05/11/2024 - 08:30 - 10:00 CC1.2 - Segurança Alimentar, Nutricional e Ambiental |
52050 - A (DES)CENTRALIDADE DA FOME NA CONSTRUÇÃO DO BRASIL CONTEMPORÂNEO: ANÁLISE DO PAPEL DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA ALIMENTAR DO SÉCULO XX THALLIS SOUSA SILVA - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, MARIA CRISTINA DA COSTA MARQUES - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Apresentação/Introdução A fome no Brasil vem sendo estudada há décadas a partir de diferentes perspectivas sociais e históricas de seus determinantes. Abordar o tema da fome é, ao mesmo tempo, discorrer sobre o genocídio cotidiano de populações que são condenadas à incerteza daquilo que lhes é mais básico para a sobrevivência – a alimentação – e que, desde 1948, está definida como parte de um direito básico e universal para a garantia de bem-estar de todos os indivíduos (ONU, 1948).
Manifestação da sociedade de classes e sintoma brando da desigualdade (CARTER, 2010), é um fenômeno que sempre esteve presente na história do país e que se desenvolveu conjuntamente ao avanço do capitalismo.
A promoção de debates acerca de segurança alimentar teve seu início somente no século XX, mas permanece até hoje como tema recorrente nas discussões político-sociais do Brasil, sendo um problema a ser enfrentado e amplamente discutido pelos diferentes segmentos da população enquanto forma de aprofundamento da democracia e de busca de garantia do direito à saúde. Nesse sentido, a saúde coletiva possui papel crucial para a definição de estratégias que levem à superação dessa condição que assola mais da metade da população brasileira (PENSSAN, 2022).
Objetivos Compreender a origem das políticas públicas de combate à fome e seus impactos na formação do Brasil contemporâneo a partir de uma perspectiva que caracteriza a alimentação como elemento interligado ao projeto de nação que estava sendo discutido no século XX. Propor uma discussão sobre como a saúde pública se inseriu nesse contexto de disputa social acerca das produções de políticas públicas da época e discutir os rumos das políticas econômicas e sociais na construção do país.
Metodologia O presente trabalho é de natureza qualitativa e de caráter exploratório, se constituindo a partir das Ciências Sociais e da Saúde Coletiva para a caracterização do conhecimento acerca das políticas públicas e seus impactos na população. A metodologia do projeto se deu a partir de uma revisão bibliográfica sobre as políticas públicas de segurança alimentar na saúde pública, com 1) Levantamento bibliográfico sobre a temática estudada; 2) Caracterização da documentação de acordo com critérios definidos; 3) Análise de conteúdo dos artigos, documentos históricos, produções audiovisuais, dentre outros materiais com relação com à temática de pesquisa.
Resultados e Discussão As primeiras teorias sobre a fome surgiram no Brasil com os estudos de Josué de Castro, especialmente no primeiro inquérito publicado em 1932, em que investigava as condições de vida da classe trabalhadora operária em Recife (Castro, 1932).
Posteriormente, em 1935, quando o autor publicou a sua obra mais célebre, "Geografia da Fome", Josué buscou entender quantas e quais eram as pessoas que passavam fome nas diferentes partes do Brasil, realizando um mapeamento geográfico inédito das diferentes formas de manifestação da fome pelo país.
Embora os estudos de Josué já denunciassem a fome que assolava o país, as primeiras políticas sobre alimentação só foram surgir durante o período do Estado Novo (1937-1945), em que se era discutida a necessidade de manutenção da classe trabalhadora para ampliação das indústrias que se instalavam no país.
Nesse contexto, foi inaugurado o Serviço de Alimentação da Previdência Social, em 1940, com a proposta de instalação de restaurantes populares nos locais de trabalho, com ampla divulgação de vantagens de uma boa alimentação (Nogueira; Pereira; Carrara, 2022). Em 1952, é promulgado o I Plano Nacional de Alimentação e Nutrição, pela Comissão Nacional de Alimentação, prevendo estratégias de saúde pública que tratavam sobre o fornecimento de alimentação escolar a caráter nacional, para além da alimentação nas fábricas e locais de trabalho que já vinha sendo discutido.
Desde então, o surgimento das políticas nacionais de alimentação e nutrição passaram a estar presentes nas discussões públicas, ancoradas nas lutas da sociedade civil, dos órgãos governamentais e de organismos internacionais (Campello; Bortoletto, 2022), buscando legitimar conquistas políticas anteriores e lutar pela instauração de um modelo de cuidado e saúde previsto no SUS.
Conclusões/Considerações finais O debate sobre a fome passou a figurar no Brasil tardiamente, após anos de insegurança alimentar entranhados na história do país. Os primeiros estudos sobre a fome foram produzidos com uma década de distância das primeiras políticas de alimentação, e somente 3 décadas depois foi instaurado um plano nacional de alimentação a caráter nacional.
A alimentação só passou a ser percebida como um problema a ser enfrentado quando condicionada à produção industrial do século XX, e os primeiros estudos ora voltavam-se ora aos próprios trabalhadores, ora aos futuros trabalhadores (recém-nascidos e crianças).
A ausência da fome nos planos de constituição do país evidenciam que o foco dos governantes não estava na promoção de saúde, mas sim na reprodução do capital financeiro. O presente trabalho buscou evidenciar o caráter excludente do tema na construção do país, e propor, desta forma, uma reconstrução histórica como forma de jogar luz ao debate e necessidade da sua centralidade na saúde pública.
Referências CAMPELLO; BORTOLETTO, Tereza; BORTOLETTO, Ana Paula (org.). Da fome à fome: diálogo com Josué de Castro. São Paulo: Elefante, 2022. 216 p.
Castro J. Condições de vida das classes operárias do Recife. Recife: Imprensa Industrial; 1932.
CARTER, Miguel. Desigualdade social, democracia e reforma agrária no Brasil. São Paulo: Unesp, 2010.
Organização das Nações Unidas (ONU). Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em: 12 set. 2023.SILVA, 1990.
REDE BRASILEIRA DE PESQUISA EM SOBERANIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (PENSSAN). (São Paulo) (org.). Insegurança Alimentar e Covid-19 no Brasil: II VIGISAN: inquérito nacional sobre insegurança alimentar no contexto da pandemia da covid-19 no Brasil. São Paulo: Rede Penssan, 2022. 110 p. Disponível em: . Acesso em: 02 out. 2022.
Fonte(s) de financiamento: "O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001”
"This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Finance Code 001"
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