuam junto à população em situação de rua no município do Rio de Janeiro

Metodologia
É uma pesquisa de natureza qualitativa que aborda o processo do trabalho na Atenção Primária à saúde. A pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética, CAAE número 49457221.6.0000.5241. O trabalho de campo no município do Rio de Janeiro foi realizado em duas Unidades Básicas de Saúde, denominadas de Clínicas da Família, situadas na zona norte da cidade, que têm equipes da Estratégia Saúde da Família e equipe de Consultório na Rua.
Os sujeitos da pesquisa são os trabalhadores da APS das duas unidades de saúde que compõem as equipes da Estratégia Saúde da Família, a equipe de consultório na Rua, as equipes de saúde bucal e as eMulti. No período de abril a outubro de 2023, foram realizadas 27 entrevistas semiestruturadas com médico(a), enfermeiro(a), dentista, técnico(a) de enfermagem, técnico(a) em saúde bucal, agente comunitário(a) de saúde, agente de ação social, nutricionista e assistente social. O critério de inclusão era ser trabalhador na unidade e ter no mínimo 2 anos de atuação no cargo.
As entrevistas foram transcritas na íntegra e as mídias serão guardadas por 5 anos.
A pesquisa é financiada pelo Programa de PolÍticas Públicas, Modelos de Atenção e Gestão em Saúde (PMA)/ Fiocruz.


Resultados e Discussão
As equipes de CnaR precisam de flexibilidade para assegurar o trabalho territorializado e ampliar a oferta de cuidado integral. Um dos profissionais do CnaR refere que suas “atividades não convergem para o consultório, como acontece às vezes na Estratégia Saúde da Família (SF), então a gente se ‘ambulatoriza’ menos”. A expressão ambulatorizar se refere à rotina de trabalho mais rígida da SF, com muitas demandas a serem executadas na unidade e no atendimento ambulatorial, e uma tendência a reduzir a ida aos territórios.
As equipes de CnaR têm como trabalho prescrito (Brito, 2009), ou seja, o que está normatizado nas legislações e nos documentos da gestão, a realização de atividades de forma itinerante, com ações na rua, em instalações específicas, na unidade móvel e nas unidades básicas de saúde (Brasil, 2011). No entanto, o trabalho real, ou seja, o que de fato se concretiza em ato, é a produção do cuidado integral itinerante na rua, na calçada, na linha do trem e, conforme aponta um dos profissionais, “até mesmo em cima de um pedaço de madeira, em cima de uma caixa de papelão para usar aquilo como mesa para fazer receita, para fazer teste rápido”. O trabalho real reconfigura as normatizações prescritas e, conforme um dos profissionais do CnaR, “acaba sendo um pouco mais inventivo, acaba tendo que ser um pouco mais criativo”.
São realizadas atividades em grupo nos territórios da rua, articulações intra e intersetoriais com outros equipamentos sociais e de saúde, além de orientação e acompanhamento dos que precisam fazer o documento de identidade. São ações de gestão do cuidado fundamentais para ampliar o cuidado integral, fortalecer as redes nos territórios e produzir autonomia e cidadania das pessoas em situação de rua.


Conclusões/Considerações finais
Um dos desafios para ampliar o cuidado integral da PSR é a assegurar que essas pessoas sejam bem atendidas na rede de atenção à saúde, seja na Saúde da Família ou nos demais níveis de atenção do sistema. A PSR vive em condições adversas, muitos sem documentos de identidade e com pouco ou nenhum contato com o atendimento no serviço público de saúde. A gestão do cuidado precisa ser readequada, com agendas flexíveis e abertas à demanda espontânea e a novos arranjos de produção de cuidado integral que atendam as especificidades e necessidades em saúde desse grupo vulnerabilizado.
As condições de vida e saúde e as determinações sociais do processo de saúde-doença da PSR apontam para a importância de fomentar práticas de cuidado integral que atendam às suas peculiaridades e necessidades em saúde. No entanto, é fundamental lutar pela implementação de política públicas que garantam o trabalho e renda e a moradia dessas pessoas que se encontram em situação de extrema vulnerabilidade social.


Referências
BRASIL. Ministério da Saúde. Política nacional de atenção básica. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2011
BRASIL. Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Plano Nacional Ruas Visíveis: Pano de ação e monitoramento para a efetivação da política nacional para a população em situação de rua, 79p.; 2023.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 122 de 25 de janeiro de 2011. Define as diretrizes de organização e funcionamento das equipes de Consultório na Rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.
BRITO, J. Trabalho Prescrito. Dicionário de Educação Profissional em Saúde. Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, 2009.
NATALINO, M. Estimativa da população em situação de rua no Brasil (2012-2022). Nota Técnica. Edição 1ª; Brasilia: IPEA, 2022.

Fonte(s) de financiamento: Programa de PolÍticas Públicas, Modelos de Atenção e Gestão em Saúde (PMA)/ Fiocruz.


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