Comunicação Coordenada

04/11/2024 - 13:30 - 15:00
CC1.1 - Mercado, Justiça e Saúde: os desafios para a garantia de acesso no sistema de saúde brasileiro

49064 - ARTICULAÇÃO ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO NO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO NO PERÍODO DE 2019 A 2022
THAINÁ AFFONSO LAERT MIRANDA - UFBA, CATHARINA LEITE MATOS SOARES - UFBA


Apresentação/Introdução
O Sistema de Saúde do Brasil é historicamente atravessado pela articulação entre os setores público e privado, sendo observado a presença do setor privado desde o início da sua conformação, o seu crescimento com o desenvolvimento da previdência social e com os subsídios estatais no período militar e a sua permanência mesmo após a institucionalização do Sistema Único de Saúde. A presença e a forma como o setor privado se articula com o sistema público de saúde é vista como complexa e ambígua, pois se apresenta de forma extensa e variada, estando presente em diversos componentes do Sistema de Saúde. Diante do contexto do capitalismo financeirizado, estudos recentes no campo da Saúde Coletiva demonstram como a financeirização se comporta no setor saúde, transformando-a em “ativos vendáveis e negociáveis”. Ainda, observa-se o crescimento de subsídios e empréstimos dado pelo Estado às empresas privadas, o que tem aumentado o uso dos fundos públicos com saúde, apesar de não significar o aumento do investimento no sistema público de saúde, pois as articulações entre público e o privado, sob a lógica da financeirização, favorece a acumulação de capital das empresas privadas, em detrimento do interesse público. A partir disso, o presente trabalho, fruto de um Trabalho de Conclusão de Residência, concentra-se no tema da articulação entre o público e o privado no sistema de saúde do país.

Objetivos
O objetivo geral do estudo foi mapear as configurações da articulação entre o público e o privado no Sistema de Saúde Brasileiro do período de 2019 a 2022. Os objetivos específicos buscaram conferir o possível aprofundamento do processo de privatização do SUS e, assim, sua possível contribuição para o desmonte do SUS democrático proposto pela Reforma Sanitária Brasileira.

Metodologia
Trata-se de uma pesquisa exploratória, descritiva com abordagem qualitativa, realizada a partir das matrizes de notícias do Eixo de Pesquisa 1 - Análise do Processo da Reforma Sanitária Brasileira, do Observatório de Análise Política em Saúde, do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia. Utilizou-se as matrizes de notícias dos sites: Saúde Legis, Outra Saúde, Ministério da Saúde (MS), Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), e Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), dos anos 2019, 2020, 2021 e 2022. Não foi possível o acesso às matrizes do site da ANS e do MS de 2019 e do Outra Saúde de 2020. Assim, 17 matrizes compuseram o estudo, totalizando 115 notícias. O material foi organizado em quatro novas planilhas Excel, sendo uma para cada ano. Após leitura e descrição das notícias, surgiram seis categorias de análise: O público e o privado na gestão do SUS; Financiamento de estabelecimentos privados no SUS; O público e o privado prestação de serviços no SUS; Operadoras de planos privados de Saúde; Movimentações dos agentes políticos dos setores privado e público; e Financeirização.

Resultados e Discussão
No âmbito da gestão, identificou-se ações adotadas pelos poderes executivo e legislativo que ampliaram e legitimaram a participação do setor privado no SUS, tanto a partir de espaços institucionalizados no próprio Ministério da Saúde quanto através da gestão de estabelecimentos de saúde, com destaque para a criação do Departamento de Certificação e Articulação com os Hospitais Filantrópicos e Privados e da Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps). Ademais, observou-se variadas estratégias de financiamento para as instituições privadas, como a sanção da lei que permitiu o uso de recursos do FGTS para empréstimos às Santas Casas e hospitais filantrópicos; a ampliação do financiamento para as Comunidades Terapêuticas, pelo Ministério da Cidadania, e das instituições filantrópicas que prestam serviços ao SUS, pelo Ministério da Saúde junto com o BNDES, e a abertura de nova linha de crédito para as Santas Casas pela Caixa Econômica Federal. Na prestação de serviços no SUS, as articulações entre o público e o privado concentraram-se no enfrentamento da pandemia de Covid-19, sobretudo através da compra de insumos e tecnologias. No âmbito das operadoras de planos privados, destaca-se as tentativas de alterar a Lei dos Planos e a aprovação pela ANS do maior reajuste na mensalidade de planos nos últimos 22 anos. Ainda, verificou-se diversas aproximações políticas e pessoais entre agentes dos setores privado e público no período analisado. Por fim, no âmbito da financeirização, destaca-se a compra do Grupo São Francisco pela Hapvida, a qual se tornou a maior operadora de planos de saúde em número de clientes, a compra da Perinatal pela Rede D'Or, e o setor saúde ter liderado o ranking de fusões e aquisições no país em 2021 e 2022.

Conclusões/Considerações finais
Os resultados demonstram a presença do setor privado em diversos âmbitos do Sistema de Saúde brasileiro no período analisado, a partir dos quais, pode-se inferir que as articulações entre o público e o privado estabelecidas favorecem o interesse privado em detrimento do público, podendo indicar um processo de privatização da saúde em curso no país. Assim, compreende- se que essas articulações estão em discordância com os princípios da Reforma Sanitária Brasileira e o SUS democrático por ela proposto. Os resultados podem contribuir para a compreensão das articulações entre o público e o privado na saúde, podendo colaborar com possíveis propostas de regulação do setor privado. O curto período analisado é uma limitação do presente estudo, assim como sua característica descritiva. Desse modo, é necessário a realização de outras pesquisas, analíticas, para melhor compreender as articulações entre o público e o privado na saúde e suas implicações para o SUS e para o direito à saúde.

Referências
BAHIA, L; SCHEFFER, M. Financeirização na Saúde. Rio de Janeiro: Cad. Saúde Pública, 2022; 38 Sup 2:e00119722.
BRAGA, JCS; OLIVEIRA, GC. Dinâmica do capitalismo financeirizado e o sistema de saúde no Brasil: reflexões sob as sombras da pandemia de COVID-19. Rio de Janeiro: Cad. Saúde Pública, 2022.
ESCOREL, S. História das políticas de saúde no Brasil de 1964 a 1990: do golpe militar à reforma sanitária. In: GIOVANELLA, L. et al. (org.) Políticas e Sistemas de Saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2008.
PAIM, JS. Sistema Único de Saúde: tudo o que você precisa saber. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019.
PAIM, JS.; ALMEIDA-FILHO, N. (Org.). Saúde Coletiva: teoria e prática. 2ª ed. Rio de Janeiro: Medbook, 2023.
SESTELO, JAF et al. Planos e seguros de saúde: a financeirização das empresas e grupos econômicos controladores do esquema comercial privativo de assistência no Brasil. Rio de Janeiro: Cad. Saúde Pública, 2022.


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