Comunicação Coordenada

06/11/2024 - 13:30 - 15:00
CC2.11 - Saberes em movimento: Vigilância Popular nos Territórios e Produção de Conhecimento

53574 - NOSSA INDÚSTRIA É A MARÉ: RELAÇÕES DE TRABALHO, SAÚDE E AMBIENTE DAS PESCADORAS ARTESANAIS DA RESEX ACAÚ-GOIANA
AMANDA DE SOUZA ARAÚJO - UFPB, SARA REBECA DA SILVA OLIVEIRA - UFPB, LUCAS COSTA NUNES - UFPB, GABRIELL BRUNO MATIAS PONTES - UFPB, ALINE SOUSA FURTADO - UFPB, JANINE AZEVEDO DO NASCIMENTO - UFPB, DAYANNE SPERLE CAMPOS - UFPB, DANIEL FIGUEIRAS ALVES - UFPB, DANILO FERNANDES COSTA - UFPB, GABRIELLA BARRETO SOARES - UFPB


Apresentação/Introdução
A Reserva Extrativista Acaú-Goiana, localizada na região estuarina do rio Goiana, entre Paraíba e Pernambuco, é um exemplo da contínua luta das comunidades tradicionais, quilombolas e ribeirinhas pela preservação de seus territórios e modos de vida (Souto et al., 2024). Compreende as comunidades de Baldo do Rio, Povoação de São Lourenço, Tejucupapo, Carne de Vaca, Porto do Congaçari e Acaú, sendo um local de resistência contra a expansão de complexos industriais e da monocultura, graves ameaças.
As pescadoras artesanais da Resex representam um segmento vital da economia e da cultura local. A prática ancestral de mariscagem sustenta parte da economia local e mantém preservada a cultura e conhecimentos tradicionais (Silva, 2022). Elas são responsáveis pela coleta, processamento e comercialização de mariscos, camarões, caranguejos e outros crustáceos.
As relações de trabalho das pescadoras na Resex estão intrinsecamente ligadas à maré e suas jornadas são reguladas pelos ciclos naturais. A maré é a "indústria" onde elas trabalham diariamente, enfrentando enormes desafios para garantir sustento.
A atividade das pescadoras artesanais é marcada por longas jornadas e riscos de acidentes, resultando em um alto índice de doenças relacionadas ao trabalho (Lopes et al., 2021). Ocorrências sequer são consideradas acidentes de trabalho e qualificadas pelo INSS no processo de aposentadoria.

Objetivos
O objetivo deste estudo é analisar os problemas de saúde, trabalho e ambiente relatados por pescadoras artesanais de duas comunidades da Resex Acaú-Goiana, considerando seus modos tradicionais de vida e subsistência como seu modelo social e econômico.

Metodologia
Adotou-se uma metodologia qualitativa centrada em Grupos Focais (GF) (Souza et al., 2023), nas comunidades pesqueiras de Acaú, em Pitimbu-PB, e quilombola Povoado de São Lourenço, em Goiana-PE, na Resex Acaú-Goiana. Essa abordagem explorou as vivências e percepções das marisqueiras sobre trabalho, saúde e ambiente. Foram realizados dois GF, um em cada localidade, com participação de 11 (Acaú) e 8 (São Lourenço) marisqueiras.
Os Grupos Focais, como ferramenta da pesquisa-ação, incentivaram a participação ativa das marisqueiras, discutindo temas específicos e garantindo a confidencialidade das informações. Foi utilizado um roteiro para compreensão aprofundada das condições de saúde e trabalho e dos desafios enfrentados pelas marisqueiras, destacando suas estratégias de resistência e adaptação. Além disso, sublinhou a importância de suas vozes na formulação de políticas públicas e iniciativas de sustentabilidade na região.
Os diálogos conduzidos nos Grupos Focais foram registrados mediante o consentimento informado das participantes e subsequentemente transcritos para análise temática de conteúdo.


Resultados e Discussão
A análise dos GF revelou que a mariscagem é vital para a manutenção da cultura e identidade local, destacando a necessidade de políticas públicas que protejam as trabalhadoras e seus territórios, além de fortalecer as redes de apoio comunitária para mitigar impactos negativos das disputas territoriais e condições de trabalho adversas.
Quanto à saúde, as pescadoras enfrentam doenças relacionadas à sua atividade, como os DORT (Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho), que muitas vezes não são reconhecidas ou tratadas adequadamente. A pouca compreensão dos profissionais de saúde sobre as condições específicas do trabalho das pescadoras resulta em atendimentos inadequados e falta de registros de doenças relacionadas ao trabalho.
Em termos de trabalho, a mariscagem é uma atividade extenuante, com jornadas que frequentemente ultrapassam 10 horas diárias e riscos constantes de acidentes. A falta de reconhecimento profissional dificulta a obtenção de direitos trabalhistas e benefícios sociais junto a órgãos como o INSS.
A relação das pescadoras com o meio ambiente é comensal. Um problema destacado é o descarte inadequado dos resíduos de marisco, mal manejado pelos órgãos competentes. As principais questões ambientais incluem poluição e o avanço das grandes indústrias e da monocultura. A região sofre impactos ambientais do descarte inadequado de lixo no principal rio, afetando o ambiente de trabalho e a qualidade dos recursos naturais.
O avanço industrial, alinhado à indústria da cana-de-açúcar, cimento, carcinicultura, entre outras, representa graves ameaças para o território pesqueiro. Apesar da criação da Resex Acaú-Goiana, em 2007, há falta de clareza sobre os limites da reserva e as regras aplicadas, além de ausência de fiscalização adequada.

Conclusões/Considerações finais
Vê-se indispensável a abordagem abrangente dos desafios encarados pelas pescadoras artesanais da Resex Acaú-Goiana, de modo a reconhecê-las enquanto personagens imprescindíveis à economia local e à preservação da cultura e de conhecimentos tradicionais. Sobre a saúde, urge implementar medidas que garantam às pescadoras um adequado atendimento, especialmente de ordem ocupacional. Isso inclui não apenas capacitar profissionais de saúde para entender as necessidades específicas dessas trabalhadoras, mas também melhorar o acesso aos serviços de saúde no território.
Ademais, é essencial adotar políticas e práticas que promovam manejos sustentáveis dos recursos naturais, incluindo a tomada de estratégias frente aos impactos da poluição local e da expansão industrial indiscriminada na região, com o envolvimento ativo das autoridades locais, organizações da sociedade civil e das próprias comunidades na (re)formulação de medidas de conservação ambiental.


Referências
SOUTO, A. DE S. et al.. Conflicts and socioenvironmental injustice in the Acaú-Goiana Extractive Reserve. Ambiente & Sociedade, v. 27, p. e02253, 2024.
SILVA, S. M. Sentido comunitário a partir do uso comum da natureza em comunidades de pesca artesanal: um estudo na RESEX Acaú-Goiana - PB/PE. Paisagens & Geografias, [S. l.], v. 4, n. Esp, 2022.
LOPES, I. B. S. et al. Saúde das trabalhadoras da pesca artesanal: cenários desconhecidos do Sistema Único de Saúde (SUS). Rev. Bras. de Saúde Ocupacional, v. 46, p. e5, 2021.
SOUZA, F. P. et al. A abordagem qualitativa nas pesquisas envolvendo comunidades tradicionais pesqueiras. Mares: Revista de Geografia e Etnociências, v.5, n.1, 2023.

Fonte(s) de financiamento: CNPQ e Ministério da Saúde.


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